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Itaú

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COLUNAS


Mauro Lopes
mauro@mvl.com.br

Um breve perfil... começando ainda bem jovem... com 16 anos ingressei no Movimento Estudantil (segunda metade dos anos 70), no início dos protestos contra a ditadura militar. Logo depois ingressei no Partido Comunista. Em 1978/79 participei da fundação do Centro Acadêmico Wladimir Herzog, na Faculdade de Comunicação Social Casper Líbero, e fui o primeiro presidente da entidade; pouco depois, participei da refundação da União Estadual dos Estudantes (SP), sendo eleito na chapa vitoriosa de sua segunda diretoria e da reorganização da UNE. Depois do tempo no Movimento Estudantil, em 1980 profissionalizei-me no Voz da Unidade, jornal então recém-legalizado, herdeiro do histórico Voz Operária, que teve vida clandestina por décadas. Uma atividade profissional-política intensa, de aprendizado e inserção. Foi fundamental para a etapa de vida que se abriria em 1986, com a entrada na Folha de S.Paulo.

Fundei MVL em maio de 1991. A empresa começou como uma gestora de situações de crise e foi ampliando aos poucos o escopo de sua ação. Gerimos crises de relevância como a do acidente do voo 1907 da GOL, em 2006,considerado case único de gestão de crise no setor aéreo. Ao longo de sua história, a MVL participou da construção de marcas relevantes, como Natura. É pioneira no uso radical das redes sociais para projetos de comunicação pessoa a pessoa em larga escala - como agência de comunicação das campanhas Marina Silva (2010 e 2014), tornou-se referência internacional. No ano de 2014, ano da Copa, realizamos um projeto de comunicação radical e multistakeholder durante a construção e o lançamento do Allianz Parque. Como agência de comunicação da Telefônica, temos realizado um projeto de convergência e busca de novas linguagens no ambiente digital, tanto na empresa como na Fundação Telefônica. 

Buscamos ao longo da história combinar o caminho da objetividade que marca a atividade empresarial com uma trilha de diálogo, subjetividade, identidade e relações de sentido. Na virada de 2014 para 2015 iniciamos uma revolução em nosso modelo de gestão para lançarmo-nos ao desafio de uma organização horizontal, sem chefes, sem hierarquias, sem pirâmides, organizada em círculos concêntricos e que se apresenta como uma comunidade de trabalho assentada em uma proposta de valor, solidariedade e partilha, Há tempos não me vejo mais com um "cargo" na MVL. Sou um agitador de nossa comunidade.

Também, desde a metade de 2014, iniciamos a busca por uma conversa aberta e transparente com todos que aceitam nossos convites constantemente renovados, usando como plataforma a página da MVL no Facebook. Desde 2012 a MVL integra o grupo Grupo Attitude.

Voltei à MVL em junho de 2013, depois de quase dois anos fora, no Mosteiro São Bento de Vinhedo e na Abadia Nossa Senhora da Assunção, em Itatinga.

Empresas modernas num mundo pós-moderno

              Publicado em 24/11/2009

Na coluna anterior, escrevi sobre as palavras-dimensão da modernidade (força, segurança, solidez, conquista e empresa) e sobre a enorme dificuldade de as organizações interagirem com um novo padrão civilizatório, desenhado por outros signos, fragilidade, insegurança, fluidez, instabilidade e indivíduo. Manifestei também minha intenção de partilhar neste espaço uma visão sobre o cotidiano com ar envelhecido que permeia a imensa maioria das organizações. 

 O dia-a-dia nas empresas ainda é marcadamente moderno. Quase todas elas continuam hierárquicas, viciadas em administração, rigidamente masculinas, com a pretensão a caixas-fechadas, condicionadas ao binômio dentro-fora, emitindo sinais a públicos.

Um pouco sobre cada tema e os questionamentos que estes vetores impõem ao futuro das empresas:

Hierarquia – o poder nas empresas constrói-se verticalmente, apesar de algumas tentativas de flexibilização. Nas empresas cujo controle está na mão de alguns poucos, em geral são eles que mandam. Às vezes, se a pessoa na função de presidente é um dos controladores, tem um poder destacado. Se é um profissional, o poder é delegado. Pode-se falar o que quiser, mas o poder é piramidal ainda hoje nas empresas, de cima para baixo, numa descendente vertiginosa. Pensa-se que os presidentes profissionais são todo-poderosos. Pode ser nas empresas de capital pulverizado, onde eles de fato concentram grande fatia de poder (ou concentravam até a atual crise; vamos ver como vai ficar agora). Mas na empresas onde a família, os controladores estão solidamente assentados no conselho, esta é uma falsa imagem, pois a distribuição do poder é sempre fortemente descendente –em cada patamar, a partir do poder central, a perda de autonomia é brutal. Boa parte da atividade desses presidentes é ouvir, negociar, ponderar, se haver com as determinações dos controladores. Este modelo, num mundo mais horizontalizado e organizado em redes, parece ser crescentemente incapaz de lidar com a complexidade e a velocidade dos desafios.

