Sustentabilidade blá, blá, blá...
Cada vez mais, as companhias buscam atuar com comportamento ético e governança verde. A tendência é aumentar o engajamento em ações de responsabilidade social e criar sistemas de rastreamento para gerir um modelo de desenvolvimento sustentável, sem crises e imprevistos.
Como em todo movimento, há referenciais de excelência e modismos. Em junho desse ano, em reunião do Global Reporting Initiative, foi lançado o relatório A Economia Transparente. O estudo mostra que o tema está na ordem do dia, mas que a maior parte das empresas não se posiciona pró ativamente na gestão da sustentabilidade.
O Índice de Sustentabilidade Empresarial, criado há cinco anos pela BM&FBovespa, apesar de ter contribuído com as práticas empresariais sustentáveis é pouco valorizado por gestores e investidores, segundo estudo elaborado pelo Banco Mundial.
Para incentivar a produção publicitária responsável e o consumo sustentável, a ABAP lançou os “Indicadores de Sustentabilidade da Propaganda Brasileira”. São conjuntos de parâmetros e diretrizes para que as agências de publicidade possam adotar práticas sustentáveis em suas atividades e mensurar seu grau de envolvimento. Uma forma de auto-avaliação sobre suas práticas internas e junto a clientes, parceiros e fornecedores.
A sustentabilidade também é alvo do Conselho Nacional de Autorregulamentação Publicitária. O eixo central é criar um limite ético para dizer o que é sustentável. Assim como aconteceu com as campanhas de bebidas alcoólicas, o órgão estuda a criação de medidas para evitar que o tema verde continue sendo usado de forma desordenada pelas empresas e por suas agências.
O Brasil precisa de maior seriedade e de mais engajamento em ações sociais e ambientais. Sobram exemplos do muito a ser feito. A média de geração de lixo no Brasil é de 1,152 Kg por dia / habitante, padrão próximo ao dos países da União Européia, cuja média é de 1,2 Kg. Na cidade de São Paulo, depois de duas décadas de implantação, o sistema de coleta seletiva separa pouco mais de 1% do lixo. É como se cada paulistano mandasse para a reciclagem o peso correspondente a uma garrafa PET a cada seis dias.
Dados recentes, tabulados do Censo 2010 e que balizam as ações do Brasil sem Miséria, mostram que os miseráveis entre os miseráveis ainda são 10 milhões de brasileiros. Sobreviventes que tem renda de até R$ 39 mensais por pessoa. Apesar do estardalhaço em cima do crescimento e ascensão da classe “C” e do aumento dos gastos sociais, a ONU afirma que o país ainda tem baixa mobilidade socioeconômica. Só perdemos para Bolívia e Haiti em diferença entre ricos e pobres.
Nesse final de junho a dívida das famílias brasileiras atingiu nível recorde de R$ 653 bilhões, o que corresponde a 40% da massa anual de rendimentos. Se tivessem que pagar juros (os encargos somam 60% do total) e quitar empréstimos, cada brasileiro teria que entregar 4,8 meses de rendimento para zerar suas pendências.
Na definição do Instituto Ethos: RSE é a forma de gestão que se define pela relação ética e transparente da empresa com todos os públicos com os quais ela se relaciona e pelo estabelecimento de metas empresariais que impulsionem o desenvolvimento sustentável da sociedade, preservando recursos ambientais e culturais para as gerações futuras, respeitando a diversidade e promovendo a redução das desigualdades sociais. Ainda, segundo o Ethos, seus associados têm faturamento anual correspondente a cerca de 35% do PIB brasileiro e empregam em torno de 2 milhões de pessoas.
É um significativo universo que compartilha o interesse em estabelecer padrões éticos de relacionamento com funcionários, clientes, fornecedores, comunidade, acionistas, poder público e com o meio ambiente.
Bom também é saber que as parcerias público-privadas estão levando práticas empresariais a governos, como a do Movimento Brasil Competitivo que tem propiciado economia do dinheiro público e maior eficiência nos projetos do Estado. A Fundação Bradesco, com mais de cinco décadas de atuação, discreta em seu marketing social, soma 40 escolas em todos os Estados, com o atendimento de 115.260 alunos no ano passado. A Fundação Amazonas Sustentável, com seu programa Bolsa Floresta, é pioneira no pagamento de serviços ambientais para populações que vivem na área e que se comprometem com a redução do desmatamento.
