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COLUNAS


Rodrigo Cogo
rodrigo@aberje.com.br

@rprodrigo

Relações Públicas pelo Curso de Comunicação Social da Universidade Federal de Santa Maria , é especialista em Gestão Estratégica em Comunicação Organizacional e RP e Mestre em Ciências da Comunicação pela Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo. Trabalhou por 10 anos com planejamento e marketing cultural para clientes como AES, Bradesco, Telefonica e BrasilTelecom. Tem experiência em diagnósticos de comunicação, para empresas como Goodyear, HP, Mapfre, Embraer, Rhodia e Schincariol. Atualmente, é responsável pela área de Inteligência de Mercado da Aberje, entidade onde ainda atua como professor no MBA em Gestão da Comunicação Empresarial.

Retórica organizacional: uma proposta de uso do storytelling na promoção do diálogo

              Publicado em 05/01/2011

Com o advento das novas tecnologias, a oralidade ressurge com importância inegável e se torna, no meio corporativo, fator decisivo no relacionamento com diversos públicos, instaurando importantes transformações nos processos comunicativos contemporâneos (MARTINS E FORTES, 2007, p.47). Gaudêncio Torquato (2009, p.7-28) traz um postulado de defesa do “poder expressivo”, defendido por ele junto à topologia adotada por Amitai Etzioni e ao lado dos poderes remunerativo, normativo e coercitivo. A intenção foi mostrar o poder da comunicação como fundamental para as metas de engajamento e participação e obtenção de eficácia. Ele explica que se poder é a capacidade de uma pessoa em influenciar uma outra para que esta aceite as razões da primeira, isso ocorre por força da argumentação. A relação de poder pode ser referida a partir do ato comunicativo. A proeminência da oralidade é dada pela capacidade para integrar e harmonizar os discursos semântico e estético, com a condição de animar os ambientes, atrair a atenção e a simpatia de ouvintes e interlocutores.

Convém assinalar que a noção de retórica como discurso vazio ou enganoso é equivocada, afinal, como assinala Torres (online, 2002), “ao contrário, ela é o resgate de uma ‘gestão do discurso’ por meio de argumentos escolhidos dentro de uma tríade do conhecimento: lógica, emoção e ética”. Desde a Antiguidade, a prática da retórica consiste no uso de argumentação como instrumento de gestão dos negócios humanos (HALLIDAY, 1998, p. 32). Para a pesquisadora, gestão é uma soma de atos administrativos e atos retóricos, sendo que “os comunicadores empresariais enfrentam novas cobranças profissionais: serem co-gestores da empresa, tratarem a comunicação organizacional da Nova Era como importante ferramenta estratégica de gestão [...] estão finalmente assumindo a construção simbólica da realidade empresarial como legítimos agentes retóricos que são”.

Domingos (2008, online) não hesita em afirmar que narrar história tornou-se um meio eficaz da comunicação institucional da empresa que utiliza a retória persuasiva como forma de promover uma simbiose empática entre diferentes interlocutores. A estruturação de inteligência em contação de histórias numa organização encontra um reforço numa vasta literatura de metáforas neste ambiente. A associação entre o poder da palavra e a função do cultor da memória, a partir da tradição de uma cultura oral, revela o imenso poder conferido à palavra, apresentado por uma relação quase mágica que acontece entre o nome e o que é nomeado a partir da pronúncia. É interessante a reflexão de Benjamin (1986b, p.200), para quem, desde a ruptura do sistema corporativo medieval e a ascensão da burguesia europeia, foram iniciadas as condições desfavoráveis de aproximação entre o narrador e seus ouvintes. O então sistema artesanal era propício para o encontro entre experiências do mestre e as vivências dos aprendizes, algo que o sistema fabril veio a romper.