Vício em administração
– a maioria das empresas ainda funciona com gestores-administradores. Profissionais formados na época em que o gestor era um administrador de coisas. Fórmulas, receitas, manuais, organogramas sem fim. Não que manuais não tenham sua relevância. Mas na nova era, quem olhar para as coisas não verá o tempo passar nas janelas dos computadores em rede que ligam sua empresa ao mundo. As empresas precisam mais e mais de líderes inspiradores, que se relacionem com as pessoas, estejam antenados em relação aos movimentos dos que constroem a organização e a sociedade, cuidem das pessoas e dialoguem com elas. Jovens formados pelas escolas de administração e engenharia de perfil tradicional são capazes de lidar com a gestão das coisas com uma competência sem concorrência. Mas as empresas precisam de líderes homens e mulheres maduros e vividos, que tenham capacidade de olhar para as pessoas, escutar o outro, sentir sua dor, partilhar sua alegria, costurar um ambiente capaz de permitir criação de sentido(s) e, com isso, apontar o leme para o futuro. É outro software, para o tempo das percepções instantâneas, da opinião imediata.

Ainda o império do masculino – as empresas, regidas pela lógica da administração das coisas, são igualmente império do masculino ancestral, reafirmado ao longo da modernidade (é bem verdade que o domínio do masculino foi obrigado a conviver, a partir dos anos 70, com os questionamentos iniciados pelas feministas). Mas ainda hoje a relação entre as pessoas nas empresas é marcada pela ótica masculina da objetividade, o que acabou por subordinar, estratificar, coisificar estas relações. O outro é tomado como objeto a ser conquistado, derrotado. O espaço para o feminino, para o olhar subjetivo, que toma o outro como sujeito numa relação dialógica, ainda é inexistente ou sobrevive à margem na maioria das empresas ao redor do mundo. A aragem de flexibilização desta objetividade rígida, que soprou nos anos 80, recuou fortemente com a onda da reengenharia dos anos 90 e com a implacável lógica do mercado de capitais contemporâneo e global, onde vida e morte são decididas a cada trimestre. Aumenta o resultado (resultado entendido como lucratividade esperada pelo mercado)? É bom. Não aumenta? Hum... Reduz? Nem pensar. É claro que as políticas de responsabilidade social e sustentabilidade permitiram nuances nessa fortaleza masculina, mas ainda são apenas nuances.

O masculino é terreno do homem, mas a vida nas empresas fez com que ao longo dos anos muitas mulheres se dobrassem a essa lógica relacional e também a adotassem, na medida em que escalaram na hierarquia. Pode parecer maluquice para quem está fora do ambiente corporativo, pode parecer filme saído do século passado, mas é exatamente assim que as coisas acontecem na empresas. Enquanto isso, no novo mundo, mulheres assumem mais e mais a liderança das casas, sozinhas ou em igualdade com seus parceiros, homens lançam-se mais largamente aos temas da sensibilidade, da presença do feminino em seu ser, pais e mães mais e mais cuidam solidariamente de seus filhos. Num mundo cuja musicalidade é a da percepção e não mais a da administração, a masculinidade absoluta é uma das vertentes de inviabilização das empresas. É preciso uma nova equação (que não se instalará sem contradições e conflitos), que receba a convivência e a troca constante entre o masculino da conquista e da racionalidade e o feminino do acolhimento, da sensibilidade e da intuição.     

Caixas fechadas – ainda há caixas fechadas num mundo em que os hackers invadem qualquer sistema, qualquer banco de dados? Pois a maioria das empresas ainda funciona como se isso fosse possível. Segredo! Confidencial! Cuidado com a concorrência! E com isso se fecham ao mundo, ao mundo das conexões e dos conhecimentos cruzados. Existem algumas iniciativas interessantes de criação de conhecimento compartilhado e em rede como o conceito Open Innovation, inaugurado em 2003, segundo o qual é possível romper com a lógica da caixa fechada e inaugurar uma avenida de conhecimento e inovação de parceria entre empresas e universidades e centros de pesquisa –mas o modelo ainda ensaia seus primeiros passos. No geral, o ambiente é de fechamento, obsessão pela segurança e rigidez. 

