Identidade é o território organizado e assegurado pela memória e pelas narrativas
As transformações contemporâneas estão ocorrendo cada vez mais rápidas e com variados impactos em toda a sociedade. A competitividade das empresas sofre uma influência considerável dessas mudanças, entre outros fatores pela própria variedade de grupos de inter-relação e pela agilidade de circulação de informações em sociedades integradas globalmente. Como assinala José Cláudio Terra ([s.d.], “as empresas são muito mais porosas, histórias entram e saem de maneira muito mais rápida e com abrangência muito maior”. Os públicos se encontram numa “situação de fragilidade de identidade, de enfraquecimento de vínculos sociais diversos, de busca de sentido, de desorientação quanto ao presente e ao futuro e de carência de referenciais” (Freitas, 2000, p. 57).
Como diz Tereza Halliday (2009, p. 46), os públicos-alvo são “co-atores em construção da legitimidade organizacional, ou seja, da tessitura do consenso para que a organização seja e continue a ser bem aceita como agente econômico, social, cultural e político”. E é nesta perspectiva que este artigo é apresentado: para oferecer reflexões, a partir de determinado conjunto teórico contemporâneo e transdisciplinar, e buscar contribuir com insights para tecer os laços entre memória, identidade e comunicação organizacional em tempo de polifonia.
O filósofo russo Mikhail Bakhtin desenvolve o conceito de polifonia em Problemas da poética de Dostoievski, lançado no Brasil pela Editora Forense em 1981. Significa a presença de outros textos dentro de um texto, causada pela inserção do autor num contexto que já inclui previamente textos anteriores que o inspiram ou influenciam. Ao enfatizar o caráter dialógico do universo artístico de Fiodor Dostoievski, Bakhtin destaca procedimentos especiais de construção narrativa, como a inconclusibilidade temática, a independência e a equipotência de vozes.
Múltiplas vozes e redes de relacionamento
A complexidade e as incertezas de cenário fazem as organizações buscarem formatos de gerenciamento baseados num intenso diálogo e no engajamento de seus públicos de interesse. A construção de redes de relacionamento parte de relações humanas mais abertas e cooperativas, com base em um planejamento que posiciona a comunicação em patamar estratégico e que dá fluidez a múltiplas vozes. É isto que sinaliza o conceito de polyphonic organization proposto por Martin Kornberger, Stewart Clegg e Chris Carter (2006), considerando essa multiplicidade a partir dos públicos de relacionamento de uma organização e, por consequência, a variedade dos discursos que constituem sua realidade. Esses pesquisadores igualmente aludem às vozes silenciadas pelos discursos hegemônicos e entendem que, através da polifonia, é possível estar apto a compreender mudanças nos padrões de organização entre as pessoas. Trata-se da noção de organização como sistemas verbais construídos socialmente, arenas nas quais uma variedade de tramas simultâneas e descontínuas ocorre por diversos atores. Daí deriva toda uma preocupação com o que é dito e como é dito: “o argumento é que organizações são culturas e constantemente precisam de traduções, não só intraorganização e seus espaços discursivos, mas também inter-organizações” (KORNBERGER; CLEGG; CARTER, 2006, p. 7, tradução nossa).
Além disto, deriva uma reflexão acerca da disposição em ter unidade de discurso como estratégia essencial para o cuidado com a reputação – o que continua importante, mas não sem se dar conta de que grandes narrativas, como registro linguístico único, podem facilmente inibir, proibir, limitar, dirigir e prescrever de maneira frontalmente oposta à necessidade polifônica. Por isso, é tão pertinente a visão de Paulo Nassar (2012, p. 132), quando fala sobre o mundo das relações públicas democráticas como “espaço onde a comunicação organizacional valoriza e incorpora a opinião de seus públicos e da sociedade e onde a história pode resgatar vivências e o indivíduo organizacional como protagonista de sua vida, da organização, da comunidade e do país”.
Relações duradouras e valiosas para as organizações, em ambientes de instabilidade, estão relacionadas com questões fundamentais da administração, como a base sobre valores, missão e filosofia. Mas é pela comunicação que tudo se constrói e dissemina, demandando processos e formatos que gerem confiança. Como é possível adiantar, através da análise de estudos de Nassar (2009, p. 302), “o depoimento de vida que nasce no âmbito dos públicos, das redes sociais ou da sociedade tem um alto valor para a formação da confiança na empresa ou instituição, porque é percebido pelos receptores como distante dos interesses das organizações e, também, compatível com os interesses dos receptores”.
É com este escopo que se pode falar nos processos narrativos, na memória e na formação ou consolidação de identidade. Veja mais em artigo feito em conjunto com Paulo Nassar e publicado na edição 20 da Organicom – Revista Brasileira de Comunicação Organizacional e Relações Públicas.
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e seu conte�do � de exclusiva responsabilidade do autor. 2735
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