Diálogo na rede: quem disse que não dá?
Estudei a arte do diálogo com grandes mestres. Com Krishnamurti, David Bohm e Humberto Mariotti, tive contato com os fundamentos. Com Otto Scharmer, conheci os diálogos generativos. Com Humberto Maturana e Ximena Dávila, fui introduzido aos diálogos reflexivos recursivos. Todos eles, indistintamente, afirmam que o diálogo para valer só acontece na presença de seus interlocutores – “o conversar precisa da corporalidade”, diz Maturana.
Tive várias experiências que demonstraram a validade dessa teoria. No entanto, o maior aprendizado de todos não tem a ver com os livros que li nem com as palestras que assisti. O grande ensinamento deixado por meus mestres é um só: diálogo se aprende dialogando. E a prática, paradoxalmente, tem me mostrado que eles estão errados! Bem, estão errados partindo da premissa de que a verdade que eles apresentam sobre o “diálogo para valer” não coincide com minha própria verdade. Tendo em vista que estamos falando de alguns dos maiores expoentes e defensores do pensamento complexo, parto do pressuposto de que eles entenderiam minha posição, afinal, “o mundo em que vivemos é o que construímos a partir de nossas percepções. Por conseguinte, nosso mundo é a nossa visão de mundo. Se a realidade que percebemos depende da nossa estrutura – que é individual -, existem tantas realidades quantas pessoas percebedoras” (Humberto Mariotti).
O fato é que participo de diálogos e observo outras pessoas dialogando em ambientes sem a participação da presença física – ou seja, sem a possibilidade de qualquer contato físico. E estou falando de diálogos para valer, onde as pessoas confiam umas nas outras, se respeitam e refletem sobre – e revelam - seus próprios pressupostos – Maturana prefere a expressão “sistema de validação”, na medida em que define pressupostos como as crenças que utilizamos para validar ou não o que dizemos e o que ouvimos do que o outro diz.
Segundo Bohm, “o diálogo pode ocorrer com qualquer número de pessoas, não apenas com duas. Mesmo uma só pessoa pode ter o sentimento dialógico dentro de si, se o espírito do diálogo estiver presente.” Pois é, para que o diálogo aconteça, basta uma única pessoa, desde que esta tenha a disposição de se observar e refletir sobre suas próprias verdades. Em outras palavras, a plataforma é secundária. Prova disso é que, num passado remoto, um mundo sem internet ou telefone se virava com o correio para dialogar à distância. E hoje, dialoga-se em plataformas como Orkut, Twitter, Facebook e até email. Sobre este último, quando questionei meu filho de 13 anos por que ele ainda não tinha emal, ele simplesmente saiu com essa: “Para que email, pai, se eu posso falar com meus amigos por MSN?”. Provavelmente, eu seria da mesma opinião se tivesse ganho um celular aos 8 anos de idade e, quase ao mesmo tempo em que me alfabetizava, fosse apresentado a uma ferramenta extremamente barata e de interface ridiculamente simples, que me conectasse rapidamente a meus amigos, na hora que fosse e aonde quer que estivéssemos.
Todas as mídias servem para dialogar, desde que os fundamentos do diálogo sejam respeitados. E, por favor, vamos acabar com essa história de relacionamento virtual, sexo virtual, diálogo virtual. Não tem nada de virtual, pois a relação não se dá entre máquinas ou entre pessoas e máquinas. A máquina é só a interface. A relação é real, entre seres humanos de carne e osso, coração e mente.
Plataformas podem facilitar ou dificultar o diálogo, mas não garantem ou impedem que ele aconteça. Quem define esse jogo é a intenção de quem resolve participar dele. Você pode utilizá-la para destilar seu veneno, praticando a intolerância e impondo suas opiniões como únicas válidas ou ampliar sua visão de mundo a partir da exploração sem julgamento da verdade do outro. Para isso, no entanto, você precisará se conectar com o maior e mais importante dos fundamentos do diálogo: o amor. Pois é, só o amor nos conecta de verdade por meio do diálogo, mostrando que a relação que construímos juntos faz tudo valer a pena. Sem ele, a alma fica pequena, bem pequena.
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