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Francisco Viana
viana@hermescomunicacao.com.br

Jornalista, Doutor em Filosofia Política (PUC-SP) e consultor de empresas.

 

A estratégia das realizações (*)

              Publicado em 07/08/2015

(*) coluna publicada no Correio Braziliense em 07/08/2015

Ernst Bloch, filósofo alemão da mesma estatura que Hegel e Marx, apenas quase um desconhecido no Brasil, escreveu que a comunicação deve servir à filosofia da verdade e, portanto, não pode se limitar a um simples discursar ou um mero anunciar. Tais ensinamentos estão no seu último livro, Experimentum Mundi, editado há quarenta anos, mas ainda não traduzido por esses lados de cá. A lembrança surge ao saber que a presidente Dilma Rousseff pretende fazer pronunciamentos nas televisões e na mídia, de um modo geral, falando do seu governo.

A ideia é das melhores e vai contribuir para aproximar o governo, que desaba nas pesquisas de opinião, da sociedade cada vez mais insatisfeita. Mas há um ponto central que não deve ser negligenciado: a presidente precisa apresentar fatos. Fatos concretos, como, por exemplo, redução do número de ministérios, redução de juros, medidas para reativar a economia, enfim, por em prática palavras e ações, exatamente a interdependência prática a que se refere a filosofia blochiana da linguagem e do conhecimento.

Soou o momento da presidente e seu governo, que há muito não é mais hegemonicamente do PT, acordar para a realidade. Comunicação não é panaceia, mas pode ajudar o governo a sair da crise. A estratégia chave é resgatar a confiança. Como? O ponto de partida encontra-se nas pequenas coisas que foram se adensando e se transformaram em grandes coisas. A corrupção é um caso emblemático. Então, é indispensável apresentar o está sendo realizado nesse campo, mas com foco no presente, não com hipotéticos recuos ao passado. Sobretudo, dizer onde erramos e o que vem sendo feito para superar os erros. Doa em quem doer, torna-se inescapável olhar no olho da realidade. Não há vias alternativas.

Há, igualmente, a questão da vida propriamente dita. A vida no Brasil se tornou extremamente difícil, inóspita. Vive-se sitiado por todos os lados. Nada funciona: hospitais, escolas, universidades, segurança – há uma guerra civil não declarada –, burocracia, transporte, políticas públicas, impostos, enfim, torna-se indispensável que a presidente no seu périplo revele atitudes concretas para enfrentar o gigantismo da crise. Pois a liberdade, hoje, não envolve apenas o poder se expressar sem a perseguição policial. Envolve, além dos caminhos da inclusão social, atitudes concretas. Não é uma linha reta, evidente, mas exige que os impasses sejam desmontados e que o cotidiano seja feliz. Daí a exigência de encarar a realidade e não pender para a divisão do País em classes antagônicas. O governo precisa pensar, de fato, num País de todos e para todos. Um paí democrático.

Por outro lado, é essencial que a presidente avalie as reações da mídia. Há uma escalada conservadora nas redações. Como desdobramento, tende-se a rechaçar o pensamento de esquerda, salvo quando critica a própria esquerda – o caso da senadora Marta Suplicy que se eclipsou depois de sair e alvejar o PT torna-se emblemático –, não como partícipe do debate político. Antes, inclusive nos tempos do regime militar, dada diversidade de formas de ver o mundo, havia uma relação dialética na divulgação dos acontecimentos, favorecendo a natureza progressista das interpretações.

Daí o método de estudar os temas e analisá-los nas suas contradições serem vistos como secundários. Nesse contexto, pode-se assegurar que tudo o que a presidente Dilma disser vai ser visto com a lupa da discordância. A alternativa é estar solidamente resguardada em fatos concretos, pois fatos são teimosos e resistem às manipulações.

Visto na perspectiva crítica, é indispensável que a presidente vire as costas à retórica e se volte para os horizontes da concretude. A sociedade brasileira, ao que tudo indica, não é conservadora. Tem um passado escravista e pouco ativo, é verdade. Enquanto a sociedade europeia, em cinco séculos, experimentou das revoluções às diferentes utopias – da extrema direita à esquerda –, no Brasil permanecemos prisioneiros da democracia sem povo. Hoje, este faz as suas incursões no terreno incógnito da participação. Isso exige realismo dos governantes. Exige a criação de uma utopia democrática que jamais conhecemos e que não mais parece comportar exercícios de mensagens que não se identifiquem com os fatos. Caso contrário, é preferível permanecer em silêncio.


Os artigos aqui apresentados não necessariamente refletem a opinião da Aberje e seu conteúdo é de exclusiva responsabilidade do autor. 1994

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