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Mônica Alvarenga
monica@monicaalvarenga.com

Coach e consultora em Comunicação e Relacionamentos Organizacionais, graduou-se em Comunicação Social pela UFRJ, Letras (FEUC), especializando-se em Marketing (FGV), Comunicação Corporativa (Syracuse University, NY) e Mídias na Educação (UFRRJ). É diretora da Múltipla Comunicação. Escreve para portais e blogs sobre relacionamento e comunicação. 

www.monicaalvarenga.com

Tempo para a comunicação

              Publicado em 10/10/2013

 

“Minha vida é um fracasso”, pensava seu Fusi. “Afinal de contas, quem sou eu? Dono de uma pequena barbearia foi o máximo que consegui. Se ao menos eu pudesse levar uma vida categorizada, eu seria uma pessoa muito diferente.” Seu Fusi não sabia bem em que consistia essa “vida categorizada”: imaginava algo de importante e luxuoso; coisa assim como ele via nas revistas sofisticadas.
 
Aborrecido, continuou suas reflexões: “A questão é que meu trabalho não me deixa tempo para essas coisas. Para viver uma vida categorizada a gente tem que dispor de tempo, precisa de liberdade. Mas eu, vou passar minha vida inteira aprisionado entre o clic-clic das tesouras, as conversinhas e a espuma de sabão.”
 
O trecho foi extraído do livro “Manu, a menina que sabia ouvir”, do francês Michael Ende, presente de Dia das Crianças, quando tinha 11 anos de idade. Desde então, nunca mais esqueci a história da comunidade da qual o barbeiro Fusi faz parte, que se vê invadida por homens de ternos e chapéus coco cinzas. Esses homens conhecem o conceito do tempo e apregoam a necessidade de poupá-lo urgentemente para que a vida seja mais “categorizada”. E é justamente por acreditar nos argumentos e nos benefícios apregoados por eles, que seu Fusi decide poupar tempo, assim como seus vizinhos e amigos.
  
 
Por isso, entre uma barba e um corte de cabelo, elimina as conversas fiadas, de que tanto gostava: uma forma de atender mais clientes e ganhar mais dinheiro, poupando o tempo. A gaiola do passarinho, antes orgulho do barbeiro, é dada para uma vizinha, pois o tempo precioso não pode ser desperdiçado com os cuidados à ave. Ele e toda a comunidade guardam o tempo economizado em contas numeradas no Banco Poupatempo. Sua sorte, no entanto, é que há, nesse lugar, uma menina que sabe ouvir, chamada Manu. E o resto, não conto mais porque não quero estragar a surpresa de quem ainda vai ler este livro!
 
É uma história infanto-juvenil, é verdade, mas se tornou uma lembrança recorrente na minha vida adulta quando o tempo virou dinheiro e o dinheiro sinônimo de sucesso. Quando acho que não tenho tempo para escutar um amigo ou para sentar com calma para almoçar, lembro-me do Banco Poupatempo. Eu encerrei minha conta nele e hoje, sempre que me dou conta de que não precisarei juntar minutos e segundos para resgatar na aposentadoria, “desperdiço” o meu tempo alongando conversas, olhando a natureza, admirando obras de arte, tomando um café com bolo, bebendo vinho com meu pai, fazendo comida pros meus filhos entre mais um monte de atividades “desperdiçadoras de tempo”.
 
Algumas dessas conversas alongadas acontecem com líderes de organizações que visito por conta do trabalho. Ouço, com frequência, queixas acerca da falta de compreensão das informações transmitidas às suas equipes, que, por sua vez, também têm suas queixas. Em outras conversas, são elas quem me contam que, vez por outra, sentem falta de informações e que gostariam de poder falar com seus chefes sobre o trabalho, seja para reclamar, seja para sugerir ou comentar. Durante esse papo, há quem diga que só sabe se está indo bem na função quando recebe a avaliação anual de desempenho, individual ou do setor.
 
Em todos os cantos da maioria das empresas, escuto a célebre frase: “Não tenho tempo.” E é essa tal de falta de tempo que impede o líder de escutar sua equipe e verificar se todas aquelas informações transmitidas acerca da estratégia da empresa foram compreendidas ou, melhor ainda, se fazem sentido para o seu time. Por falta de tempo, há quem deixe até de fazer perguntas: vai que a resposta é demorada demais ou exige a busca de mais informações por parte do líder. Isso, sem falar em todo o risco que se corre ao ouvir. Se alguém ousar falar, pode acabar originando ideias novas, promovendo a revisão de pontos de vista daqueles que o escutam. Assim é que, por falta de minutos e segundos para esse falar e escutar - que também podemos chamar de comunicação -, uma organização pode perder dinheiro e ganhar um monte de colaboradores mais resignados do que entusiasmados.
 
E por acreditar que o Mundo precisa de mais entusiasmo, deixo-me tomar por essa onda que o Dia das Crianças me traz, lembro-me da criança curiosa que ainda há em algum lugar dentro de mim e sigo com mais um trecho de Manu: 
“Há na vida um grande mistério que é tomado como se nada fosse. Todos têm parte nele, porém poucos são os que lhe dedicam um pensamento sequer. A maioria simplesmente o aceita, e nunca se preocupa com isso. Esse mistério é o Tempo.”
 
“Existem calendários e relógios que o medem, mas significam pouco, ou mesmo nada, porque todos nós sabemos que às vezes uma hora parece uma eternidade, ao passo que outras vezes passa como um relâmpago dependendo do que sucede nessa hora. O Tempo é a própria vida; e a vida reside no coração.”
 

E aí? Você tem tempo para a comunicação? 


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