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COLUNAS


Francisco Viana
viana@hermescomunicacao.com.br

Jornalista, Doutor em Filosofia Política (PUC-SP) e consultor de empresas.

 

O que não fazer nas crises

              Publicado em 23/12/2009

Há alguns dias recebi convite para gerir uma crise. Envolvia uma personalidade conhecida em São Paulo que por um desses acasos do destino, combinado com a falta de cultura de comunicação, acabou criando um problema colossal. Na prática, perda em massa de clientes, com grave ameaça de falência do negócio.

Logo no início da conversa duas coisas ficaram claras. Uma, a personalidade em questão tinha perdido o total controle da situação e não se dava conta do que estava acontecendo. Há mais de seis meses, não ocupava espaço na mídia e o noticiário negativo – baseado em fatos concretos – só fazia se adensar. Duas, não havia qualquer interesse em enfrentar a situação.

Disse a personalidade: “Não vou dar entrevista, meus advogados me proibiram, sob pena de abandonar a causa. Preciso, sim, de um jornalista amigo que fale bem do meu negócio.” Ele não queria comunicação, mas mágica. Não conheço jornalistas amigos e muito menos acredito nesse tipo de coisas. Crise é crise. Quebra de confiança só é superada com a reconstrução da confiança, o que exige fatos.

No caso em questão, havia uma contradição. Se foi o advogado quem me procurou, porque seria contra entrevistas? E, depois, não havia saída. Nas crises, a opinião pública funciona como um tribunal. O envolvido precisa dar sua posição. Caso contrário é julgado a revelia. Essa a realidade. Não há como escapar.

Dada as explicações, a personalidade revelou-se inconformada. Como, como não ter um jornalista amigo?  Nesse momento, começou o verdadeiro impasse. A personalidade não deixava que eu saísse do escritório. Primeiro, quase que me impôs assistir a um vídeo institucional. Péssimo, crasso mesmo. Uma propaganda forçada, sem qualquer rigor técnico. Depois, insistiu para que eu assistisse uma entrevista que ele tinha dado na TV. Não era sobre o problema em questão, mas uma entrevista genérica feita certamente por um jornalista amigo. Era interminável. Detalhe: tinha sido nove anos antes.

No final, acabei sendo veemente: precisava terminar a reunião e terminei. Tudo isso se arrastou por mais de três longas horas. Poderia ter durado apenas 30 minutos. Estava começando a me sentir em cárcere privado. E por que? O problema do ego, da ilusão, não permitia que o meu interlocutor percebesse que eu nada podia fazer. Jornalista amigo não existe para quem trabalha com crises. Existe apenas o fato, o real e suas conexões. Pessoas poderosas, acostumadas a controlar tudo, quando se vêm diante de uma crise de comunicação se tornam infantis. Pensam que se resolve esse tipo de problemas com amizades, retoques de aparência. Se esquecem-se que o real é teimoso e se impõe.

Claro, não peguei o caso. Resolvi partilhar a experiência com os leitores da coluna pelas lições que contém. Tomei o cuidado de não dar a mínima pista para identificar a personalidade, aliás com uma bela carreira e um problema fácil de resolver. Basta ir a público e dizer o obvio: errei, vou corrigir. Problemas existem para serem resolvidos. Não para serem jogados debaixo do tapete. E egos e vaidades são tratados com psicanalistas. Nas crises, são os piores inimigos das soluções.

A questão em jogo, guardadas as proporções no tempo e na história, faz lembrar os primórdios da comunicação corporativa, quando Ivy Lee foi  convidado pela família Rockfeller para cuidar da péssima imagem dos seus negócios.  Era o ano de 1914. Mais de 50 pessoas tinham morrido por causa de uma revolta de mineiros que trabalhavam para David Rockefeller. O povo gritava nas ruas de Nova York: “morte aos Rockefeller”. Seu filho, Rockefeller Jr. , ao contratar Lee, disse: compre a imprensa. Altivo, Lee respondeu: a imprensa precisa de fatos. E assim fez. Quando morreu, o patriarca dos Rockefeller tinha se tornado um herói americano. Deixara de ser o vilão número 1. *
Moral da história: a boa comunicação sempre dá certo. A comunicação obliqua, que foge da realidade está condenada sempre ao fracasso. Por isso, nas crises é preciso lucidez. Em lugar de ilusões, a ênfase ao real. Esse o sentido da gestão de crise: cuidar do real.  

*Sugestão de leitura: CHERNOW, Ron, Titan –  the livre of John D. Rockefeller,  New York: Random House, 1998.


Os artigos aqui apresentados não necessariamente refletem a opinião da Aberje e seu conteúdo é de exclusiva responsabilidade do autor. 3705

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