A mudança (organizacional) só acontecerá se começar por você
Nos programas de comunicação face a face que realizo com gestores de vários níveis da hierarquia organizacional, observo uma tendência de atribuir a responsabilidade pela comunicação a alçadas superiores ou a outras áreas. E isso se dá desde os encarregados de chão de fábrica até os executivos da direção. Tal fenômeno me obrigou a ser mais rigoroso no momento de estabelecer e combinar o escopo do nosso trabalho conjunto: só focamos as questões de comunicação entre os próprios gestores participantes do programa e entre cada gestor e sua equipe. O que está por trás dessa regra é simples: não há como resolver um problema quando se crê não ser responsável por ele.
Tenho observado fenômeno semelhante quando trabalho com outro público, os profissionais de comunicação. Só que, junto com a crença que o problema da comunicação face a face é do outro – no caso, os gestores - aparece a necessidade de entender como aplicar nesse outro o novo conhecimento aprendido. Em princípio, não há nada de errado nisso, afinal, numa organização a área de Comunicação é prestadora de serviços por natureza. Colocar-se a serviço do outro, seja ele um gestor, ou uma outra área, ou a organização como um todo, é premissa básica para se atuar em Comunicação. No entanto, há conhecimentos que não são “aplicáveis” no outro por terceiros. O diálogo, base da comunicação face a face, é um deles.
Não se aprende diálogo lendo livros ou ouvindo palestras. Aprende-se a dialogar – pasme! – dialogando. A prática não apenas torna o diálogo possível, como lhe atribui significado. Compreende-se o diálogo – seu mecanismo de funcionamento e seu valor para os que dele participam– ao dialogar. Neste caso, a prática vem antes da teoria, sendo esta a fundamentação de algo que se vivenciou de fato. Caso contrário, o diálogo tende a se restringir a uma teoria explicativa, e não há qualquer utilidade em saber como o diálogo funciona sem que ele aconteça.
Conheço pessoas que são mestres na arte de dialogar e não fazem a menor ideia do que seja o “diálogo de Bohm” ou a escuta fundamentada pela Biologia-Cultural de Humberto Maturana e Ximena D’Avila.
Os profissionais de comunicação não querem apenas aplicar os conhecimentos sobre o diálogo no outro. Muitos deles parecem não perceber outra premissa fundamental: os primeiros que precisam de ajuda são eles mesmos. Do mesmo modo que os gestores que desejam ajudar, eles também estão imersos na cultura dos “jogos políticos”, sustentada por medo, desconfiança, desrespeito, mentira, entre outros valores apregoados por uma sociedade que ainda acredita que o sucesso só é possível via competição.
Ou você é rolo compressor ou é asfalto, não é assim?
O resultado é que vão ensinar ao outro algo que o outro só é capaz de aprender sozinho e, o que é pior, tentam transmitir uma dinâmica relacional com a qual eles mesmos, os profissionais de comunicação, também enfrentam enormes dificuldades. Observo que, além dos bloqueios trazidos pela cultura corporativa, há uma certa resistência em reconhecer a necessidade de ajuda e, portanto, de aprimorar-se como ouvintes pela prática do diálogo. Como consequência, mostram-se muito mais preocupados em como levar esse conhecimento para frente do que utilizá-los em si mesmos.
Nenhuma empresa irá mudar se as pessoas que a constituem não mudarem.
Nenhum gestor se tornará um agente efetivo de comunicação com sua equipe se a área que o assessora nessa função não se tornar ela também o exemplo em comunicação com sua própria equipe. Como disse o filósofo americano Ralph Waldo Emerson, “suas atitudes falam tão alto que eu não consigo ouvir o que você está querendo dizer”. E para citar uma outra frase, esta de Gandhi, a quem sempre recorro quando percebo esse movimento de transferência de responsabilidade, “seja a mudança que você deseja ver no mundo”. Simples assim.
Referências: “Diálogo e Redes de Convivência” (David Bohm), “O Habitar Humano em seis ensaios de Biologia-Cultural” (Humberto Maturana e Ximena D’Avila), “Jogos Políticos nas Empresas” (Maurício Goldstein e David Read)
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