A Escola Politécnica da USP criou o primeiro fundo brasileiro para administrar doações de ex alunos empresas. Conhecido como endowment é bem comum nos EUA, Inglaterra e Canadá. A Natura tem exemplo interessante de cadeia sustentável, levando em média seis meses, para incluir uma comunidade extrativista entre seus fornecedores. O trabalho minucioso envolve ONGs, antropólogos, comunidades e Ministério Público, entre outras instituições.
Lá fora Bill Gates, da Microsoft, e Warren Buffett da Berkshire Hathaway, comandam a Giving Pledge, em que mais de 100 bilionários como eles doam pelo menos metade da riqueza à caridade. O casal Bill e Melinda realiza a maior parte da atividade filantrópica por meio da própria fundação. Agora sonda laboratório público brasileiro para financiar a produção de imunizantes e aumentar o acesso às vacinas, derrubando os preços em todo o mundo.
São muitas as organizações que investem em projetos com finalidade pública. Temos bons exemplos e caminhamos para que mais ações sejam referências, mas ainda há colossais disparidades e muito a ser feito. As ações de Responsabilidade Social Empresarial geralmente são desenvolvidas por profissionais que estão no guarda chuva da Comunicação Organizacional. Mas, assim como as ações de política cultural, passam pela área especialmente como divulgação de feitos e eventos. Algumas vezes como gestão de crise quando envolve incidentes com alguma comunidade, ONG ou dano ambiental. A área, lamentavelmente, raras vezes participa intimamente dessa gestão.
O sociólogo Daniel Goleman, no best seller Inteligência Emocional, diz que é fundamental adotar a análise do ciclo de vida dos produtos, desenvolver inteligência ecológica e assumir que vivemos em um mundo com recursos finitos. Empresas devem atuar diretamente em todas as etapas de seu processo produtivo, mesmo naquelas terceirizadas. Hoje, com tantos Zettabytes de informação circulando livremente não é admissível um usineiro afirmar não saber que emprega trabalho escravo.
É incompatível empresas ocuparem edifícios Triple A, certificados pelo Green Building Council, com comprovada eficiência energética, mesas coletivas, liberdade de armários, mas com jornadas de 60 horas semanais. A Revista Você SA, desse mês de junho, trouxe como assunto de capa a “epidemia workaholic”, abordando a neurose do trabalho, as jornadas de 12 horas e os finais de semana com tarefas da empresa.
É incoerente ter prêmios de sustentabilidade, ser perene anunciante nas publicações sobre ética e congênere, mas forçar a emissão de alvará sem cumprir contrapartidas com a população de Campinas. A ética e a sustentabilidade se fragilizam perante dicotomias entre discurso e prática empresarial.
Não basta arrematar no leilão social aquela chuteira do craque ou a peça de vestuário achando que termina ai a vocação filantrópica da pessoa física e a trajetória ética da pessoa jurídica. Deveria haver uma espécie de certidão negativa da ética e a empresa / personalidade só poder receber algum prêmio ou certificado se, efetivamente, suas pessoas física e jurídica tivessem atuado com transparência.
Com o excelente título “A Pátria Mãe Subtraída”, da música de Chico Buarque, a Revista Época Negócios, de fevereiro de 2011, trouxe entrevista com o antropólogo Roberto daMatta. Ele disse que a corrupção no Brasil se tornou um valor, uma forma de organizar a administração, Afirmou que “mudanças não dependem exclusivamente de maneira como é gerido o Estado, mas de como governam suas próprias vidas e seu relacionamento com outros em sociedade”.
Afinal, não existe sustentabilidade sem mudanças, traficante sem drogado, ética sem esforço, nem corrupção sem corrupto.
Os artigos aqui apresentados n�o necessariamente refletem a opini�o da Aberje
e seu conte�do � de exclusiva responsabilidade do autor. 2098
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