Comunicador sabe dizer não? O papel moral dos profissionais para os Programas de Ética e Compliance
Desde a aprovação da Lei 12.846, conhecida como "Lei Anticorrupção" em agosto de 2013 e a regulamentação em 18 de março de 2015, os comunicadores têm recebido novas demandas: a divulgação de etapas e códigos de conduta ou ética dos programas de compliance ou ética organizacionais.
Não apenas as organizações que tem negócios com a administração pública estão diretamente influenciados pela lei. O impacto da responsabilidade objetiva, das sanções e critérios da Lei 12.846 tem criado uma agenda de adaptações nas organizações. As motivações vão desde o resguardo legal, adequações a regulações de mercado de capitais, convicção de demanda social e interesse reputacional. Não cabe aqui o julgamento da legitimidade das intenções, mas sim a análise destas intenções pelo profissional de comunicação e a busca da legitimidade do programa, para a efetiva construção moral na cultura.
Na regulamentação 8.420, os programas são chamados de "integridade", e são delineados critérios de avaliação para aplicação de multa e atenuações de pena como: o comprometimento da alta direção, "evidenciados pelo apoio visível e inequívoco ao programa"; padrões, procedimentos e códigos de ética aplicáveis a todos os empregados, públicos que respondem pela organização; treinamentos periódicos; canais de denúncia amplamente divulgados a todos os públicos, entre outros. A regulamentação demanda o trabalho de comunicação em apoio ao programa de integridade, e ele é entendido como "evidência" fundamental de efetividade.
Neste ponto reside a principal e talvez mais complexa discussão do profissional de comunicação ao receber essa demanda: seu papel é de ser um "gerador de evidências", técnico e operador de canais de comunicação, sem peso e atribuição moral de sua atividade; ou estratégico e promotor de diálogos que possam criar o entendimento da moral organizacional?
A discussão envolve dois importantes aspectos: do ponto de vista deontológico (dever ser) a comunicação pode ser um mecanismo de atenuação de pena se ela pode e deve transformar a cultura organizacional para que a empresa seja de fato mais responsável? E do ponto de vista utilitário (finalidade), seria eficaz um programa implementado para criar evidências e mecanismos de sanções internas, em um contexto da sociedade em rede com a força das narrativas interconectadas que expõe as transgressões de qualquer organização? A reflexão racional diz que se o profissional de comunicação tem como objeto de trabalho a reputação e a confiança, seria impossível geri-los em um contexto de maquiagem ética, primeiro porque internamente, o clima imoral dilacera o espírito de justiça e confiança e permite a oportunidade de transgressão. E externamente, não se discute se uma transgressão organizacional será descoberta, e sim, apenas, quando. Ou seja, agir para a busca da transformação de comportamentos é minimamente uma decisão estratégica para a reputação.
Aos profissionais que escolheram ou irão escolher o caminho da construção da moral organizacional cabe a informação de que esse pode não ser o caminho mais fácil, e que demandará um nível de reconhecimento estratégico que o comunicador tem para a organização. Envolverá, certamente, o dizer não. O não de um especialista em "tornar comum" para a construção de atenção, retenção, diálogo, conscientização, atitudes e comportamentos organizacionais com o apoio de processos e líderes. Porque recomendações e diretrizes de muitas áreas são ouvidas pela alta administração, com atendimento de processos, prazos e premissas recomendadas e os comunicadores muitas vezes são excluídos de decisões de suas atividades?
Os nãos devem ser vistos pela ótica do sim pela organização. Sim em reconhecer, por exemplo, na construção do conteúdo do código de ética, o interesse de ouvir os funcionários e todos os stakeholders para identificar o atual padrão moral presente na cultura e as principais demandas de postura responsável. O sim à legitimidade e eficácia do código para a redução dos principais riscos da organização, excluindo a possibilidade de cópias de códigos de concorrência ou empresas com reconhecimento ético, apenas para cumprir requisitos.
O sim à comunicação do conteúdo do código, por exemplo, contemplando mecanismos estratégicos de diálogo com todos os funcionários, e que legitime o programa como um entendimento e não como prescrições para evitar sanções. O cuidado com a instalação do clima e cultura do medo. Atitude e comportamento não são transformados apenas com informação, mas a partir de significados em relação, que acontecem naturalmente na organização, mas que se não respeitados e promovidos, poderão inclusive questionar a validade do programa.
A percepção estratégica do profissional, que planeja processos cada vez mais inovadores, com premissas de comunicação adequadas à cultura de cada organização, que de fato sensibilizam, que despertam atenção - muitas vezes com humor, que promovem reflexão, que promovem conhecimento com clareza e que tratam da construção do comportamento com líderes e processos de gestão integrados, demonstra que muitos comunicadores estão dizendo muitos "sim" ao seu papel essencial de "tornar comum". E "não" ao seu papel técnico gerador de evidências.
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