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COLUNAS


Rodrigo Cogo
rodrigo@aberje.com.br

@rprodrigo

Relações Públicas pelo Curso de Comunicação Social da Universidade Federal de Santa Maria , é especialista em Gestão Estratégica em Comunicação Organizacional e RP e Mestre em Ciências da Comunicação pela Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo. Trabalhou por 10 anos com planejamento e marketing cultural para clientes como AES, Bradesco, Telefonica e BrasilTelecom. Tem experiência em diagnósticos de comunicação, para empresas como Goodyear, HP, Mapfre, Embraer, Rhodia e Schincariol. Atualmente, é responsável pela área de Inteligência de Mercado da Aberje, entidade onde ainda atua como professor no MBA em Gestão da Comunicação Empresarial.

Comunicação Organizacional Intercultural: tópicos para pensar a diversidade

              Publicado em 10/08/2010

A globalização, como processo de estreitamento de fronteiras entre países com vistas à exploração de novos mercados consumidores, deu partida também a uma necessária ampliação de horizontes culturais. Vê-se que, menos do que se tornar um fato perigoso no sentido de perda de identidades ou massificação de hábitos e costumes, aconteceu uma oportunidade tremenda de exercitar e valorizar a alteridade e a diversidade, com a aproximação e mesmo a mistura de diferentes origens étnicas, sociais, comportamentais e religiosas. Como apela Celita Carvalho (apud MEIRELLES; BARROS, 2005, p.6), “é imprescindível que as nações não se esqueçam de seu passado histórico, não correndo assim o risco de negligenciar sua cultura”. Exatamente nesta perspectiva, constata-se uma firme alteração de comportamento nas organizações nacionais e transnacionais, agora muito mais preocupadas com a contemplação de expectativas particulares de públicos onde opera.

Tem cabido a profissionais de comunicação organizacional compreender estas idiossincrasias em forma de cumprimento e de tratamento, linguagem, vocabulário, gestos, crenças, folclores e mesmo práticas nem sempre institucionalizadas. Afinal, as relações comerciais, empresariais e sociais estão baseadas cada vez mais no intercâmbio entre os povos, estimulados pelos avanços da telemática. Neste ínterim, o conhecimento e a assimilação de hábitos e costumes é ponto fundamental, assim como sua difusão, para as organizações pretendentes à multinacionalidade – sem esquecer que, ainda que num mesmo território, as possibilidades interativas interculturais são praticamente inevitáveis diante de tantos fluxos de pessoas e profissionais imigrantes e expatriados. Isto tudo envolto num dilema permanente de comunicar ao mesmo tempo e de maneira compreensível e transparente tanto a consideração com as diferenças quanto a importância de valores corporativos padronizados em direção a uma cultura organizacional identificável – atitudes e tomada consequente de decisões que expressem escolhas diretivas planejadas.

Estamos em tempos de descentralização do gerenciamento e de delegação crescente de responsabilidades para unidades de negócio, numa ressonância ao espírito empreendedor. Não há mais espaço para aguardar decisões da matriz ou para implantar pacotes fechados de processos e informações. O que está em jogo é a capacidade de engajamento pelo diálogo, e portanto pela transparência e pela escuta. O deslocamento entre equipes que planejam em um país e por equipes que executam em outro país está em total descompasso com a necessidade imperiosa de participação e integralidade dos talentos. Hofstede (1997, p.17) não hesita em afirmar que o mundo está cheio de confrontações entre pessoas, grupos e nações que pensam, sentem e agem de forma diferente. Ao mesmo tempo, enfrentam problemas comuns que, para serem solucionados, requerem cooperação, como as questões de ordem ecológica, econômica, sanitária e meteorológica – que não param nas fronteiras. E complementa, sugerindo que “é importante compreender as diferenças no modo de pensar, sentir e atuar desses líderes e seus seguidores se quisermos encontrar soluções viáveis à escala mundial” (HOFSTEDE, 1997, p.18), já que não se pode pensar numa perspectiva meramente técnica. Recorrer a um ponto-de-vista monocultural, como assinala Fernandez-Collado (2008, p.172), como faz a maioria das pessooas, é um equívoco. Seria preciso adentrar na aprendizagem de ver o mundo de múltiplas maneiras. Os complexos processos que resultam de novos níveis de contato, vizinhança e convívio entre os povos, colocando todos como interdependentes – e absolutamente conectados via meios de comunicação eletrônica em tempo real, exige um repensar na gestão comunicacional. A chamada “comunidade mundial” evidencia sua imensa diversidade de interesses e expectativas, potencialmente perturbadores e tensionais, se não de fato rivais, e as organizações precisam ainda assim trabalhar na busca do comprometimento junto ao conflito.

