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COLUNAS


Luiz Fernando Brandão


Jornalista e tradutor, é diretor da in futuro, consultoria de comunicação que valoriza a transparência, a prestação de contas e o engajamento genuíno dos públicos estratégicos como vetores de transformação no ambiente dos negócios. Com 40 anos de experiência profissional, especializou-se na gestão da narrativa empresarial no contexto da sustentabilidade. É membro do conselho deliberativo e professor do programa de MBA da Aberje.

Viva a polêmica!

              Publicado em 18/07/2014

A Aberje promoveu recentemente, na sua novíssima sede, em São Paulo, um seminário bastante concorrido sobre a comunicação de temas polêmicos. E não poderia ter sido mais feliz, ao escolher o título do encontro: “Comunicação e controvérsias: caminhos para conquistar a aceitação da opinião pública”. Pois ser aceitas, precondição para um dia alcançar a tão almejada admiração, é de fato a grande ambição que a maioria das empresas pode e deve nutrir com relação à sociedade.

Hoje, informações, versões e opiniões as mais diversas sobre todo tipo de assunto podem ser obtidas por qualquer pessoa mediante uns poucos toques no teclado. Com isso, não para de aumentar o elenco de temas de interesse coletivo – desde os impactos sociais e ambientais da atividade fabril até questões mais sensíveis, como a modificação genética de organismos vegetais e animais e o uso de cobaias pela indústria farmacêutica, para citar alguns – que passou a atrair e mobilizar corações e mentes até então ausentes do debate.

A polêmica, vamos dizer assim, democratizou-se pelas redes sociais. Por paradoxal que possa parecer, essas novas circunstâncias criaram um ambiente em que, se bem administrada, a controvérsia pode transformar-se, de ameaça ou impedimento ao bom andamento dos negócios, na matéria prima de um processo consistente e sustentável de aprimoramento da gestão e de fortalecimento da imagem.

Para que essa química aconteça, porém, os dirigentes das empresas devem ser capazes de reconhecer a legitimidade de percepções reticentes ou contrárias e estar dispostos a conviver com elas, conduzindo-as com sensibilidade e investindo no diálogo, a fim de estabelecer um relacionamento produtivo com os chamados grupos de pressão. Devem, também, estar atentos para discernir, dentre essas demandas e pressões, aquelas que possam estar servindo de instrumento a outros interesses, sejam estes políticos, econômicos ou comerciais, num processo que já apelidei de “dumping reputacional” e poderá ser o tema de outra coluna.

Mas tamanho grau de abertura e de sabedoria é ainda pouco visível nas organizações. A julgar pelos conteúdos veiculados por empresas que atuam em setores sabidamente polêmicos, prevalece a insistência em narrativas olímpicas e em posicionamentos monolíticos. São discursos impermeáveis que, ao recusar-se a admitir pontos de vista contrários aos objetivos da corporação, só contribuem para acirrar as disputas e diminuir as chances de uma possível conciliação de interesses com os críticos e opositores.

Trata-se, antes de tudo, de um exercício de humildade para o qual nem todos estão ainda preparados, e de um desafio inteiramente novo para a prática da comunicação empresarial. O sucesso da nossa atividade, que até aqui esteve na maioria dos casos empenhada em colocar na vitrine apenas os aspectos positivos da imagem, passa a depender cada vez mais do debate transparente dos dilemas, desafios e dificuldades inerentes ao negócio, da prestação de contas e do engajamento genuíno dos públicos estratégicos.

Assumir compromissos de longo prazo que levem em conta os anseios coletivos, flexibilizar os processos decisórios, tornando-os mais participativos, e compartilhar escolhas com as partes mais diretamente afetadas estão entre os caminhos que a empresa deve trilhar para obter um dos ativos intangíveis mais cobiçados no mundo corporativo: a chamada licença social para operar.

Expressão cunhada no final da década de 90 por um executivo de relações públicas da indústria da mineração, a licença social tem como fundamentos as crenças, opiniões e percepções da comunidade e de outras partes interessadas a respeito de um projeto ou empreendimento. É um conceito dinâmico, pois a forma como as pessoas veem as coisas está sujeita a mudanças, à medida que os fatos evoluem e surgem novas informações: por isso, a licença social tem de ser conquistada e mantida, o que estabelece um saudável processo de retroalimentação.

Nesse sentido, o grau de aceitação, ou favorabilidade, das comunidades vizinhas e de outros públicos mais diretamente afetados, aferido sistematicamente por metodologias específicas, fornece às administrações indicadores bem mais confiáveis de um bom trabalho de comunicação e relacionamento que as tradicionais análises de clipping e pesquisas de imagem institucional, normalmente realizadas entre públicos mais amplos e menos familiarizados com os aspectos controversos da empresa.

Embora tudo isso pareça bastante óbvio, infelizmente ainda não foi captado por muitas lideranças empresariais. Aquelas organizações que já entenderam o espírito da coisa e estão tratando de fazer o dever de casa têm clara vantagem sobre as concorrentes — não apenas por evitar custos adicionais, que por vezes inviabilizam a execução de suas estratégias de negócios, mas também por poderem concentrar recursos, tempo e energia nas suas atividades fim e torná-las mais sustentáveis. Sem considerar os ganhos de imagem, é claro.


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