Então, como diriam meus amigos paulistanos, o Brasil é mesmo assim. Todo verão, uma nova moda de verão – geralmente polêmica - toma conta da mídia, vira tema de conversa nos bares, nas praias, nas casas, nas praças e nos ônibus e trens lotados. Suspeito, há tempos, que deve ser o jeito que arranjamos para espantar o calor e afugentar a falta de assunto em um País no qual, entre janeiro e a semana santa, tudo para em homenagem à preguiça que o sol nos impõe.
Pode ser uma nova dança – o carimbó, o axé ou a lambada – ou comportamentos e atitudes decorrentes de fatos que chamem a atenção como a barriga grávida de Leila Diniz à mostra nas praias de Ipanema no início dos anos 1970, a tanguinha de crochê do Gabeira no verão da anistia (1979), também em Ipanema. Ou um acontecimento que incrementa o “instinto animal” e a criatividade da galera, como as misteriosas latas empanturradas de canabis sativa que, de repente, tomaram conta das águas e das praias da cidade maravilhosa, no verão de 1987/88. É um tempo em que qualquer “novidade” pode virar matéria de jornal e alimentar debates virulentos, bochichos e mais bochichos.
Em 2014, quando se achava previsível que a Copa do Mundo de Futebol e as eleições presidenciais seriam o “must” da temporada, elas perderam feio para os rolezinhos – um, digamos, movimento criado por jovens da periferia da capital paulista que convocam a galera de sua idade por meio das redes sociais para grandes encontros e passeios de fins de semana nos shopping centers. Segundo eles, o objetivo é “zoar legal”, “dar uns amasso nas minas” ao som bem alto de funks da pesada. Se der tempo, eles podem até curtir as novidades oferecidas pelas lojas de grife.
Não se tem a menor dúvida de que para os frequentadores comuns dos novos templos de consumo das classes médias – agora engordadas pela tal da nova Classe C – deve ser um tanto desagradável depararem-se com uma turba de jovens barulhentos aprontando nos corredores ou nas praças de alimentação daqueles estabelecimentos comerciais. E justamente no fim de semana que escolheram para fazerem suas compras ou para comerem uma pizza e tomarem umas cervejas e refrigerantes com a família. O constrangimento deve ser ainda maior para os donos das lojas, lanchonetes e restaurantes dos shoppings.
Tudo bem, certamente é mesmo um saco perder tempo, paciência e dinheiro por causa de travessuras mal educadas de garotos sem noção de civilidade. Mas daí a chamar a polícia e botar seus seguranças para escorraçar a moçada é, além de pura paranoia, uma total demonstração de falta de preparo dos donos de lojas e dos shoppings para enfrentar os desafios apresentados por uma sociedade em constantes mudanças, como a brasileira. É bem verdade que a paranoia dos comerciantes e cidadãos foi muito alimentada pelo oportunismo da esquerda radical travestida de “movimentos sociais”. Que tentou ganhar o debate sobre o assunto impondo sua interpretação dos rolezinhos como a revolta de jovens da periferia contra o racismo e a discriminação de classe de ricos e remediados contra os pobres e excluídos.
A lenha na fogueira também foi atiçada por integrantes do governo federal - fazendo eco das narrativas dos “movimentos sociais” - de olho nas eleições de outubro, e pelos eternos acadêmicos “progressistas” e analistas da mídia que viram os rolezinhos como sintomas importantes das manifestações populares que tomaram as ruas do País em junho de 2013, insatisfeitas contra os gastos e os atrasos das obras da Copa e para denunciar dos péssimos serviços prestados pelo Estado aos cidadãos em todas as áreas. O assunto rendeu páginas de jornal, espaços infindáveis nas rádios e TVs, encheu o saco nas redes sociais. Só não se viu qualquer tipo de manifestação dos nossos congressistas. Deve ser porque eles têm mais o que fazer nas férias do que debater qualquer assunto de interesse do País nessa época do ano: seja travessuras de garotos da periferia em shoppings ou as consequências das intermináveis tragédias que as enchentes provocam nas periferias das cidades brasileiras.
Vai daí que a Folha de S. Paulo decidiu encomendar uma pesquisa de opinião para ouvir o povo sobre a polêmica. Para variar, o povo foi sábio. Tratou a traquinagem dos garotos rolezeiros como tal, desaprovando-a com sonoros 75% de “votos” contra, opinou que a polícia deve atuar somente nos casos em que a galera sair dos trilhos e descambar para a violência, e condenou a paranoia dos donos dos shoppings. Mas, o que todo esse rebu causado pelos rolezinhos tem a ver com a comunicação empresarial?
A meu ver, tudo. Tivessem os empresários dos shoppings o conhecimento mínimo da importância cada vez maior da comunicação social como instrumento de gestão na sociedade da informação, globalizada e cambiante em que vivemos, certamente não cometeriam os erros que cometeram diante da novidade. Erros que lhes causaram prejuízos imediatos em razão das perdas de vendas que os rolés, ou a ameaça deles, causaram às lojas ou, o que é pior, com o desgaste de imagem que o debate em torno do assunto impingiu à ideia de shopping center como templo de consumo no qual o cliente pode desfrutar das novidades da moda com conforto e segurança. Sabem por quê? Porque baseiam sua comunicação apenas na propaganda e na publicidade, esquecendo-se de se relacionar de forma consistente com os públicos internos e externos, imprensa, os clientes e com as comunidades nas quais estão inseridos.
Por comunicação consistente entende-se, no mínimo, a existência de programas de relações públicas, assessoria de imprensa e de responsabilidade social voltados para os públicos citados, além, é claro, de projetos de prevenção de crise bem elaborados. Pois, como há muito tempo já dizia Abelardo Barbosa, Chacrinha, o velho guerreiro, “quem não comunica, se trumbica”. Mas isso foi há muito tempo. Quem sabe no próximo verão a turma aprenda.