Desta vez, abordarei um assunto difícil e complicado. Um tema sobre o qual os comunicadores discutem muito pouco, que incomoda quando aparece e, por isso, é evitado, sempre que possível. Este artigo, por si mesmo, é diferente, porque suscita um número muito maior de perguntas do que de respostas. E, mesmo supondo que as respostas devam ser simples, as sutilezas dos conflitos geram muitas dúvidas que os comunicadores devem responder à medida que forem surgindo.
Vou abordar a questão da ética empresarial, a partir de nossa posição de comunicadores. Sabemos que todas as profissões e ofícios estão sujeitos a determinadas circunstâncias que podem gerar conflitos éticos, e de fato, há muitas profissões que suscitam conflitos com mais frequência. Mas, cabe a nós, como comunicadores, colocar o foco naquelas situações inerentes a nossa atividade.
A priori, poderíamos afirmar que as considerações éticas estão acima de qualquer situação ou conflito que, por ventura, possa surgir. “A ética acima de tudo!”, defenderão algumas pessoas. No entanto, há muitas sutilezas e nuances que uma análise séria da situação deve considerar. Neste artigo, minha proposta está mais focada em estimular a reflexão sobre questões afins aos comunicadores, do que julgar atitudes ou condutas. Por isso, vou tentar analisar o tema a partir de uma perspectiva o mais profissional possível (por assim dizer, de um modo objetivo e livre de considerações emocionais).
A meu ver, há, pelo menos, três elementos que deveríamos considerar para esse tipo de análise: 1, os valores próprios de cada indivíduo; 2, as particularidades do conflito que possam eventualmente surgir; e 3, a situação pessoal do comunicador.
Vamos por partes.
Felizmente, há muitos atos que geram uma condenação ética praticamente no mundo inteiro, como matar, roubar ou abusar dos mais fracos. Porém, também é certo que a escala de valores éticos é construída com base em vários elementos diferentes, como a cultura de cada país, a religião professada e as circunstâncias individuais. Esse fato faz com que algumas situações possam ser conflituosas em uma determinada região ou para alguma religião e normais em outros lugares. Aquilo que poderia ser considerado correto para um indivíduo ocidental comum poderia ser mal visto no Oriente e vice-versa. Por exemplo, o consumo de carne de vaca é habitual no Ocidente, no entanto, é condenado pelas crenças religiosas na Índia. Os países muçulmanos proíbem o consumo de álcool, mas é uma coisa normal no âmbito de negócios em muitas partes do mundo. Conheço algumas empresas ocidentais nas quais a gente pode perder milhões de dólares ao fazer um mau negócio e, mesmo assim, essa situação é tolerada. No entanto, o melhor vendedor de uma empresa desse tipo pode ser demitido pelo fato de assediar uma mulher. Em outras partes do mundo, nem sequer é permitido às mulheres trabalhar juntamente com os homens. Embora essas situações não ilustrem precisamente os potenciais conflitos dos comunicadores, constituem um exemplo para mostrar que os valores próprios de cada indivíduo apresentam sutilezas no momento de avaliar uma situação crítica do ponto de vista ético.
O segundo elemento a ser considerado é o conflito em si mesmo e a atitude da empresa em relação a ele. Por exemplo, uma empresa poderia ter cometido um erro na produção de um de seus produtos e, de uma forma discreta, decide substituí-los a partir da queixa individual de cada usuário. Para evitar que o reconhecimento de um problema de fabricação possa afetar sua reputação como fabricante de produtos de qualidade, prefere não reconhecer a falha publicamente e substituir os produtos defeituosos mantendo um perfil discreto. Seu porta-voz deve evitar falar sobre o problema, embora a questão surja nas conversas com os funcionários ou com os jornalistas. Nesse caso, o conflito é menor para o comunicador, já que este apenas deverá ignorá-lo, evitando publicamente o reconhecimento do problema de qualidade da empresa.
No entanto, há inúmeros conflitos éticos de maior magnitude. Por exemplo, ficar sabendo que a empresa onde trabalhamos contamina o meio ambiente e se nega a assumir os custos. Ou, então, que suborna os funcionários públicos ou os sindicatos. Ou que não assume a responsabilidade pelo dano ocasionado por produtos ou serviços defeituosos. Qualquer uma dessas questões, dentre outras tantas que poderíamos mencionar, apresentam conflitos éticos de maior magnitude frente aos quais os comunicadores devem responder como profissionais e sujeitos. Como reagimos diante de uma situação assim?
Justamente, diante de uma situação desse tipo é que aparece o terceiro elemento. Tem a ver com nossa própria situação pessoal. Por um lado, trabalhamos em uma empresa, na qual nos deparamos com um conflito ético sumamente sério. Por exemplo, um meio de comunicação denuncia que houve suborno em um contrato que nossa empresa ganhou com o governo federal. Ou que nosso processo de produção está afetando o meio ambiente e, em particular, milhares de pessoas de uma determinada comunidade. Rapidamente, poderíamos dizer “não concordo com isso, prefiro pedir demissão” e largamos nosso trabalho. Mas, na verdade, precisamos trabalhar. Temos filhos para criar e educar. Ajudamos nossos pais, já que são idosos e a aposentadoria deles não é suficiente. Temos de pagar a hipoteca da casa onde moramos etc.
Ao mesmo tempo, se renunciarmos ao nosso trabalho em um momento de conflito, seremos profissionais de confiança para as demais empresas? Ou eles podem achar que não somos leais o bastante para quando precisarem de nossa ajuda?
Como vocês podem ver, do ponto de vista ético, há circunstâncias que geram muitas interrogações difíceis de serem respondidas. De fato, como comunicadores, sabemos que possivelmente alguma vez enfrentaremos um conflito dessa natureza e, diante de uma situação assim, convém estarmos preparados de antemão com uma resposta.