''Gerenciar uma cultura é algo muito complexo'', disse um professor da Fundação Dom Cabral para a jornalista Letícia Arcoverde. Foi lendo a reportagem publicada por ela recentemente no jornal Valor Economico¹ sobre como realizar transformações organizacionais e mudanças culturais de sucesso, que me percebi com uma dúvida parecida com a da Alice no País das Maravilhas... Em qual porta devo entrar?
Está cada vez mais evidente que o conceito de globalização, que ajudou a explicar grandes mudanças e transformações mundiais ao longo do século XX vem ganhando novos contornos no século XXI. A evolução quase ineterrupta da tecnologia, a dissolução das fronteiras geográficas e comunicacionais, os movimentos políticos e sociais em diversos países, além de instabilidades econômicas ''surpreendentes'' onde tudo parecia tranquilo e sereno... Esses são alguns dos sintomas que demonstram o grau de interdependência entre indivíduos, grupos sociais, empresas, economias e nações.
A nossa forma de enxergar o mundo, e também de se relacionar com ele, mudou. A aceleração das transformações no mercado está exigindo uma resposta cada vez mais rápida das organizações e dos executivos. O território de atuação das empresas, por exemplo, se expandiu. Não está mais restrito aos muros altos ou edifícios envidraçados. Atualmente, esse território é o mundo todo - um espaço heterogêneo, multicultural, interdependente e fortemente conectado.
Nesse cenário, as diferenças culturais fazem parte da rotina das organizações. Falo de empresas que operam fisicamente em diferentes países, em mercados totalmente distintos, de companhias que passaram por mudanças sensíveis na condução da estratégia dos negócios, ou ainda de empresas que percebem grandes diferenças culturais em suas operações internas. Nos dias de hoje, são raras as organizações que não viveram pelo menos um desses momentos: operações de fusão e aquisição, expatriação de profissionais, investimentos e negociações de compra e venda de outras unidades, participação em alianças estratégicas com parceiros de diferentes regiões e nações.
Além de encontrar caminhos para se adaptar às diferenças, tornou-se necessário compreender e dominar alguns códigos culturais – seja na linguagem verbal ou não verbal e, principalmente, saber utilizar ferramentas para reduzir o estranhamento, minimizar as diferenças e se aproximar de outras culturas. Portanto, ter apenas consciência da diversidade cultural não é mais suficiente. É preciso saber lidar com a diversidade, aproveitando as vantagens que ela oferece.
Afirmo sem titubear que a relevância da cultura para as organizações atuais é indiscutível, seja para o sucesso ou para o fracasso das operações de empresas que se propõem a atuar em um ambiente global. No momento em que a globalização e a internacionalização de empresas não é mais uma tendência, mas sim um movimento constante, a influência da cultura é proporcionalmente maior.
É aí que entra a comunicação. Tudo isso tem demandado muito mais das redes de relacionamento e dos fluxos de comunicação das empresas que precisam - mais do que nunca - planejar, desenvolver e implantar estratégias para alcançar metas e objetivos que não são mais locais, mas sim globais. Mesmo que elas não atuem globalmente, e ainda que isso possa parecer contraditório, os resultados terão impactos que não se restrigem ao escritório ou a uma fábrica.
Por isso, acredito que a comunicação não deve ser percebida como ferramenta, mas como um dos mais importantes aspectos do processo de transformação cultural nas empresas. Parece simples. Mas, como disse o professor da Dom Cabral para a jovem jornalista Letícia, ''gerenciar uma cultura é algo muito complexo.'' Assim como no mundo de Alice, não existe apenas uma porta. Vamos abrir as duas: comunicação tem muito a ver com mudança cultural. E vice-versa.
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¹ Sucesso de mudanças culturais depende da boa gestão de pessoas. Por: Letícia Arcoverde. Valor Econômico. Coluna: Gestão. Caderno Eu&Carreira. 20 de fevereiro de 2014, página D3.