Comunicação como manifestação do cuidado essencial
Poderia ser um evento como todos os outros. Lá estavam os profissionais reunidos para um momento de formação e, enquanto o primeiro palestrante começava sua fala, circulava entre os participantes um material visualmente atrativo, alinhado com a identidade visual do programa e da instituição, contendo o conteúdo que os conferencistas abordariam a seguir.
A iniciativa, extremante simples e rotineira, nos surpreendeu na medida em que despertava olhares surpresos, sorrisos e manifestações espontâneas. Enquanto os profissionais recebiam em mãos o resultado do nosso trabalho, estávamos ali, acompanhando suas reações, e recordei-me de uma questão que busco manter constantemente presente, como princípio fundante da nossa atuação, mas para a qual (sabemos) nem sempre encontramos o espaço e tempo necessários: afinal, qual o sentido de tudo que produzimos?
A reação daquele grupo de pessoas reacendeu o que não pode jamais morrer em nós: o que nos move? Qual o porquê de tudo isso? Das inúmeras ideias, projetos, programas, campanhas, produtos de comunicação e uma série de compromissos que ocupam a maior parte dos nossos dias? O olhar de gratidão daquelas pessoas revelava um sentido que nem sempre é evidente enquanto desenvolvemos nosso trabalho nas organizações em que atuamos como profissionais de comunicação: a expressão concreta do cuidado.
Essa foi a leitura explícita naqueles olhares: “o cuidado da organização comigo, a dedicação e o investimento da empresa ao elaborar algo especialmente para mim”. Em última instância, aquele que poderia ser apenas um produto de comunicação foi muito além por carregar em si uma atitude da organização em relação às suas pessoas. Um ato de cuidado. O quanto lembramos disso enquanto produzimos, produzimos, produzimos?
Aquele momento, aparentemente despretensioso, me fez recordar essa outra leitura sobre a nossa área: a comunicação como um ato de cuidado essencial. Ou seja, o cuidado com os sujeitos como fim de toda a nossa atividade técnica, intelectual, tática, estratégica. Lembrei-me de Leonardo Boff e seu entendimento sobre o cuidado como modo singular do humano, que é fruto da sua natureza e não se esgota em uma atitude, não acaba em si mesmo. O cuidado com o outro revela a sua importância e um sentimento mútuo de pertença. Eu cuido de você porque você é importante para mim.
Ora, não é esse o pano de fundo das discussões contemporâneas sobre comunicação interna, engajamento, gestão de pessoas, responsabilidade social corporativa? O lugar e o valor do colaborador para a organização, assim como da comunidade onde está inserida, do planeta no qual habita? Não é disso que estamos falando quando refletimos sobre organizações humanizadas e humanizadoras? Somos, efetivamente, organizações que sabem cuidar?
Há teóricos da sociologia da comunicação que deixam claro que o horizonte da comunicação é (ou ao menos deveria ser) o Outro. Nunca antes esse paradigma foi tão verdadeiro. O que fazemos nós, comunicadores empresariais, senão permanentemente cuidar das relações das organizações com seus Outros, ou seja, seus públicos de interesse, stakeholders, como queiram chamar? Se perdermos esse compromisso de vista, do cuidado com o Outro, assim como quando negligenciamos os valores, princípios, objetivos que movem a instituição da qual fazemos parte, reduzimos nossos esforços a preceitos técnicos vazios de sentido.
Que tal (re)pensarmos a Comunicação Corporativa, empresarial, organizacional, e as nossas atividades cotidianas como uma experiência essencialmente de cuidado e de aceitação da alteridade? Que esse olhar, entre tantos possíveis, nos provoque a reavaliar o que nos move e o que dá sentido ao tanto que produzimos, produzimos, produzimos…
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