Para Fernandez-Collado (2008, p.174, tradução nossa), “comunicação intercultural é um processo de interação simbólica entre indivíduos e grupos com diferenças culturais reconhecidas nas percepções de conduta e influenciadores no resultado do encontro”. É ter clareza que cada participante de um encontro intercultural apoia-se em suposições culturais próprias, que atuam como filtros perceptivos das mensagens compartilhadas e que intervêm nas interações pessoais ou intergrupais. A conceituação proposta pelo ITIM Culture and Management Consultancy, inspirados pelos estudos de Geert Hofstede, é semelhante: comunicação intercultural é alcançar a unidade global através da incorporação da diversidade cultural. Schuler (2009, p.246) diz que a cultura é “definida como um processo coletivo de construção da realidade, por meio da representação, que permite que as pessoas vejam, interpretem e entendam a realidade compartilhada”. Daí que a aderência dos conceitos de cultura e comunicação torna-se evidente, pois gerar cultura é compartilhar significados.

Entre as variáveis culturais identificadas como potencialmente problemáticas no processo de comunicação intercultural, encontram-se a linguagem, os códigos não-verbais, a concepção de mundo, padrões de pensamento e papel desempenhado nas relações. Na opinião do ITIM, entre os itens básicos para o desenho da comunicação  intercultural estão a linguagem (tradução textual e significado), o estilo de comunicação (verbal e não-verbal, linear ou não-linear, direta ou indireta), a matriz (ênfase em comunicação interpessoal ou mediada) e o estilo retórico (indutivo e dedutivo).

Alguns elementos essenciais para outros pesquisadores, como Schuler (1995, p.1) são a língua, as instituições, as produções e os elementos simbólicos e sagrados, favorecedores da homogeneidade cultural junto com a religião, etnia, condições climáticas e geográficas e modos de distribuição de renda. A linguagem é tida como fator mais importante neste universo, porque o idioma influi em quanto e como se percebe e como se interpreta dentro de padrões sintáticos, morfológicos e fonológicos. Talvez por isto tende a ser o foco das organizações no encaminhamento de traduções de seus materiais – mas não se deve parar por aí. Os códigos não-verbais também precisam ser considerados, como mensagens que operam num nível quase de inconsciência – e por isto também podem ser mal-interpretados, mostrando situações recorrentes num povo, como movimento de olhos, distância física entre os interlocutores, ações afirmativas com a cabeça, uso das mãos no processo argumentativo, expressões faciais diversas, silêncios ou repetições de fala.

PECULIARIDADES CULTURAIS - É possível detectar muitas diferenças de operação mental e prática social entre os povos, algumas delas já registradas em livro (ver MEIRELLES; BARROS, 2005). Na China e Coréia, não arrotar à mesa, logo após a comida, significa que não se apreciou a refeição. Nestes países, a pele branca é um sinal de prosperidade, pois indica que você não tem de trabalhar exposto ao sol, como muitos camponeses pobres que ficam bronzeados. Já no Japão, é costume entregar cartões comerciais (meishi) com as duas mãos, num gesto visto como uma forma de denotar confiança e expressar credibilidade. Lá, é preciso evitar objetos em número de quatro, porque é um indicador da morte. Ao ir em países da Europa Oriental, convém atentar que abrir a porta para o visitante sair seria descortesia, pois tem o significado de "ponha-se na rua”. A Índia também traz algumas peculiaridades, como o fato de um comportamento adequado à mesa envolver cuspe, arroto e palito nos dentes. No Iraque, por sua vez, não se pode mostrar a sola do sapato para as pessoas, porque o costume local pede que se mantenha as pernas unidas, como as mulheres fazem. O mundo árabe proíbe dirigir a palavra à mulher e, se for presenteá-la, entregar ao marido. No Tibete, mostrar a língua é cumprimento, dado haver uma crença de que o diabo tem língua azul. A cor amarela não pode ser utilizada na Malásia, em roupas, pinturas de residência ou automóvel e ainda em flores ou papéis de embrulho – ela é exclusiva da monarquia.

