Confiança criativa e a ação de fazer (II)
Continuando o assunto do artigo anterior: todos nascemos criativos. Ao longo da vida, porém, a família, a escola e a sociedade acabam tolhendo essa habilidade ao nos censurarem de forma constante, colocando muitos “nãos” em nosso caminho. Muitos adultos tornam-se medrosos, travados e sem confiança na arte de gerar novas ideias. Desacostumados de viver criativamente, delegam aos outros a tarefa do pensar. Uma frase resume esse estado de espírito: “Quer ser criativo? Volte ao jardim de infância!”. Muitos preferem estar em constante movimento a dar-se a esse trabalho, pois o ato de pensar é uma atividade orgânica que consome muita energia. Aquele que tem aspiração à liderança deve reaprender a ser criativo, pois essa é a característica mais exigida a quem exerce cargos de chefia.
Se você conseguiu escapar dessa armadilha e se considera um pensador, deve começar a desenvolver hábitos para se tornar ainda mais criativo. O primeiro deles é não julgar as próprias ideias antes de tirá-las da cabeça. Cada vez que deixamos de expor ao mundo uma ideia por considerá-la ruim, ficaremos menos criativos; desprezado, nosso cérebro não irá mais se dar ao trabalho de gerá-las. Além disso, sua ideia, ao ser apresentada, poderá servir de base para que outras sejam geradas a partir dela – pois uma ideia sempre leva à outra e à outra, ad eternun. Exponha sempre suas ideias, sejam elas boas ou ruins, sem medo da crítica ou do ridículo. Em uma reunião de criação, basta dizer “vamos delirar” e tudo fica resolvido.
Como as ideias não marcam hora nem local para se apresentarem, é importante anotá-las tão logo elas aparecerem. A esses momentos de súbita inspiração chamamos de insights – expressão que traduzida ao pé da letra quer dizer: ver com os olhos da alma. Bonito, não? E quando esse momento não foi trabalhado para acontecer, isto é, sem a fase da incubação, damos a ele o nome de serendipity – o inesperado bom.
O hábito de anotar as ideias é acompanhado sempre por caneta, bloco de anotações ou um gravador de som – serve o do celular. E o melhor local para manter esses equipamentos à mão é na cabeceira da cama: o mundo onírico e a fase do quase acordar são propícios aos trabalhos da imaginação e ótimos em nos ajudar a resolver problemas. Robert Frost, poeta americano, dizia: “curiosa é a mente humana: ela começa a trabalhar quando a gente dorme e para de trabalhar quando a gente acorda”.
Como nada nasce do nada, precisamos encher a nossa mente de perguntas e problemas; depois, abandonar o assunto e deixar que o cérebro trabalhe sozinho. Se você for bem treinado, com certeza as ideias aparecerão e, normalmente, em situações de total desprendimento – tomando banho, fazendo a barba, a maquiagem, lavando louça, cortando grama... Se ficarmos plugados em aparelhos de som ou no Facebook o tempo inteiro, não daremos chance às “fadas da inspiração” de se aproximarem dos nossos ouvidos.
O criativo é sempre curioso, disposto a ver assuntos que não são da sua área. Em sua busca incansável por matérias diferentes do seu contexto, é um mestre em fazer perguntas – sejam elas corretas, impertinentes ou idiotas. Essa disposição, a de estar sempre procurando algo diferente, irá permitir a interligação de diversos fatos quando ele precisar gerar alguma ideia para o seu trabalho. A criatividade nada mais é do que saber ligar uma coisa à outra. Chamamos isso de polinização cruzada, pois é um processo semelhante ao da polinização das plantas: pássaros ou insetos pegam o estame de uma flor e o carregam para outra, numa ação que permite gerar uma nova planta. O assunto criatividade é extenso e vai exigir um novo artigo. Até lá!
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