Este foi o segundo ano em que estive à frente do “8 Horas extras por uma boa causa” no Rio. O evento, criado por jovens holandeses em 2004, tem o propósito de reunir profissionais criativos, com conhecimentos de comunicação, que doam uma jornada de oito horas de trabalho para atenderem a deficiências de organizações não-governamentais, nessa área específica. Este ano, aconteceu em 28 de março, simultaneamente em 18 cidades do mundo, espalhadas em três continentes. No Rio, reuniu 26 voluntários e atendeu a quatro ONGs, mas esse alcance não me surpreendeu mais do que a diversidade que tive o privilégio de observar e integrar durante essas oito horas. A começar pelas quatro organizações inscritas.
A ONG Liberte seus Sonhos busca empoderar pessoas e comunidades através de intervenções urbanas; a Oito Vidas defende a vida de animais de rua, especialmente a dos felinos; a Pela Vidda apoia portadores de HIV, seus familiares e amigos; enquanto a Nova Chance atua em diferentes frentes, em comunidades do Rio, para reduzir o impacto causado pelos desníveis sociais. Cada uma dessas organizações apresentou demandas tão distintas quanto suas áreas de atuação, assim como um perfil totalmente diverso de liderança. Compartilhavam, no entanto, da percepção do valor da comunicação para otimizar seu trabalho em prol de um mundo melhor.
O apoio irrestrito das Faculdades Integradas Hélio Alonso (FACHA) assegurou ao grupo a estrutura necessária para realização do evento, a cargo do escritório de Relações Públicas e de sua jovem equipe. A coordenação compartilhada com o professor Márcio Gonçalves (FACHA e Estácio) assegurou o fôlego necessário para divulgação e articulação. E foi assim que recebemos, para compor a equipe de voluntários, estudantes de Comunicação Social, profissionais atuantes no mercado e professores universitários. Na hora da divisão dos grupos, o primeiro impulso foi designar os voluntários para atender às ONGs inscritas de acordo com sua experiência e área de atuação. A intenção era criar uma coordenação informal dentro dos pequenos grupos de trabalho, de acordo com a avaliação da experiência e das habilidades apresentadas por cada um.
Não foi assim que ocorreu. Abrimos o espaço para que todos atuassem como cogestores do evento, e as equipes formaram-se de acordo com a área de interesse de cada um. E foi aí que me preocupei. Os briefings ainda precisavam ser definidos e todas as ONGs inscritas deveriam receber alguma contribuição objetiva até o encerramento. Havia grupos com maior quantidade de jovens, outros com demandas muito complexas para serem atendidas em tão pouco tempo, um outro com mais representantes do que voluntários, e ainda um outro com poucos voluntários. Havia voluntários de passagem, outros presentes em todo o evento, aqueles que organizavam os lanches, os que cansavam e, entre todos, muita vontade de fazer o trabalho dar certo.
Percorrendo todos os grupos, confesso que fiquei curiosa (e temerosa). Perguntei-me se todos teriam oportunidade de contribuir; como os representantes das ONGs – alguns com muitos anos de experiência – receberiam as sugestões do grupo formado por jovens universitários; e se conseguiríamos ultrapassar a definição do briefing e entregar o “produto” de comunicação, atendendo a proposta do “8 i”. Encantada, observei o quanto todos conversavam animadamente. Perguntavam, falavam e escutavam muito, na tentativa de, primeiro, entender realmente a necessidade da ONG que elegeram pra ajudar e de elaborar uma proposta de trabalho possível para as oito horas de evento.
O tempo foi passando; os projetos, delineando-se; e, ao logo da tarde/noite, vi surgir propostas maravilhosas e inovadoras, resultado do entrosamento e da vontade em acolher a experiência e o olhar do outro. Para mim, isto não deveria ser motivo de surpresa, já que a troca de experiências era mesmo o alvo, mas os trabalhos apresentados por cada grupo no encerramento superaram qualquer expectativa que se pudesse ter. Tinham muita qualidade e precisão, especialmente considerando a dificuldade de “brifar” organizações que não estão acostumadas a lidar com jobs de comunicação.
A mistura das gerações presentes deu “liga”, mas isso também não deveria surpreender. Já não é uma tendência nas organizações, a mistura de gerações? O perfil da população brasileira vem mudando com o aumento da expectativa média de vida. Por isso, há empresas que estão apostando no estímulo à formação de equipes intergeracionais; enquanto outras acompanham o movimento à distância, esperando o momento em que encarar o assunto de forma estratégica será inevitável.
Responsável por Diversidade e Qualidade de Vida, na Michelin, Priscilla Zanatelli afirma que “A troca entre os diferentes perfis, com seus distintos modos de agir e de pensar, traz resultados altamente positivos, seja essa diferença de idade, cultura, gênero ou qualquer outra. Quando há interação e respeito entre os diversos perfis, obtém-se o que há de melhor em cada um”. A Michelin é uma das empresas que escolheu tratar o tema intergerações como prioridade, por possuir um grupo de funcionários heterogêneo e por acreditar que este é um ingrediente importante para a boa performance. Dentre cerca de 5 mil funcionários, 8% têm entre 53-70 anos, os chamados babyboomers; 56% pertencem à geração X, com faixa etária entre 33-53 anos; e 36% têm entre 18 e 33, considerados geração Y.
“Enquanto o funcionário mais experiente possui uma visão mais ampla e consegue vislumbrar todos os ângulos de uma determinada situação, permitindo uma decisão mais assertiva; o mais jovem, sempre conectado, tem uma energia incrível para colocar em prática rapidamente o proposto. Não podemos estereotipar, mas globalmente é o que ocorre”, afirma Priscilla. Na empresa, o programa Qualidade de Vida trata de programas como o Home Office, com foco nos mais jovens; e o “Novos Tempos”, voltado para a preparação dos funcionários que estão próximos da aposentadoria, realizado por uma consultoria externa especializada. Há também a proposta do “Exchange Day”, que deverá ser lançado no segundo semestre, onde serão promovidas reuniões dos mais jovens com os mais experientes para incentivar a troca de experiências entre gerações.
A atenção dada ao tema por grandes empresas mostra que o resultado alcançado pelos times de voluntários do “8 Horas extras por uma boa causa” não deveria me surpreender. Mas eu me surpreendi. E muito! Parabéns, equipes diversamente maravilhosas!
Surpresa e gratificação no momento da apresentação dos resultados do 8-i 2014, no Rio.