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COLUNAS


Rodrigo Cogo
rodrigo@aberje.com.br

@rprodrigo

Relações Públicas pelo Curso de Comunicação Social da Universidade Federal de Santa Maria , é especialista em Gestão Estratégica em Comunicação Organizacional e RP e Mestre em Ciências da Comunicação pela Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo. Trabalhou por 10 anos com planejamento e marketing cultural para clientes como AES, Bradesco, Telefonica e BrasilTelecom. Tem experiência em diagnósticos de comunicação, para empresas como Goodyear, HP, Mapfre, Embraer, Rhodia e Schincariol. Atualmente, é responsável pela área de Inteligência de Mercado da Aberje, entidade onde ainda atua como professor no MBA em Gestão da Comunicação Empresarial.

Reflexões sobre como contar histórias em ambiente organizacional

              Publicado em 16/12/2011

As narrativas são eficientes meios de interação, pois comunicam, fornecem e transmitem informações. Esse ato está encontrando uma nova forma e novos objetivos na mídia tecnologizada. Não interessam mais só as qualidades do produto em si, como argumento para a venda, mas interessa também criar uma narrativa em que a trajetória da organização seja inspiradora e crie conexões que podem desencadear relações e, por conseguinte, amparar negócios. Contar histórias através de várias mídias é algo básico, essencial, simples e poderoso.

Lucena Filho, Villegas e Oliveira (2008) atestam que as histórias acompanham as origens sociais do ser humano na tradição oral e escrita. Sempre que uma história é contada, fala dos atores e dos feitos em contexto particular e apresenta experiências que contribuem para a aprendizagem dos narradores, leitores ou ouvintes. Segundo o contexto no qual é criada/estruturada, a história pode gerar espaços de reflexão do passado e inspiração para a transformação do futuro. A evocação de uma vida particular utiliza componentes das grandes histórias, ainda que desejando assumir uma singularidade ou um ineditismo. Em geral, serve-se da primeira infância e delineia uma trama de acontecimentos – cuja ligação, sincronia ou adversidade são constatados muitas vezes durante a própria fala, numa narrativa que contem conflitos, personagens (protagonistas, figurantes e extras), cenários e transições. Não é raro que uma história contenha fatos agregados ou minimamente inspirados em materiais narrativos de outras pessoas – numa contaminação natural e irrecusável.

A presença do contador de histórias ressurgiu a partir da década de 70 em vários países do mundo. Foi um retorno considerado surpreendente, tendo em vista a industrialização, a urbanização, a tecnologia e a tendência à intermediação. O contador de histórias, segundo pesquisa de Busatto (2006), recebeu vários nomes ao longo do tempo: era o ‘rapsodo’ para os gregos; o ‘griot’ para os africanos; o ‘bardo’ para os celtas, todos empenhados na narração oral como via para organizar o caos e perpetuar e propagar os mitos fundacionais de suas culturas, como “portador da voz poética”, nas palavras de Zumthor (1993) - a gestualidade própria do contador requer uma totalidade, ela recusa a distância interpretativa e elimina a alegoria. O corpo molda o discurso, com os gestos que engendra no espaço, explicitando, num desenho em movimento, a forma externa do poema. É essa forma que substituirá na memória depois que as palavras se calarem.

A preparação da contação de histórias pressupõe um equilíbrio entre treinamento prévio e improvisação. Fazer um roteiro é um caminho, ainda que reconhecendo o inesperado das intervenções ao vivo, onde devem constar os elementos que devem ser evocados, sua ordem e ênfase. A apresentação em si requer estar à disposição do momento narrativo, com a energia embutida e reconhecida pela plateia. Nesta tarefa, convém estar livre de qualquer obstáculo físico, como um púlpito, um microfone muito visível ou mesmo um bloco de anotações, e por isto a expressão corporal ganha relevância. É o instante de ter cuidado com expressões faciais ou movimentos, embora não a ponto de ser uma atuação, e também com o ritmo e o volume da voz, preservando um necessário estado de alerta (DENNING, 2006).

É preciso separar o tema da história do seu argumento, ou seja o que se fala e as relações causais entre os acontecimentos. Também é preciso diferenciar a trama (estrutura ou aparato mecânico da história) do sentido (a verdade desejada a transmitir). Outro ponto fundamental na elaboração de histórias são os conflitos. Pode-se falar basicamente de três tipos: conflitos internos dos personagens com eles mesmos; conflitos externos entre personagens ; e destes com o ambiente. Os relatos que contiverem estas modalidades misturadas têm mais possibilidade de persuasão e relevância no tempo, com mais uma chance  de identificação junto a quem ouve. O mundo empresarial, em geral, é reticente em introduzir estes embates do ‘princípio de antagonismo’ (NÚÑEZ, 2009).

O ponto da narrativa é a sua razão de ser, além disto precisa ser contável, isto é fazer referência a algo extraordinário ou mesmo comum mas com um grande ensinamento sugerido. A mensagem central e a reportabilidade são componentes que garantem a carga dramática e o clima emocional, onde o narrador utiliza recursos linguísticos-discursivos, conforme ensina Bastos (2004), como intensificadores lexicais (como uma briga muito feia), fonologia expressiva (alongar vogais, como uma briga muuuuuiito feia; ou acelerar ou diminuir o ritmo da fala e aumentar ou abaixar o volume da voz), repetições (tipo uma briga muuuuiito feia, mas muuuuiito feia mesmo).

