É preciso repensar a abordagem geográfica da comunicação
As noções de Comunicação Interna e Externa valem para um tempo de territorialidades reconfiguradas, de fronteiras diluidas, diante de novos modos de pensar/fazer comunicação? Na tese de doutorado que acabo de concluir, entre outras reflexões, me propus a (re)pensar a abordagem geográfica que há muito tempo é utilizada para distinguir dimensões da comunicação organizacional e que, a meu ver, já não dão conta dos sentidos e contornos que assumem na realidade.
A exemplo do que ocorreu com a noção de públicos, repensada no final dos anos 90 e início dos anos 2000, diante da não suficiência do critério geográfico diante da complexidade das relações que se estabelecem entre organizações e seus interlocutores, a Comunicação Organizacional também enfrenta o impasse da perspectiva que a classifica a partir da sua atuação interna ou externa, tampouco suficiente para dar conta das dimensões complexas que envolvem a comunicação no universo organizacional.
De certo modo, é natural que tenhamos herdado a abordagem geográfica, uma vez que a gestão e as teorias organizacionais também se pautavam nessa perspectiva. Os lugares e ambientes na Era Pré-Eletrônica eram definidos por suas fronteiras físicas e experienciais e as situações eram determinadas por onde e quando ocorriam (ou não) e por quem estava (ou não) presente. Foi uma perspectiva adequada se considerarmos seu tempo, um momento histórico-social-cultural analógico, de territórios mais estáticos, de fronteiras espaciais e temporais delimitadas e concretas, em alguns níveis até intransponíveis. Período em que se acreditava ser possível exercer certo controle sobre o que ocorria “dentro” e/ou “fora”, e delimitar com mais clareza os limites do que era considerado “interno” ou “externo”.
Contudo, a perspectiva/abordagem geográfica se esvazia num tempo de ubiquidade e onipresença. Espaços ubíquos, hiperconectados, hiperlugares, os múltiplos espaços que nos rodeiam e onde nos encontramos imersos, desafiam os sentidos de localização, permanência e as noções clássicas do que se compreende por interno e externo, na medida em que, num contexto de fronteiras diluídas, já não é possível ‘encerrar’ nessa aparente dualidade geográfica dimensões como públicos e comunicação. Se a ubiquidade e a onipresença marcam nosso tempo, como garantir que os sentidos de um diálogo permaneçam delimitados a um determinado espaço geográfico, se nem mesmo os sujeitos estão neles restritos?
Nessa perspectiva, a expressão comunicação interna pode ser considerada reducionista. A relação estabelecida entre organizações e sujeitos organizacionais não se restringe ao espaço geográfico edificado das organizações, uma vez que os vínculos são tecidos em/por comunicação entre sujeito e organização a todo momento. Além disso, a organização não se configura apenas pelo resultado do que se vive em seu universo “interno”, tampouco é um sistema articulado de partes isoladas – embora o seja algumas vezes – é um todo, complexo, contido (e em relação) em/com outros conjuntos complexos, como o bairro, a cidade, o país, o continente, o planeta.
Se o espaço, segundo Santos (2006), é resultado do conjunto de formas contendo frações da sociedade em movimento, também o espaço organizacional pode ser compreendido como um produto social que carrega frações do contexto social, econômico, político, cultural, histórico do tempo e do lugar em que se encontra. Ao compreender que não há de um lado a espécie do outro os indivíduos, de um lado as organizações do outro a sociedade, conforme defende Morin (2006, 2008), podemos dizer que não há comunicação ‘interna’ ou público ‘interno’ de um lado, e ‘externa’ do outro. Por essa perspectiva, ‘externo’ já não é o oposto de ‘interno’, uma vez que se autoinfluenciam, interferem-se, autoproduzem-se e autoeco-organizam-se.
A organização, enquanto contexto social compartilhado e realidade coconstruída por/em comunicação, extrapola um lócus específico e a materialidade de seus espaços físicos. Suas paredes já não são capazes de clausurar sentidos e significados, porque eles, em última instância, não estão nos ambientes e espaços organizacionais, eles estão e pertencem a nós, e estão em nós, sujeitos, pessoas. As organizações, assim como os lugares, já não estão mais contidos em sua fisicalidade (SANTAELLA, 2010), mas nas humanidades que as compõem.
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