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COLUNAS


Rodrigo Cogo
rodrigo@aberje.com.br

@rprodrigo

Relações Públicas pelo Curso de Comunicação Social da Universidade Federal de Santa Maria , é especialista em Gestão Estratégica em Comunicação Organizacional e RP e Mestre em Ciências da Comunicação pela Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo. Trabalhou por 10 anos com planejamento e marketing cultural para clientes como AES, Bradesco, Telefonica e BrasilTelecom. Tem experiência em diagnósticos de comunicação, para empresas como Goodyear, HP, Mapfre, Embraer, Rhodia e Schincariol. Atualmente, é responsável pela área de Inteligência de Mercado da Aberje, entidade onde ainda atua como professor no MBA em Gestão da Comunicação Empresarial.

Memória através de storytelling: estudando o mundo da dramaturgia organizacional

              Publicado em 16/07/2010

O conceito de comunicação traz a ideia de tornar comum, partilhar, comungar. Isso não significa, todavia, que as percepções dos envolvidos tenham que ser as mesmas ou haver concordância com o que fora enunciado. Mais ainda, não significa que as partes em contato de fato estejam intercambiando informação transformada em conhecimento, com qualquer nível de atenção ou retenção. É importante, para a comunicação das organizações, encontrar uma sintonia com indivíduos e grupos de interação e a intenção aqui é postular que o resgate histórico através da contação de histórias ou storytelling conforma-se num formato atrativo e de repercussão, dando visibilidade à mensagem oficial mesmo em tempos de diversidade de fontes emissoras.

A investigação e a implementação de fluxos e conteúdos comunicacionais relevantes continuam sendo papéis da Comunicação Organizacional e das Relações Públicas como intermediação de interesses com stakeholders numa visão estratégica da área, ainda que considerando o multiprotagonismo. A intenção é aproximar o mundo rígido das organizações à dimensão do simbólico, notadamente por meio de projetos de resgate da memória. Com análise da emergência da contação de histórias vê-se que não é a objetividade total que garante legitimidade à abordagem, quanto menos a atenção da audiência. O grande desafio, pois, é saber utilizá-la não como acúmulo convencional de fatos, mas como encantamento do espírito e enriquecimento da experiência, contribuindo para a própria perpetuação do empreendimento.

A vivência e as percepções dos indivíduos no cenário organizacional precisam ser compreendidas a partir de processos de gestão e comunicação onde a produtividade não seja um aprisionamento. Afinal, a emoção, o sentimento de pertencimento e o encantamento fogem aos enquadramentos das planilhas e formulários e são sensações facilmente despertadas por projetos de memória de cunho participativo e dialógico, como aqueles desenvolvidos sobre a perspectiva do storytelling. Freitas (1999, p.55) afirma que “as organizações modernas são produto da história e do tempo das sociedades onde se inserem, bem como da evolução dessas sociedades. Se hoje elas têm papel cada vez mais importante no cenário social é porque o próprio social lhes abre espaço”. Mas, ao mesmo tempo em que as organizações pareciam tornar-se uma instituição central da sociedade contemporânea, novas formas de socialidade são desenvolvidas, com forte acento a partir da internet.

O grande desafio das corporações é exatamente encontrar o formato ideal de expressão para então garantir atenção e legitimidade e, neste ponto, surge a contação de histórias como recurso de registro e utilização da memória e no resgate de valores e princípios com uma dinâmica interativa própria e envolvente. O setor de comunicação tem papel estratégico para estabelecer novos desenhos nesta interação, a partir da memória. Afinal, como sentencia Nassar (2006a), “no contexto atual para as empresas e instituições, [...] a memória é reputação”. Analisa ele que a força da experiência passada está presente construindo ou demolindo empresas e carreiras, e a memória registrada em documentos, na cabeça das pessoas e aquelas lembranças contadas por interagentes é o que consolida a reputação. Neste ínterim, é fundamental equilibrar os aspectos econômicos, sociais e psicológicos de suas atividades produtivas e a força da história e da memória como elementos da definição da identidade, imagem e reputação.

