A legitimação pela viabilização de múltiplas vozes: aplicando o storytelling organizacional
O mundo organizacional certamente não sai ileso deste cenário de interação digital intensa, diante de cidadãos mais propositivos e críticos e detentores de ampla capacidade de comunicação. Como bem lembra Paulo Nassar, as políticas e ações empresariais precisam passar por processos de legitimação, produzidos por meio de processos participativos, os quais acabam envolvendo grande número de protagonistas. Este caminho exige a concatenação dos discursos da ação privada, sem abandonar seus fins produtivos e lucrativos, mas contemplando as aspirações das comunidades, que deve entender seus valores. Neste ínterim, cresce a importância da comunicação e dos relacionamentos entabulados, com o fator de haver um descentramento da fonte emissora, saindo da empresa e migrando para os múltiplos públicos.
É preciso compreender a necessidade de expressão de diferentes interagentes, todos imprescindíveis para a dinâmica de um organismo vivo como as empresas e instituições, requerendo uma visão mais integrada e integradora de formatos e terminologias. A vivência e as percepções dos indivíduos no cenário organizacional precisam ser compreendidas a partir de processos de gestão e comunicação onde a produtividade não seja um aprisionamento. Afinal, a emoção, o sentimento de pertença e o encantamento fogem aos enquadramentos das planilhas e formulários e são sensações facilmente despertadas por projetos de cunho participativo e dialógico, como aqueles desenvolvidos sobre a perspectiva do storytelling – cuja definição organizei em minha dissertação de mestrado na USP: “lógica de estruturação de pensamento e formato de organização e difusão de narrativa, por suportes impresso, audiovisual ou presencial, baseados nas experiências de vida próprias ou absorvidas de um interagente, derivando relatos envolventes e memoráveis”.
As organizações, para acompanhar os novos paradigmas e não perder o engajamento e o aval de seus públicos prioritários para sua continuidade, precisam exercitar o diálogo transparente, com a consciência sobre os amplos impactos que uma sociedade em rede pode causar. O desafio, nesta fase, é utilizar expedientes de franqueza numa negociação aberta e não os tradicionais artifícios de sedução e manipulação que não mais surtem efeito na opinião pública da era digital.
Storytelling faz parte de um processo de posicionamento, de expressão e de troca entre organizações e indivíduos e grupos. Trata-se de um recurso plenamente adequado a um panorama de reconhecimento da multiplicidade de vozes e do descentramento do sujeito corporativo – onde as instâncias de poder são flexibilizadas, já um considerável aumento de conteúdos em circulação de diversas fontes e os ambientes de trabalho exigem relações mais humanizadas. Em cenários como este, comunicação de mando e de produtivismo tem alcance reduzido a médio e longo prazos. Mais ainda, escolhas narrativas, impregnadas deste jeito tradicional de ver o mundo, podem conter simbolismos que boicotam esforços de cunho participativo ou dialógico.
Por isto, storytelling também constitui uma prova de existência de um espaço de democracia e de capacidade de escuta para além da polifonia ou do teor encantador e comprovadamente magnetizante de suas evocações: também pode ser visto como resultado da vontade de compartilhamento, da cumplicidade frente ao futuro e da consciência sobre a importância de cada um na conquista coletiva – mesmo entre agentes cujos objetivos nem sempre são e serão alinhados, dadas as contradições inerentes às relações de trabalho na operação capitalista.
Sem gráficos, sem palavreado erudito, sem percentagens, o storytelling acolhe um novo linguajar em que as sensibilidades são expressadas, e onde os protagonistas são mais verossímeis com os cidadãos do cotidiano, pessoas falíveis como todos os demais, e portanto mais genuínas e mais críveis. As organizações passam a conversar num tom que não existia antes, seja por simples interesse de sobrevivência ou então por clara atribuição de valor à opinião do outro num desenvolvimento integral.
O storytelling pode ser a voz deste novo tempo: conversacional, inclusivo, colaborativo, afetivo, duradouro e memorável. Ou então virar uma ferramenta de fácil saturação e descarte, quando só recorrida por reforço de falseamentos, parcialidades e seduções gratuitas e instantâneas. Caberá aos comunicadores escreverem o desenrolar desta história.
Os artigos aqui apresentados n�o necessariamente refletem a opini�o da Aberje
e seu conte�do � de exclusiva responsabilidade do autor. 1637
Outras colunas de Rodrigo Cogo
14/05/2015 - No caminho de novas narrativas humanizadas
27/02/2015 - A legitimação pela viabilização de múltiplas vozes: aplicando o storytelling organizacional
05/12/2014 - Storytelling como técnica ou processo e seus efeitos na comunicação organizacional: uma entrevista
24/10/2014 - Identidade é o território organizado e assegurado pela memória e pelas narrativas
01/08/2014 - Storytelling em quatro perguntas
O primeiro portal da Comunicação Empresarial Brasileira - Desde 1996
Sobre a Aberje |
Cursos |
Eventos |
Comitês |
Prêmio |
Associe-se |
Diretoria |
Fale conosco
Aberje - Associação Brasileira de Comunicação Empresarial ©1967 Todos os direitos reservados.
Rua Amália de Noronha, 151 - 6º andar - São Paulo/SP - (11) 5627-9090