Uma reflexão sobre nada
Caso estejamos apenas de passagem pela vida e sem grandes pretensões, talvez tanto faça, quanto tanto fez a nossa existência até aqui. Quase um acaso, um descuido do plano divino ao nos colocar diante da vida. Vou partir de alguns fatos reais para refletir sobre nada. Vou rechear meu enredo como quem desfruta de mais um episódio genial do Seinfeld¹ para comprovar que viver não depende de nada, caso assim desejemos. Uma crítica profunda da sociedade, que vem se consolidando como verdadeira cada dia mais. Uma sociedade aonde os abraços e os aprendizados vem se tornando equivocadamente desnecessários. Onde a reflexão sobre os fatos de como tornar melhor a nossa vida e dos nossos semelhantes foi delegada, porém não sabemos a quem.
Um momento que me marcou muito foi a conclusão do meu programa de mestrado. Mas vou deixar de lado a incrível experiência que essa fase da vida nos propicia para me deter numa observação da cena, no momento da entrega dos certificados e da devolução da cópia dos volumes gerados a partir das dissertações. Sabedor que num programa de mestrado o caminhar é sempre mais marcante e instrutivo que a que o final da jornada em si.
Lembro-me como se fosse hoje do evento de colação de grau. Na falta de algo melhor para ajudar no ajuste de um projetor multimídia que seria utilizado para a apresentação institucional da Universidade, pois o dispositivo de regulagem do projetor não atendia a altura necessária, o técnico de audiovisual não teve dúvida e lançou mão de dois volumes de dissertações, os mais robustos, para apoiar o equipamento e acertar o enquadramento da imagem à tela. Perfeito! Agora a cerimônia poderia ser iniciada.
A cena ficou gravada de forma tão perene na minha memória que me faz pensar até hoje sobre quanto conhecimento é gerado para que a sociedade possa ser melhor, porém quanto desse conhecimento sofre com algum desvio na sua utilidade. Ou seja, apoia uma causa menor, ou mesmo desprezível. Qual o respeito e valor foram auferidos àqueles trabalhos que ali estavam? Pelos alunos, pelos orientadores, pela instituição? O fato que relatei é apenas ilustrativo e pode até parecer menor, mas entristece. E pode ser por negligenciarmos esses pequenos detalhes que estamos perdendo o jogo do desenvolvimento humano sustentável.
O fato que relatei parece com nada importante. O nada, no sentido niilista do termo, carrega consigo um caráter ambíguo, que a depender do cenário social precede e pode motivar o ato positivo ou o ato negativo. O nada vem tomando conta do nosso cotidiano, mas de forma disfarçada e nefasta. E esse é o ponto mais cruel. O nada pode motivar a transformação radical e por vezes necessária, porém pode nos levar ao colapso de sentido.
Minha reflexão sugere olharmos ao nosso redor, bem perto, observarmos o nada no micro ambiente que nos circunda e verificar como ele vem influenciando nas decisões e que rumo essas decisões tendem a assumir na sua trajetória. Certamente as minhas elucubrações não respondem a dúvida filosófica se o nada, de fato, existe. Minha pretensão não chega a tanto. Mas tem me ajudado, particularmente, a mudar algumas atitudes e o jeito como analiso e vivo a vida.
¹ Seinfeld: é uma sitcom exibida originalmente nos Estados Unidos pela rede NBC por nove temporadas, entre 5 de julho de 1989 e 14 de maio de 1998. Foi criada por Larry David e Jerry Seinfeld, este último estrelando o programa como uma versão fictícia de si mesmo.
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