O binômio dentro-fora – existe “dentro”? E “fora”? Quando os computadores instalados nas empresas permitem que qualquer um (apesar das tentativas de controle) à mesa do escritório, do laboratório ou dos totens nas fábricas fale com o mundo, as idéias de dentro e fora são fronteiras apenas na cabeça dos gestores. Mais e mais as empresas são invadidas por relações diferentes, híbridas, flexíveis, com aqueles que as fazem. O modelo de contratação tradicional convive com dezenas de outros, como o dos fornecedores que operam em suas pequenas (às vezes nem tão pequenas assim) empresas, com redes próprias de relacionamento e por vezes atuam em áreas sensíveis de suas empresas-clientes.

Os clientes (ou consumidores), até agora gente “de fora”, mais e mais se apropriam das empresas com a quais se relacionam, e de fato interferem na gestão, seja articulando-se com a rede de organizações de controle das empresas (estatais, para-estatais ou sociais, desde Procons até o Ministério Público), seja tornando-se emissor (mídia) sobre os produtos e serviços ou ainda como acionista. Onde está o limite do dentro-fora? Virou fumaça.

Sinais emitidos a públicos
– ao longo do século XX (na primeira metade nos EUA, no fim da segunda metade no Brasil), as empresas apropriaram-se do conceito de públicos. Ele dava conta de uma pergunta fundamental: se os recursos da empresa são finitos, e há um mar de gente aí fora (a massa), com quem e como ela se relaciona? O método usado foi: dividir essa massa em uma classificação a partir de supostos interesses de grupos de pessoas no relacionamento com a empresa. Por exemplo: todo mundo que compra produtos ou serviços entra na caixinha dos clientes (ao longo do tempo se sofisticou essa noção, criando-se categorias dentro desses públicos, como a dos clientes “vip”); quem vive de colocar seu tempo e força de trabalho à disposição da empresa, entra na caixinha público interno (etiquetados como nomeados profissionais, funcionários, empregados ou colaboradores); quem presta serviços para a empresa, caixinha de fornecedor; e assim por diante, sindicatos, administração pública, ONGs ou Terceiro Setor, acionistas etc. Mas e se o Sr. José Pereira, por exemplo, é empregado e ao mesmo tempo tem ações da empresa e participa de uma ONG que debate assuntos relacionados a ela? Em muitos casos, a empresa não sabe que o Sr. Pereira é tão ativo, mas, mesmo que saiba, acaba enfiando o sujeito na caixinha que é supostamente a do interesse mais relevante (no caso do Sr. José Pereira, ele com certeza estará classificado com o “público interno”). E se a Maria acaba de voltar da licença maternidade e seu filho tem uma deficiência grave que implica uma atenção mais dedicada da mãe? Como olhar para sua necessidade encaixada nas políticas de tratamento do “público interno”? E se o Paulo comprou um produto de nossa empresa hipotética, não gostou e postou uma crítica violenta em seu blog?

O modelo dos públicos caminha para rapidamente para o esgotamento. O Sr. José, a Maria e o Paulo poderiam ter há 40, 30 ou 20 anos as mesmas escolhas, relações, percepções sobre nossa empresa. E as empresas não tinham muito a oferecer, a não ser as receitas desenhadas para cada público. Agora, entretanto, com a revolução da tecnologia da informação, a empresa pode conversar com cada um deles, individualmente. Escutar cada um, construir uma solução para cada caso, de comum acordo, num pacto de novo equilíbrio nas relações. O que foi, ao longo do século XX, relação com públicos, mais e mais poderá ser relação com pessoas. Na verdade, esta não é uma escolha. A empresa terá que sustentar uma conversa com cada um, cada uma, pois o eixo do poder da sociedade mudou (da empresa para a pessoa) e, ao mesmo tempo, há ferramentas, canais, meios que tornam possíveis conversas individuais mesmo que seja com milhões de pessoas (simultaneamente!).

A questão do poder do indivíduo sobre as empresas é crucial. Antigamente (até determinado momento no século XX), as empresas eram as grandes formadoras de percepção sobre elas próprias, com uso intensivo da publicidade. Não são mais. São agora apenas uma das agentes na formação dessa percepção (e, em boa parte do tempo, sequer a agente predominante). Apenas uma das agentes, num sistema de construção de percepção multicentrado, de cruzamento e entrecruzamento de opiniões (positivas e negativas) em velocidade vertiginosa, ao redor do planeta, dia e noite.

O novo mundo nos renova a todo instante um belo convite. Sermos, juntos, pensadores-protagonistas na reflexão-ação sobre as organizações, para que acolham o paradoxo e se abram a ser: redes de relacionamento, diálogo e ação; espaço para a expressão do feminino e do masculino; caixas abertas que se permitam momentos de intimidade; sensíveis ao universo que acolhe nosso planeta e ao mesmo tempo habita o coração de cada ser humano.


Os artigos aqui apresentados não necessariamente refletem a opinião da Aberje e seu conteúdo é de exclusiva responsabilidade do autor. 1453

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