As bases conceituais de História Oral são preciosas nesta análise. Diz Oliveira (2005, p.44): “a história oral recupera aspectos individuais de cada sujeito, mas, ao mesmo tempo, ativa uma memória coletiva, pois, à medida em que cada indivíduo conta a sua história, esta se mostra envolta em um contexto sócio-histórico que deve ser considerado”. Oliveira (2006, p.245) defende “uma história que necessita ser cantada, em vez de contada”, tal o teor poético que deve compreender para garantir uma aura de magia e de atratividade. As histórias transportam para outro mundo, fazendo com que as pessoas envolvidas sintam as emoções e as sensações, sendo que “o narrar possibilita que o aprendiz mergulhe na história e possa meditar sobre ela, favorecendo o desenvolvimento da sensibilidade artística” (PEREIRA; VEIGA; RAPOSO; FUKS; DAVID; FILIPPO, 2009, p.101). Os relatos são criações narrativas com espontaneidade. O passado narrado carrega sempre uma opinião, porque a arte do narrar envolve a coordenação da alma, da voz, do olhar e das mãos. A narração é uma prática de linguagem e se renova a cada experiência de recordar, pensar e contar, porque “a narração avança e recua sobre a linha do tempo, como que transbordando a finitude espaço-temporal que é própria dos acontecimentos vividos” (BENJAMIN, 1986a, p.37). A narração doa um tempo e um lugar, uma sequência e uma causalidade às reminiscências.

O storytelling, na esteira de pensamento de Mota (2007, online), é um formato cross-mídia e de marketing desenvolvido pelas organizações, notadamente de mídia em seus núcleos de dramaturgia. É um processo que resulta de uma prática recuperadora do passado como alvo de inspiração e de recriação argumentativa, na proposta de estabelecer um trampolim para manter diálogos produtivos com diversos públicos no presente e até obter vantagens sobre concorrentes no futuro. Narrar histórias tornou-se um meio eficaz da comunicação institucional que utiliza a retórica persuasiva como forma de promover uma simbiose empática entre diferentes interlocutores. Para Terra ([s.d.], online), storytelling é “o ato de contar histórias de forma deliberada e sistemática como forma de transferir conhecimentos, cultura e valores. E também inspirar, gerar coesão social e conectividade emotiva entre os indivíduos”.

A fonte oral proporciona a visão individual e subjetiva dos acontecimentos, que entretém constante diálogo com o sentir de um grupo (familiar, local, étnico, nacional) e de uma época. Como entende Vangelista (2006, p.185), “expressa-se, entre outras palavras, em narração, com a construção de uma trama, na qual herói e os demais protagonistas, tipos sociais e psicológicos, desenvolvem um vivido”. Toda organização tem histórias de guerra, com heróis e visões de mundo construídas a partir de pequenas ou grandes anedotas, que se transmitem diariamente e perpetuam seu ethos (TERRA, [s.d.], online). E com isto os valores da organização vivem nas histórias que são contadas, revividas e relembradas a cada momento.

É preciso reconhecer, todavia, que a investigação sobre histórias em organizações, desdobrada em narrativas, histórias, relatos, contos, mitos, fantasias e sagas, é um tema ainda novo. Por isto, é tão importante pesquisar os processos de contação de histórias como ativadores de um renovado envolvimento da comunicação organizacional com os públicos desejados e de uma postura de interlocução e de escuta amplas em direção aos interagentes sociais. O storytelling vem justamente favorecer a empatia, uma habilidade comunicativa com alto nível valorativo e que motiva, de maneira extraordinária, o desenvolvimento relacional.

CASOS – Em minhas andanças por eventos sobre comunicação, pude ver alguns usos de storytelling. A Telefonica é um dos exemplos, quando deu foco às histórias individuais dos funcionários no programa de recrutamento interno “Gente em Movimento”, levando a equipe à protagonista da comunicação com suas conquistas pessoais e profissionais. É o exercício democrático da voz no ambiente de trabalho, inclusive para situações cotidianas e para eclosão da emoção. A Mastercard e sua campanha “Funcionários Compromissados: não tem preço” é outro bom caso, em que uma coleta de fotografias pessoais à livre escolha deu partida para o compartilhamento de histórias, e as eleitas como melhores deram direito a brindes. Neste caso, foi estendido ainda a consumidores, que enviaram mais de 70 mil fotos e histórias, que ilustraram um site compilador, anúncios impressos e VTs.

