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COLUNAS


Carolina Soares
carolina@aberje.com.br

Relações-públicas, mestranda em Comunicação pela ECA- USP e coordenadora da Área Educacional da Aberje – Associação Brasileira de Comunicação Empresarial.

Sua marca não tem uma boa história para contar? É hora de inventar uma

              Publicado em 18/01/2012

Você já ouvir falar na marca Hollister? Se (ainda) não, pergunte para seus filhos, sobrinhos ou qualquer jovem descolado, que você perceberá a força desta grife norte-americana. Eu também sou uma Hollisterfan. Não tanto pelas roupas, mas pela história que vou compartilhar com vocês agora.

Em 2010, tive que fazer um trabalho sobre “manifestações de marca”, como cumprimento de uma disciplina que eu estava cursando no mestrado. Foi por indicação de um amigo que cheguei até a Hollister. Ele tinha acabado de voltar de Nova Iorque e ficou impressionado com a cena que viu quando passou em frente à loja da 5ª Avenida: dois rapazes bonitos e sarados, de bermudão de praia, óculos de sol e protetor solar bem marcado no nariz - apesar do frio que fazia -, estavam “recepcionando” os clientes já na calçada da loja. Aquela imagem já dizia muito sobre a marca: descolada, voltado ao público jovem, estilo surfwear, atenta aos detalhes e diferenciada. Ao entrar, o impacto também foi tremendo: ele contou que além da arquitetura meio vintage - com direito a pranchas de surfe, móveis de madeira e tapetes desgastados- as janelas da loja não mostravam a rua, e sim um imenso telão perfeitamente encaixado entre os frisos de madeira que exibiam imagens ao vivo das ondas da Huntington Beach (California), fazendo com que os clientes se sentissem  exatamente lá. A música alta (marca registrada do Grupo Abercrombie, da qual a Hollister faz parte) e as luzes baixinhas do interior da loja criavam ao mesmo tempo uma atmosfera intimista e descontraída. Uma fragrância agradável também completava a ambientação.


 

A imagem que chamou a atenção do meu amigo: os “hostess” e vendedores da loja

 


Isso não é uma praia, e sim um telão que mostra ao vivo as praias da California


Ele sugeriu que eu pesquisasse a marca mais a fundo e fizesse o tal trabalho sobre ela, e eu acatei a ideia prontamente. Dava pra sentir o quanto ele – uma pessoa culta,  viajada e descolada – tinha sido impactado por esta experiência.
Como o trabalho era sobre “marca”, a primeira coisa que fiz foi procurar seu logotipo.Foi aí que surgiu uma grande incoerência: eu sabia que se tratava de uma marca recente, mas sua logo mostrava uma gaivota e embaixo dela um “1922”, sugerindo a data de fundação da empresa. Isso chamou minha atenção, pois o tema do mestrado que estou fazendo é justamente “História de Marca”. A partir desse indício, comecei a pesquisar a respeito, e descobri que não só a data estampada era falsa, como também a história de fundação da empresa que estava no Wikipedia. Eu sabia que estava frente a frente com uma grande oportunidade - mas também com um problema. Oportunidade porque era algo até então desconhecido e pouco explorado. Problema porque era algo que fugia complemente do discurso empresarial de ética e verdade. Mas mesmo assim decidi topar o desafio de caminhar por este terreno até então desconhecido e polêmico.

Essa criação de fatos históricos que na verdade são fictícios é chamada de pseudo-história, conceito ainda muito pouco explorado no âmbito corporativo, por razões óbvias. Pelas minhas pesquisas, só encontrei esta aplicação na Hollister e nas demais empresas do Grupo Abercrombie & Fitch (se alguém souber de algo parecido me avise,prometo colocar no agradecimento do mestrado!).

 

 


 
A logo “incoerente” da empresa



No caso da Hollister, a pseudo-história criada para justificar sua criação começa com o personagem - e fundador fictício - John M. Hollister, um jovem aventureiro americano. Depois de renegar a vida “certinha” herdada do pai, o rapaz compra uma escuna, viaja o mundo e, devido sua paixão pelo Pacífico Sul, decide abrir em 1922 um negócio em Laguna Beach, que vendia artesanato e bijuterias das ilhas da praia. John e sua mulher têm três filhos. Um deles é o ex-surfista profissional John M. Hollister Jr. (nascido em 1920). Quando John Jr. assume o negócio familiar em 1957, ele adiciona artigos de surf e equipamentos na loja e dentro de alguns anos faz dela uma das mais populares marcas do estilo de vida americano casual wear. Emocionante, não?

Apesar da empresa lançar mão de estratégia tão ousada, essa pseudo-história não é assumida de fato, ou divulgada abertamente. É possível ler a respeito em canais não oficiais, como a Wikipedia, ou em arquivos internos da empresa – como manuais de treinamento para novos funcionários. A única manifestação clara – além da logo do “1922” estampado em roupas e bolsas – é a embalagem do perfume Jake, que faz uma homenagem ao “fundador” John Hollister e seu filho.
 

 


A embalagem do perfume Jake, que conta a pseudo-história



Sempre que conto esta história, recebo as mais diversas manifestações: gente que considera um abuso, uma traição ao consumidor, que acha genial, que pensa como seria na empresa em que trabalha. Depois do espanto inicial, hoje classifico a atitude da Hollister como ousada e feliz. Uma tentativa de “encantar” o consumidor, presenteá-lo com uma narrativa bonita, de ofertar um conto de fadas coerente com a experiência que se tem nas lojas. Estamos órfãos de heróis, carentes de emoção e afeto. E porque não revestir as marcas de magia, encantamento, aventura, sonho, sentimento, paixão? Está provado que quem não tem uma bela história, já pode inventar uma.


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