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Mônica Alvarenga
monica@monicaalvarenga.com

Coach e consultora em Comunicação e Relacionamentos Organizacionais, graduou-se em Comunicação Social pela UFRJ, Letras (FEUC), especializando-se em Marketing (FGV), Comunicação Corporativa (Syracuse University, NY) e Mídias na Educação (UFRRJ). É diretora da Múltipla Comunicação. Escreve para portais e blogs sobre relacionamento e comunicação. 

www.monicaalvarenga.com

Sabemos conversar? Aprendendo com as rodas de conversa

              Publicado em 28/04/2010

Nunca vivi entre povos indígenas, mas tenho amigos que não só viveram entre eles, como também pautam seu dia-a-dia, seja na cidade ou no campo, de acordo com os ensinamentos que aprenderam. Não que isso os torne diferentes, mas ampliaram neles a noção de respeito ao próximo e ao planeta, que chamam a todo instante de Mãe Terra, com reverência. Mas o que mais admiro e observo nesses meus amigos é a capacidade de conversar, o que inclui o ouvir e o falar com um ou mais interlocutores com o mesmo respeito que têm pelos demais elementos da natureza.

Às vezes, impaciento-me. Tenho pressa e muitas coisas pra fazer. Quero logo o sim ou o não para resolver determinado assunto. Eles não. Aprenderam com os índios que nem sempre sim e não dão conta das questões e que é preciso um certo tempo para se aperceber do outro e ser percebido por ele. Então escutam e, outras vezes, falam, com paciência, como se estivessem cumprindo um ritual.

Quando algo os incomoda, sentam-se para conversar. Quase sempre em círculos, da maneira que aprenderam com os irmãos indígenas, e falam. Cada um na sua vez. O que emerge dessas conversas, muitas vezes, afasta-se do cerne da questão que os levou àquela conversa, mas eles ficam satisfeitos porque, segundo eles, o “novo” assunto é bem mais importante que todos os outros, caso contrário não teria surgido. Também já vi conversas terminarem aparentemente sem desfecho ou decisão. Questiono a falta de foco e eles me respondem que a resolução imediata de algo não é o mais importante, mas a conversa aberta, sim. Os assuntos conversados, a partir da necessidade de cada um, já existiam há muito tempo em todos os envolvidos que, a partir de então, começarão a se preparar para a decisão. Eu sou a única que fico angustiada nesse processo. Eles ficam tranquilos, certos de que estão seguindo o fluxo da vida e sendo verdadeiros com eles mesmos e com seus pares.

E, pelo visto, estão certos. Não estivessem, cientistas de diferentes áreas não buscariam, no conhecimento de nossos ancestrais e dos povos chamados erroneamente de primitivos, os fundamentos para reestruturação das relações, que, assim como o Planeta, se deterioram. Li num livro de tradições indígenas que a Mãe Terra pode curar-se sozinha e que o homem deve curar-se a si mesmo para redescobrir o seu papel no Mundo. Acho que esse pensamento faz sentido, até porque cientistas já comprovaram a capacidade de regeneração e auto-regulação do Planeta. Falta, então, fazermos a nossa parte.

Estou convencida de que precisamos reaprender a conversar o que só se dá por meio da prática. E  aqui não me refiro apenas ao ambiente empresarial, mas também às conversas nos ambientes mais íntimos, ou seja, com amigos e familiares. É fácil comprovar que a maioria de nós não está preparada para essas conversas. Proponho, por isso, um teste. Sente-se com duas ou três pessoas de quem gosta, amigos ou familiares, sem o chopp e os petiscos que fazem todo mundo perder o foco, e experimente conversar. Olhe nos olhos das pessoas, fale do que sentir vontade, sem nenhuma pauta pré-estabelecida. Fale e ouça com respeito. O que acontece? Nas minhas experiências, vejo falta de paciência, desequilíbrio entre o ouvir e falar, vontade de levantar para atender o celular ou “pegar uma coisinha”, dificuldade de fitar os interlocutores nos olhos, julgamento das ideias alheias, formatação do discurso de forma a expressar aquilo que se acha que deve ser expressado e não necessariamente o que se sente, entre outras distorções. Nada demais. Afinal, somos seres que desaprendemos a conversar.

Em rodas de conversa, para retomar o termo usado por nossos ancestrais, pode-se observar diferentes pontos de vista e aprender a respeitá-los, com a certeza de que todos contêm uma forma particular de ver o mundo e, portanto, um ensinamento. Mas é preciso despir-se de toda e qualquer arrogância, porque, se nos colocamos na posição de grande líder, que tudo sabe e vê, não conseguiremos escutar, de fato, o que é dito. Mantemos nossas convicções e respostas, enquanto   aguardamos a vez de apresentá-las. Com esse pensamento, perde-se duas oportunidades importantes das rodas de conversa: a possibilidade de olhar uma mesma situação sob novos ângulos, o que propicia maior criatividade na resolução de conflitos e problemas; e a chance de melhorar a capacidade de relacionar-se, o que repercute na vida como um todo.

No entanto, se o nosso papel é curar-nos a nós mesmos, esse re-aprendizado pode ser um caminho. Requer paciência e, acima de tudo, o exercício contínuo e incansável do conversar.


Leituras recomendadas:

SAMS, Jamie; WERNEKE, Angela C.; CARSON, David. Medicine Cards. St. Martin´s Press, 2006.

BOHM, David. Diálogo – Comunicação e Redes de Convivência. São Paulo: Editora Palas Athena, 2005.

CAPRA, Fritjof. A Teia da Vida. uma nova compreensão científica dos sistemas vivos. São Paulo: Editora Cultrix, 1997.


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