Um dos maiores desafios que se colocam é o resgate e conservação da memória como conjunto de sensações, lembranças e experiências guardado pelas pessoas. Afinal, uma dada história é uma narrativa individual, social ou organizacional estruturada a partir de memórias, que por si só são seletivas dentre experiências boas e más desenvolvidas – uma “memória relacional” (NASSAR, 2008, p.111-112). Num mundo em transformação, mudanças corporativas constantes levam os públicos a precisar de uma base de orientação, exatamente por meio da memória. Como manifesta Nassar (2006b, online), porque “armazenar informação é uma forma de manter a sabedoria [...] e fortalece o sentimento de pertencer”. As organizações criam as suas histórias e referências, o que faz emergir um novo trunfo competitivo contemporâneo: a capacidade de construir, manter e alavancar relacionamentos por meio da memória. Avulta a importância de políticas de relações públicas lastreadas na memória na busca por engajamento, através de uma comunicação integral pautada por alguns preceitos de universalidade e troca dialógica, na consciência de que “a história empresarial é a história de suas relações públicas” (NASSAR, 2008, p.111-112).

Zanetti (2004, p.11) lembra que “a magia do ato de se contar uma história não se resume à história contada, mas ao próprio ato”, reiterando que histórias transmitem segurança e conforto e trazem significados para a vida. As narrativas são eficientes meios de interação, pois comunicam, fornecem e transmitem informações. Esse ato está encontrando uma nova forma e novos objetivos na mídia tecnologizada. Não interessa mais as qualidades do produto em si, como argumento para a venda, interessa criar uma narrativa em que a trajetória da organização seja inspiradora e crie conexões que podem desencadear relações, e por conseguinte amparar negócios. Contar histórias através de várias mídias é algo básico, essencial, simples e poderoso. Falando sobre estudos de Robert McKee, Douek diz que storytelling é sobre arquétipos e não estereótipos: “enquanto as histórias estereotipadas ficam em casa e seus conflitos terminam em si mesmos, as histórias arquetípicas viajam os quatro cantos do mundo em diversas dimensões, fazendo o espectador viver uma realidade ficcional que ilustra o seu próprio dia-a-dia” (DOUEK, 2009, p.39).

O storytelling, nas esteiras de pensamento de Mota (2007), é um formato cross-mídia e de marketing desenvolvido pelas organizações, notadamente de mídia em seus núcleos de dramaturgia. É um processo que resulta de uma prática que recupera o passado como alvo de inspiração e de recriação argumentativa, na proposta de estabelecer um trampolim para manter diálogos produtivos com diversos públicos no presente e até obter vantagens sobre concorrentes no futuro. Narrar histórias tornou-se um meio eficaz da comunicação institucional que utiliza a retórica persuasiva como forma de promover uma simbiose empática entre diferentes interlocutores. Como destaca Poupinha (2007), nessas histórias que circulam, nas narrativas que se vão produzindo e reproduzindo consoante as lógicas próprias às relações sociais e às capacidades dos indivíduos em estruturar suas versões, os acontecimentos são narrados e os indivíduos são representados, assumindo o valor de personagens numa ação que se vai perpetuando no interior da organização. Para ele, a contação de histórias permite a estruturação das representações dos assuntos organizacionais em três níveis: a) uma zona de histórias estabelecidas, visíveis nos históricos da organização; b) uma zona de histórias em movimento, visíveis nos projetos e respectiva ação de comunicação da organização no momento presente; e c) uma zona de histórias potenciais, relativas a assuntos que façam parte da estratégia da organização e que impliquem tratamento futuro e ainda a assuntos que possam fazer parte ou que já tenham existido na trajetória narrada da organização, mas que em algumas das suas dimensões não façam parte do domínio público, tendo circulado em espaços privados de relação e conhecimento. Essa narratividade implica uma dramaturgia organizacional, no sentido em que compõe, através da memória, o quadro de auto-apresentação da organização para conformação da reputação.

