Apresento uma proposta para o desenvolvimento de um programa de comunicação de liderança para uma empresa. O executivo de Comunicação me chama para conversar. A proposta foi muito bem avaliada pela área de RH e pelo gerente-geral da fábrica onde o programa seria implantado em modo piloto. Só havia um detalhe: não seria possível realizar workshops com turmas diversas, ou seja, multi-hierárquicas e multifuncionais, conforme previa a proposta. O motivo é que, na empresa em questão, os programas de desenvolvimento da liderança eram segmentados por nível hierárquico – havia o programa para a alta gerência, outro para a média gerência e, claro, havia também o programa para o baixo clero. Enfim,
cada um no seu quadrado.
Resolvi contar ao meu interlocutor a história do macaco. Um roteirista envia seu projeto para um grande produtor de Hollywood. Depois de alguns dias, este liga para o roteirista: “Olha, gostei muito do seu material. Eu só tiraria o macaco.“ O nome do filme? King Kong.
Não foi a primeira vez que alguém me pede para tirar o macaco. Ao término da história, invariavelmente, segue-se um silêncio, às vezes, constrangedor. Desta vez, o amigo executivo rebateu de pronto: “Aqui os programas funcionam assim. “Como num jogo de xadrez, o silêncio voltou para mim. Sem nenhum talento para o xadrez, muito menos para os jogos corporativos de poder, fui direto: “Funcionam?“. Silêncio. “Se as coisas funcionam, vocês não precisam de mim.“
Suspeito que a proposta de trabalho que inspirou esta reflexão não será aprovada. Pela forma como a conversa caminhou, parece que a empresa quer obter resultados diferentes sem mudar a forma como as coisas são feitas. O fato é que, quando as coisas não funcionam, é preciso fazer algo diferente. E organizar um programa de desenvolvimento de comunicação tendo como base o modelo de rede distribuída não é apenas fazer diferente. É reconhecer que a responsabilidade pela comunicação e, por meio dela, pelo engajamento não pertence ao domínio da hierarquia. O que quero dizer é que o gerente-geral não é mais responsável pela comunicação ou pelo engajamento do que, por exemplo, o encarregado de uma célula de produção. Além disso, problemas de comunicação normalmente não estão “nas“ pessoas, mas “entre“ as pessoas. Quer implantar um programa de comunicação “top-down“ que funcione? Coloque representantes dos diversos níveis para conversar e convide-os a construir juntos um processo que faça sentido para todos os envolvidos.
Em comunicação face a face, considerar os líderes como mero instrumento para atingir aos demais colaboradores não funciona. Não incluir a pauta dos próprios líderes no pacote a ser cascateado também não funciona. Não envolvê-los na construção do processo não funciona. Essas táticas não funcionam porque, quando uma parte importante em um determinado processo não é devidamente envolvida, ela resiste. Mas não funcionam, principalmente, porque soluções fragmentadas não servem para problemas complexos. É preciso contar com toda a inteligência de um sistema para endereçá-los. Como fazer isso? Criando espaços onde a liderança experimente atuar de maneira colaborativa, horizontal, em rede distribuída. Encontros com turmas diversas de lideres praticando uma conversa aberta e dialógica. É sobre isso que estamos falando.
Por outro lado, nada do que escrevi aqui deve ser encarado como um modelo a ser seguido. Receitas funcionam para bolo. Não servem para questões complexas, imprevisíveis, mutantes, ou seja, tudo o que envolve pessoas. Programas de comunicação de liderança devem ser concebidos para atender as especificidades de cada organização, o momento que cada uma vive, sua cultura, seus sonhos, seus desafios particulares. Flexibilidade, portanto, é fundamental, dá para mexer em diversas variáveis, mas, por favor, no macaco não!