O voo estava relativamente cheio e não havia nenhum passageiro sentado nos assentos das duas fileiras junto à saída de emergência. Assim que o embarque foi encerrado, decidi ocupar um desses assentos. Em segundos, fui convidado pela comissária de bordo a me retirar. A justificativa era que as duas fileiras, que ofereciam mais espaço para as pernas, eram reservadas a quem pagasse uma tarifa maior para ocupá-las. Aleguei que, naquele voo, não havia ninguém nessa condição e que, até por uma questão de segurança, seria útil que outros passageiros ocupassem os assentos nessas fileiras. A comissária pediu desculpas, mas disse que eu realmente não poderia sentar-me ali. Com o rabo entre as pernas, voltei ao meu lugar.
Procurei a companhia aérea para entender melhor as razões pelas quais, uma vez que os assentos nomeados como "conforto" não fossem ocupados, outros passageiros estariam impedidos de o faze-lo. Se eu fosse um investigador de polícia e fizesse uma acareação, não conseguiria identificar um ponto de discordância entre as duas histórias. Meus parabéns à área de treinamento que adestrou à perfeição comissários de bordo e equipe de atendimento. No entanto, se fosse uma gravação, teria o mesmo efeito, pois nas duas situações não se levou em conta a existência do interlocutor, no caso, eu, o cliente. Sem prever a possibilidade do diálogo, em ambos os casos, simplesmente se reproduziu ad-nauseam a justificativa-padrão.
Numa ocasião posterior, decidi pagar pelo tal assento e, mais uma vez, as duas fileiras estavam vazias. Dois passageiros resolveram ocupá-los assim que o embarque foi finalizado. Um deles sentou-se próximo a mim. Déjà vu, lá vem a comissária de bordo e pede ao passageiro para desocupar o lugar. Entro na conversa, dizendo que não me importo em que o homem sente-se ao meu lado. Ela insiste e, constrangido, o mesmo volta ao seu lugar.
Piada pronta
Resolvi procurar nas redes se havia outras pessoas indignadas com a atitude da companhia aérea e encontrei centenas, milhares de reclamações. Um comediante de projeção nacional chegou a processar a empresa. O vídeo contando sua história obteve, até o fechamento deste artigo, mais de 600 mil visualizações. O comediante diz que teria argumentado com a comissária que o assento não era de conforto, mas de segurança. Tanto é que ela não permitiria que um cego o ocupasse, mesmo que tivesse pago por ele. E provocou: "se você vai cobrar mais porque esse assento é mais espaçado, tem que cobrar menos pelo assento lá do fundo, que é mais estreito e nem deita".
Tenho uma tendência a me identificar com as pessoas que trabalham na área de serviços e me peguei pensando no quão desagradável essa situação também deve estar sendo para os comissários de bordo e o pessoal do serviço de atendimento ao cliente, a quem, visivelmente, não foi dada qualquer margem de manobra. Embora não digam, vê-se que "estão apenas cumprindo ordens". E penso também nos profissionais de comunicação, que, nessa situação, parecem tão de mãos atadas quanto os comissários.
A boa notícia é que a principal concorrente da companhia aérea em questão parece, nesse caso específico, ser mais adepta do bom senso. Abordada por mim, revelou em sua página no Facebook que permite a ocupação dos assentos junto à saída de emergência por qualquer um que o deseje, desde que eles já não tenham sido ocupados por quem resolveu pagar, não pela exclusividade, mas pela garantia de os ocupá-los.