Em minha visão, ao se falar em storytelling está se trazendo à tona lógica de estruturação de pensamento e formato de organização e difusão de narrativa, por suportes impresso, audiovisual ou presencial, baseados nas experiências de vida próprias ou absorvidas de um interagente, derivando relatos envolventes e memoráveis.

É preciso reconhecer, todavia, que a investigação sobre histórias em organizações, desdobrada em narrativas, histórias, relatos, contos, mitos, fantasias e sagas, é um tema ainda novo. As histórias que as pessoas contam sobre as relações sociais nas organizações precisam ser tratadas como narrativas que buscam construir sentido para as ações, tanto passadas como futuras, procurando plausibilidade para as experiências. Essa plausibilidade se refere a uma tentativa de transformar o inesperado em esperado, a busca da criação de uma trama, de uma seqüência socialmente aceitável das experiências vivenciadas na direção da produção de sentido das ações.

Trata-se de uma proposição de complexidade que parece passar despercebida num cotidiano profissional de comunicadores organizacionais e relações públicas ainda absortos no atendimento pontual e sequencial de demandas de setores, o que dificulta a reflexão sobre a extensão dos atos retóricos em ambiente de trabalho e/ou em nome de empreendimentos e negociações multipúblicos. Com pessoas alterando de maneira significativa o foco de suas atribuições de confiabilidade, suprimindo ou atenuando a pretensa influência das grandes corporações, dos governos, das igrejas ou da mídia broadcast, cria-se uma outra ordem de parâmetros para conformar a reputação. Entre os desafios da comunicação nas e das organizações, cresce a importância da conquista da atenção dos interlocutores, para só então buscar a transformação da informação em conhecimento, a mobilização para agir ou mudar e ainda a recomendação, ou mesmo defesa, do negócio, seus produtos, serviços e pontos-de-vista.

* Este embasamento teórico faz parte do início de meus estudos de Mestrado em Ciências da Comunicação na Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo (ECA-USP), sob orientação do Prof.Dr. Paulo Nassar. A pesquisa está sendo realizada com bolsa do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico/CNPq. Acesse meu currículo Lattes pelo link - http://lattes.cnpq.br/3931788547598397 .
 

 

 

REFERÊNCIAS


DOUEK, Marcelo. Planejamento de marca e roteiros de cinema. Meio&Mensagem. São Paulo, n.1367, p.39, 13 jul 2009.

FREITAS, Maria Éster de. Cultura Organizacional: Identidade, Sedução e Carisma?. Rio de Janeiro: FGV, 1999.

MOTA, Maurício. Transmedia Storytelling. 2007. [online] Disponível na Internet via WWW. URL: http://www.coxacreme.com.br/2007/12/04/transmedia-storytelling. Acesso em: 13 jul 2010.

NASSAR, Paulo. Reputação é memória. 2006a. [online] Disponível na Internet via WWW. URL: http://terramagazine.terra.com.br/interna/0,,OI1243291-EI6786,00.html. Acesso em: 22 jun 2010.

NASSAR, Paulo. A história da Volks está sendo esquecida. 2006b. [online] Disponível na Internet via WWW. URL: http://terramagazine.terra.com.br/interna/0,,OI1119479-EI6786,00.html. Acesso em: 22 jun 2010.

NASSAR, Paulo. Relações Públicas na construção da responsabilidade histórica e no resgate da memória institucional das organizações. 2.ed. São Caetano do Sul: Difusão Editora, 2008.

POUPINHA, Luís Miguel. Comunicação Estratégica: Aplicação das Ideias de Dramaturgia, Tempo e Narrativas. In: FIDALGO, António; SERRA, Paulo (Orgs.). Actas volume IV - Campos da Comunicação. 2007, p.699-703.

ZANETTI, Eloi. Pai me conta uma história. Gazeta do Povo, Curitiba, 09 ago. 2004, Opinião, p.11.


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