ONGs: mais um canal de corrupção implantado; vem aí um novo marco regulatório para o Terceiro Setor
Em 1999, no IV Seminário de Propaganda e Marketing, em Manaus, organizado pela Fundação Rede Amazônica, com a palestra “O Marketing Corporativo como Vantagem Competitiva”, apresentei uma definição do jornalista Joelmir Betting sobre o terceiro setor: “Enquanto o primeiro setor se caracteriza pelo uso do bem público para gerar benefícios públicos, o segundo setor se caracteriza pelo uso do bem privado para gerar benefícios privados. O terceiro setor é o uso de bens privados para gerar benefícios públicos”.
A falência do Estado em muitas regiões do mundo impulsionou o setor privado a voltar-se para atividades que ajudassem a sociedade a sanar problemas sociais que, inclusive, afetavam suas operações. Com o primeiro setor omisso, o privado iniciou este processo de desenvolvimento do terceiro setor, apoiando a criação de entidades beneficentes sem fins lucrativos e não governamentais. Os principais objetivos eram gerar serviços complementares de educação e de convivência social e buscar políticas de caráter público para impulsionar com mais agilidade e transparência os desiquilíbrios sociais que o Estado não conseguia resolver. Este e outros objetivos eram muito claros, mas foram desvirtuados. Stephen Kanitz, um estudioso pioneiro do terceiro setor, chamou a atenção para isso quando refletia sobre a definição de Betting: “porque não dizer, haveria também o quarto setor, que seria o uso de bens públicos para gerar benefícios privados - o que explica muitas coisas que temos visto na política ultimamente”.
Invadiram o mercado milhares de fundações, institutos, ONGs e processos de criação de OSCIPs, convênios, incentivos fiscais, parcerias público-privada, “repasses”, tudo com o aval do Estado. As entidades sem fins lucrativos se multiplicaram com base no reconhecimento supralegal, de cunho cultural, político e sociológico que acontecede forma universal. E as ONGs se tornaram a legítima representação da sociedade civil e do desenvolvimento da cidadania. Nós mesmos, profissionais de relações públicas, vimos aí um nicho corporativo para exercer a filantropia por meio de doações de terceiros e alianças de cunho empresarial para organizar projetos sociais sustentáveis que passassem a depender única e exclusivamente do resultado de suas atividades produtivas.
Por isso, esse lado avesso das ONGs tem nos deixado confusos e nos mostrado como tudo pode ser desvirtuado. As questões surgem em CPIs, “frituras” políticas e denúncias contraditórias.Mas há que separar o joio do trigo para manter um terceiro setor saudável,administrando a inclusão social. Os benefícios, resultados das ONGs do bem, têm se mostrado tão eficientes para tratar a exclusão social que não é o momento adequado para rejeitá-las. Uma campanha de relações públicas esclarecedora deve ser desenvolvida, relembrando a opinião pública da importância do terceiro setor, principalmente nas comunidades mais carentes da sociedade.
O próprio governo federal inicia debates para estabelecer um marco regulatório que vai definir regras mais claras para a atuação de ONGs no país. Vai exterminar as brechas legais que as incluíram em mais um canal de corrupção por gestores públicos e seus interesses particulares. Infelizmente e desnecessário é que se faça o caos para surgir a luz, mas muitas vezes este é o caso. Esta desconstrução para construir é mobilizada pela opinião pública, pois nunca antes se debateu tanto esse assunto. A sociedade tem se manifestado a favor de regras mais transparentes, viáveis e independentes da filantropia oficiosa que até ganhou um apelido popular: “pilantropia”.
Vamos ficar atentos a esse novo marco regulatório que vem aí para que a qualidade ética dos gestores se torne fundamental e garanta o sucesso das organizações. E que se expurguem as estratégias mascaradas outransvestidas de lobo na pele de cordeiro para que ressurja a importância e o valor do terceiro setorno combate aos desequilíbrios sociais.
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