James Carville, o famoso consultor político de Bill Clinton, consagrou a frase “É a economia, estúpido” e seus efeitos em campanhas eleitorais. Para ele, no fim das contas, o que determina o sucesso de uma candidatura é o conjunto das estatísticas do mercado. Com a vitória de Barack Obama para o seu segundo mandato como presidente dos Estados Unidos, mais uma vez algumas pitonisas arguiram que os índices favoráveis de emprego no último mês de campanha foram a catapulta do político democrata de volta à Casa Branca.
Um olhar atento à economia norte-america, porém, pode fornecer uma série de números ruins. Apesar dos recentes avanços no crescimento industrial, o índice de desemprego está em 7,9%, perfazendo uma legião de 12,2 milhões de pessoas que estão à procura de uma vaga. Na melhor das hipóteses, o mercado dos Estados Unidos é um copo “meio cheio”, por um lado, e “meio vazio” por outro. A sabedoria de Obama – e de seus comunicadores - foi construir uma narrativa que soube se aproveitar da perspectiva “copo meio cheio”.
Às vezes, isso pode parecer uma medida sutil. Os consultores do democrata começaram fazendo uma simples mudança de palavra da campanha de 2008. Trocaram “change” (mudar) por “forward” (para frente) em 2012. O posicionamento, sem conter nenhum ataque direto, imediatamente colocou o adversário como aquele que pode mover o país ao passado. E, definitivamente, as lembranças da gestão George W. Bush não deixaram saudades.
A narrativa escolhida pelos comunicadores republicanos foi mais agressiva, ao sabor do Tea Party. O slogan escolhido “Believe in America” parece fazer uma provocação – essa sim mais direta – ao levantar a suposição que os concorrentes “não acreditam nos Estados Unidos”. Na verdade, a frase poderia ser lida como uma provocação ainda maior. Traria ao centro do debate as suposições sobre o verdadeiro local de nascimento de Obama, como se Mitt Romney fosse o candidato realmente norte-americano e o adversário um “estrangeiro”.
No terrenos dos arquétipos, essas energias mentais ancestrais tão bem descritas pelo psiquiatra suíço Carl Gustav Jung, a equipe de Obama escolheu a figura do “criador”, aquele que deseja despertar as genuínas identidades do ser e construir coletivamente novas realidades. Sem dúvida, alguém que olha para a frente e para o mundo.
Já os consultores de Romney optaram por um arquétipo mais óbvio: o “governante”. Trata-se de uma figura que deseja encontrar os tesouros escondidos e, por meio do controle, fazer a glória do reino. Nesse caso, os tesouros seriam as conquistas passadas da nação norte-americana – e que parecem perdidas -, um olhar isolacionista, tão ao gosto daqueles “wasps” (brancos, anglo-saxões e protestantes) que queriam fazer da América uma ilha.
Escolher uma narrativa é uma tarefa difícil, pois a persona política deve ter um histórico de vida que a comprove por si só. Dificilmente, haveria um candidato norte-americano mais global que Obama, a começar pelo próprio nome e suas raízes familiares profundamente ligadas à África. Já Romney, seguidor da doutrina mórmon e empresário global, surgia como um “wasp fake”, jogando água na fervura de sua narrativa. Não por acaso, a sua campanha escolheu um vice como Paul Ryan, um republicano radical, bem mais ao gosto do Tea Party. Foi uma tentativa algo atrasada de potencializar a mensagem do governador de Massachusetts.
Sem desmerecer o enfoque decisivo da economia e da avaliação de gestão, percebe-se a importância da narrativa no ambiente político, especialmente nas campanhas eleitorais. Ao que tudo indica, a habilidade dos comunicadores em construir essas mensagens, baseadas antes de tudo em fatos verídicos e éticos, é o que vai determinar o futuro dos debates que envolvem a cidadania.