Relações de Confiança na base das Relações Públicas
As transformações, nos cenários econômico e empresarial, estão ocorrendo cada vez mais rápidas e com impacto significativo em toda a sociedade. A competitividade das empresas sofre uma influência considerável dessas mudanças, entre outros fatores, pela própria variedade de grupos de inter-relação e pela agilidade de circulação de informações em sociedades integradas globalmente. Neste panorama, surgem alternativas para a governança das organizações, onde a gestão pela confiança é um dos mecanismos estudados.
A complexidade e as incertezas de cenário levam as organizações a buscar formatos de gerenciamento baseados num intenso diálogo e no engajamento de seus públicos de interesse, onde a construção de redes de relacionamento parte de relações humanas mais abertas e cooperativas, a partir de um planejamento que posiciona a comunicação em patamar estratégico. É uma realidade facilitada pela emergência de tecnologias da informação por meios informatizados, em especial a internet, dado seu potencial de agrupar pessoas por afinidades e dar um lastro para expressão de múltiplas vozes.
Zanini acredita que um modelo empresarial baseado na confiança é uma tentativa de prestar resposta aos desafios enfrentados pelas empresas frente às necessidades de mudança e flexibilidade organizacional em razão da alta competitividade e do desenvolvimento tecnológico acelerado. Para o professor, “a presença da confiança reduz as incertezas no presente, com base nas informações de interações passadas, sinalizando como os parceiros reagirão no futuro”. Daí que o tema requer investigação por funcionar como importante mecanismo para a redução de riscos e para a minimização de conflitos. Um dos maiores estudiosos na área, o consultor empresarial espanhol José Maria Gasalla, reitera que podemos considerá-la (a confiança) um precioso bem da empresa, um ativo potencial intangível que integra seu capital social, e também um diferencial competitivo de primeira grandeza, na medida em que proporciona aprendizagem contínua, inovação e diminuição de custos com supervisão e controles.
É interessante assinalar, até para comprovar a necessidade de coordenação do tema por profissionais de RP, que a confiança pode interferir positivamente em qualquer tipo de contrato de negócios, por ser um indicador que acaba transferido de um relacionamento para outro, de um público para outro. Como as ações dos empreendimentos e dos empreendedores estão repletas de incertezas, por uma série de questões intervenientes nem sempre no domínio direto dos gestores – como no caso das regulações impostas pelos Governos e mesmo na alteração de conduta dos cidadãos – a confiança ajuda a pensar em ganhos e benefícios a longo prazo e a manter contratos por causa das relações estabelecidas e não só por amparos legais e formais.
Ghoshal e Tanure manifestam que há dois modos muito distintos de a empresa abordar seus relacionamentos e cada um corresponde a uma filosofia muito diferente de gestão. O primeiro tipo de relacionamento é baseado no poder, passa pelo uso do poder de compra e pela capacidade de barganha. O outro tipo passa pela criação de relacionamentos em que se compartilha o destino. E então acrescentam: “esses relacionamentos são construídos com base na confiança mútua e num comprometimento com a interdependência das duas partes, exigindo capacidade de aprender e de resolver problemas juntos”. Daí decorre a convicção de que um novo trunfo competitivo contemporâneo é a capacidade de construir, manter e alavancar relacionamentos, onde a comunicação tem papel fundamental. Os autores sentenciam que “neste novo milênio, as empresas serão julgadas pelas habilidades de potencializar suas relações com os diversos stakeholders”. Neste sentido, avulta a importância de políticas de relações públicas nesta interface e nesta busca por engajamento, através de uma comunicação integral pautada por alguns preceitos de universalidade e troca dialógica.
Não é uma comunicação pontual e instrumental, com objetivos de curto prazo desconectados de uma visão global, mas sim uma postura holística que parte do princípio de que é preciso conhecer a empresa por inteiro, seus interesses e suas necessidades e, ao mesmo tempo, antever e identificar as mudanças e a evolução de mercado, utilizando essas informações para conscientizar a própria organização e todos os públicos ligados direta ou indiretamente a ela sobre seus papéis e suas responsabilidades.
A questão é quais estratégias e táticas de relacionamento e comunicação se deve empreender para criar e manter confiança, para mover-se da desconfiança para a confiança e para superar um eventual abuso na confiança para sua recuperação. Fukuyama apresenta extenso estudo sobre o impacto da prevalência da confiança numa sociedade, a partir do potencial de inter-relação das pessoas na construção coletiva de sentidos. Solomon e Flores acrescentam que confiança é uma dinâmica, uma prática social e não um conjunto de crenças, sendo uma questão de relacionamentos recíprocos. Reiteram que “confiança é questão de tecer e manter compromissos, e o problema da confiança não é a perda da confiança, mas sim o fracasso em se cultivar o tecer de compromissos” . Com isto, ressalta-se a relevância do processo ser permeado por intensa e dialógica comunicação para poder incrementar os laços sociais e o sentimento de grupo, contemplando múltiplos interesses das partes envolvidas nas negociações e alcançando seus objetivos específicos e gerais.
Criar e manter um ambiente favorável às relações de confiança é uma opção estratégica de quem busca vantagem competitiva sustentável. Afinal, é a construção de uma competência distinta, baseada na criação de um ativo intangível. A confiança é um componente fundamental na composição da reputação corporativa, e merece atenção especial das políticas de relações públicas. Os níveis de confiança são indicadores da eficiência da cultura organizacional em promover cooperação espontânea por meio da convergência de interesses, seara direta do profissional de RP em sua função estratégica e sistêmica de gerenciar relacionamentos e conflitos.
Relações de confiança são criadas e estimuladas por meio de normas e regras, implícitas (cultivo de hábitos e valores) e explícitas (códigos escritos), onde a geração de conteúdo de maneira participativa e sua difusão é parte inicial do trabalho de RP, chegando ao processo de reciprocidade: ao confiarem mais umas nas outras, as pessoas passam a adotar o mesmo comportamento em uma série de situações e contribuir com seus melhores esforços. A existência de relações de confiança gera alguns elementos, como percepção de integridade e consistência, disposição à comunicação aberta e transparente, compartilhamento de informações, redução de conflitos, abertura para transferência de conhecimento e crença no futuro, apesar da emergência de incertezas. Conquistar a estima, o respeito e a confiança sempre estiverem entre os preceitos básicos de RP, interligando e fazendo perceber um grupo a outro, trabalhando para a construção de um laço afetivo forte entre todos.
Ora, se reputações pessoais são criadas através de interações ao longo da vida, envolvendo investimentos consecutivos de confiança, não é diferente no universo organizacional, onde confiança muitas vezes se traduz ou concretiza pelo senso de justiça e por uma alta capacidade de adaptação a mudanças, influindo, portanto, na sustentabilidade do negócio. Em todo o sistema, é vital a aplicação da perspectiva de RP como promotor do engajamento e da percepção coletiva e colaborativa, voltado à conciliação de interesses tendo como essência o bem comum.
REFERÊNCIAS
GHOSHAL, Sumantra e TANURE, Betânia. Estratégia e gestão empresarial. Rio de Janeiro: Campus, 2004.
FUKUYAMA, Francis. Confiança: as virtudes sociais e a criação da prosperidade. Rio de Janeiro: Rocco, 1996.
SOLOMON, Robert e FLORES, Fernando. Construa confiança. São Paulo: Record, 2002.
ZANINI, Marco Túlio. Confiança: o ativo intangível das empresas. In: DOM. Belo Horizonte: Fundação Dom Cabral, n.2, p.52-59, mar./jun. 2007.
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