A Folha de S.Paulo relatou uma série de gafes cometidas por empresas brasileiras no exterior (POUCA..., 2010), como um fabricante de cera depilatória cuja embalagem com pernas femininas em destaque ofendeu os Emirados Árabes ou a produtora de filmes que costumava parar o trabalho na China a partir de determinada jornada de horas executadas, o que não é comum entre os trabalhadores de lá. Há ainda relato de empresário que quase perdeu negócio com a Espanha por ter finalizado um email com a expressão “no aguardo”, que teve tradução de “não espero” e portanto de finalização da negociação. O jornal The New York Times falou sobre treinamentos interculturais em pleno andamento naquele país para exatamente atenuar as divergências nos negócios internacionais. Relata, por exemplo, que “numa tarde recente, empregados americanos da fábrica de equipamentos médicos Hollister se prepararam para uma viagem ao Japão. Ao longo de cinco horas, um instrutor de uma consultoria falou de etiqueta à mesa, hábitos na hora de negociar e socializar, e a importância  de desenvolver uma ‘mentalidade global’ na hora de trabalhar com colegas no exterior” (MOHM, 2010).

Com o número crescente de empresas brasileiras em atuação global, a necessidade de conhecer as especificidades da comunicação no exterior é um desafio que estará cada vez mais presente na vida dos profissionais. Se for pensado um país como o Brasil, com dimensões continentais e uma variedade consequente de estilos de viver e entender o mundo, pode-se afirmar que a Comunicação Organizacional Intercultural é uma realidade imediata para todos na área, para antes de quaisquer estratégias de internacionalização. O sucesso da comunicação e a conquista da legitimidade passa pelo acesso à rede de significados das sociedades. Como bem assinala Rufino (2010, p.126), “o profissional de comunicação tem que ser hoje um profundo conhecedor da identidade da organização, conhecer seus valores mais íntimos, não apenas aqueles expostos no quadro da missão e visão; precisa saber interpretar as sutilezas da cultura interna e acessar o discurso “não-dito”, as ações implícitas”. É deste comunicador intelectual que as organizações contemporâneas (ou pós-modernas) precisam tanto.


Referências

HOFSTEDE, Geert. Culturas e organizações: compreender a nossa programação mental. Lisboa: Sílaba, 1997.

MEIRELLES, Gilda Fleury; BARROS, Maria Eliza de Araújo. O negócio é o seguinte: hábitos e costumes dos povos e sua influência na vida empresarial. São Paulo: Ibradep, 2005.

MOHM, Tanya. Cresce importância de lições interculturais. Folha de S.Paulo, 14 jun. 2010, Caderno New York Times, p.2.

POUCA informação sobre cultura estrangeira pode acabar em gafe. Folha de S.Paulo, 9 mai. 2010, Negócios, p.3.

RUFINO, Carina Ferreira Gomes. Cruzando fronteiras: desafios de comunicação para organizações brasileiras com atuação internacional. 2010. 138 f. Dissertação (Mestrado em Comunicação Social) – Universidade Metodista de São Paulo, São Bernardo do Campo.

SCHULER, Maria. Comunicação organizacional intercultural: aspectos culturais influenciando a comunicação entre organizações de diferentes países. Porto Alegre, 1995. Mimeografado.

SCHULER, Maria. A cultura organizacional como manifestação da multidimensionalidade humana. In: KUNSCH, Margarida Maria Krohling (Org.). Comunicação organizacional. Vol.2. Linguagem, gestão e perspectivas. São Paulo: Saraiva, 2009. p.243-274.


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