Uma análise importante na ‘Economia da Atenção’ é a impaciência das pessoas para esperar o desenrolar tradicional da apresentação, nó e desenlace de uma história. Por isto, uma recomendação tem sido começar pelo clímax. Nesta mesma linha perceptiva, a narração cronológica perde espaço para o uso da retrospecção (ou flash-backs), antecipação e elipse (omissão voluntária de trechos). Diz Machado (2004) que “a experiência estética da escuta depende da cadência do narrador; o ritmo da narração é fundamental na forma de contar”, sendo importante pensar na modulação de voz e na expressividade dos silêncios, dos gestos corporais derivados e do direcionamento do olhar. Há sempre um desafio sobre o tempo oferecido pelos demais interlocutores para ouvir uma história plenamente desenvolvida, sobremaneira a ponto destes abrirem um espaço mental para relacionar a narrativa a seus universos particulares.

Taylor et al. (apud BRUSAMOLIN; MORESI, 2008) investigaram por que algumas narrativas são mais efetivas que outras, sendo que a estética da história pode ser selecionada segundo os seguintes aspectos: sentimento de significado – a intuição do ouvinte tende a acreditar na história; conectividade – a história desperta ressonância no ouvinte, que viveu experiência semelhante; apreciada por si mesma – a história é agradável e por isso aceita pelos ouvintes, que reduzem seus filtros críticos e possíveis questionamentos.

Alex Pentland, em recentes pesquisas no Human Dynamics Lab do Massachusetts Institute of Technology (MIT), afirma que o teor do discurso pesa menos do que o modo como se expressa. Tudo é pensado a partir dos “sinais honestos, pistas não verbais que espécies sociais usam para se coordenar – gestos, expressões, tom de voz. [Eles] são singulares porque provocam alterações no receptor do sinal”. O estudioso, naturalmente, não dispensa a análise sobre o conteúdo do discurso, que pesaria mais para o sucesso a longo prazo, mas postula a importância de cuidar do formato da narrativa.

Há visões que indicam que performances de contadores de histórias contêm muitas das condições necessárias para induzir transes, aqui entendidos como estado de consciência voltado para dentro da pessoa, de tal forma que os olhos dos ouvintes possam estar no contador, porém suas consciências estão voltadas para dentro delas mesmas. É o que Benson (apud SUNWOLF, 2005, p.311) fala sobre “resposta relaxante”, quando os ouvintes encontram-se relaxados, abertos para uma retenção mais ativa daquilo que está sendo dito e ficam menos defensivos. Uma boa narrativa é aquela que podemos aceitar ou rejeitar e, paradoxalmente, tal liberdade torna mais provável a aceitação.


Referências

BASTOS, Liliana Cabral. Narrativa e vida cotidiana. Scripta, Belo Horizonte: Programa de Pós-graduação em Letras da PUC-MG, v.7, n.14, p.118-127, 1.sem.2004.

BRUSAMOLIN, Valério; MORESI, Eduardo. Narrativas de histórias: um estudo preliminar na gestão de projetos de tecnologia da informação. Ciência da Informação. Brasília, vol.37, n.1, p.37-52, jan./abr. 2008. Disponível em: <http://revista.ibict.br/index.php/ciinf/article/viewArticle/1005>. Acesso em: 3 fev. 2010.

BUSATTO, Cleo. A arte de contar histórias no século XXI: tradição e ciberespaço. Petrópolis, RJ: Vozes, 2006.

DENNING, Stephen. O poder das narrativas nas organizações: o guia para líderes sobre o uso da técnica de narrativas. Trad. Ricardo Vieira. Rio de Janeiro: Elsevier, 2006.

LUCENA FILHO, Gentil; VILLEGAS, Margarita Maria; OLIVEIRA, Sheila. Histórias de aprendizagem e gestão organizacional: uma abordagem antológica e hermenêutica. Ciência da Informação. Brasília, vol.37, n.2. mar./ago. 2008. Disponível em: <http://revista.ibict.br/index.php/ciinf/article/viewArticle/1063>. Acesso em: 21 mai.2010.

MACHADO, Regina. Acordais: fundamentos teórico-poéticos da arte de contar histórias. São Paulo: Difusão Cultural do Livro, 2004.

NÚÑEZ, Antonio. É melhor contar tudo: o poder da sedução das histórias no mundo empresarial e pessoal. Trad. Marylene Michael. São Paulo: Nobel, 2009.

PENTLAND, Alex. É possível medir o poder do carisma. Harvard Business Review. São Paulo: RFM, n.88, p.18-19, jan.2010.

SUNWOLF, J. Era uma vez, para a alma: uma revisão dos efeitos do storytelling nas tradições religiosas. Comunicação & Educação. São Paulo: Revista do Curso de Especialização em Gestão da Comunicação da Escola de Comunicações e Artes da USP, a.10, n.3, p.305-325, set./dez. 2005.

ZUMTHOR, Paul. A letra e a voz. São Paulo: Companhia das Letras, 1993.


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