Se você já viu alguma ideia assim, compartilhe com todos nos comentários deste artigo ou no meu email rodrigo@mundorp.com.br .


REFERÊNCIAS

BENJAMIN, Walter. O narrador: considerações sobre a obra de Nikolai Leskov. In: BENJAMIN, Walter. Obras escolhidas. 2ª.ed. São Paulo: Brasiliense, 1986b, p.197-221.

BENJAMIN, Walter. A imagem de Proust. In: BENJAMIN, Walter. Obras escolhidas. 2ª.ed. São Paulo: Brasiliense, 1986a, p.36-49.

DOMINGOS, Adenil Alfeu. Storytelling: narrativas midiadas como fenômeno de comunicação institucional. Jornada de Ciências da Saúde e Jornada de Ciências Sociais Aplicadas, III, 2008, Bauru, SP. Anais... Bauru, SP: Faculdades Integradas de Bauru, 2008a. Disponível em: < http://www.fibbauru.br/files/Storytelling-%20narrativas%20mediadas%20como%20fen%C3%B4meno%20de%20comunica%C3%A7%C3%A3o%20institucional.pdf>. Acesso em: 15 abr.2010.

HALLIDAY, Tereza. A missão do retor. Comunicação Empresarial. São Paulo: Aberje, n. 29, p. 32-35, 3. trim. 1998.

MARTINS, Marta; FORTES, Waldyr. Desenvolvimento da comunicação organizacional agencia a constância da oralidade. Communicare – revista de pesquisa. v.7, n.1. São Paulo: Faculdade Cásper Líbero, 2007, p.45-56.

MOTA, Maurício. Transmedia Storytelling. Coxa Creme. 4.dez.2007. Disponível em: <
http://www.coxacreme.com.br/2007/12/04/transmedia-storytelling>. Acesso em: 13 fev.2010.

OLIVEIRA, Valeska Fortes de. Educação, memória e histórias de vida: usos da história oral. História Oral, São Paulo: Associação Brasileira de História Oral, v.8, n.1, p.91-106, jan./jun. 2005.

PEREIRA, Andréia; VEIGA, Kátia; RAPOSO, Alberto; FUKS, Hugo; DAVID, Viviane; FILIPPO, Denise. Storytelling imersivo colaborativo: Time2Play no Second Life. Simpósio Brasileiro de Sistemas Colaborativos, VI, 2009. Fortaleza. Anais... Fortaleza: Ed. IEEE-CS. out. 2009. p.99-105. Disponível em: <http://groupware.les.inf.puc-rio.br/groupware/publicacoes/SBSC09_Time2Play_Final1.pdf>. Acesso em: 20 abr. 2010.

TERRA, José Cláudio. Storytelling como ferramenta de gestão. In: Biblioteca Terra Fórum. São Paulo, [s.d.]. Disponível em: < http://www.terraforum.com.br/biblioteca/Documents/Storytelling%20como%20ferramenta%20de%20gest%C3%A3o.pdf>. Acesso em: 21 mai.2010.

TORQUATO, Gaudêncio. Da gênese do jornalismo empresarial e das relações públicas à comunicação organizacional no Brasil. In: KUNSCH, Margarida M. Krohling (Org.). Comunicação organizacional – histórico, fundamentos e processos. Vol.1. São Paulo: Saraiva, 2009. p.7-28.

TORRES, Alvair Silveira Junior. Retórica organizacional: lógica, emoção e ética no processo de gestão. RAE-eletrônica, São Paulo, v.1, n.2. jul./dez. 2002 Disponível em: <
http://www16.fgv.br/rae/artigos/1458.pdf>. Acesso em: 26 mar. 2010.

VANGELISTA, Chiara. Da fala à história: notas em torno da legitimidade da fonte oral. In: LOPES, Antonio Herculano; VELLOSO, Monica Pimenta; PESAVENTO, Sandra Jatahy (Orgs.). História e linguagens: texto, imagem, oralidade e representações. Rio de Janeiro: 7Letras, 2006. p.185-193.


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