O que narrar?
Copyright Terra Magazine - 20 de agosto de 2011
A morte de Sócrates (1787), de Jacques-Louis David
Escolher o que narrar é um dos maiores desafios para os educadores e comunicadores contemporâneos. Na atualidade, narrar é um ato radicalmente político, já que as palavras e as imagens em fluxo são organizadoras ou desorganizadoras de cidades, comunidades, grupos, empresas e indivíduos. No campo da comunicação empresarial, as narrativas baseadas na memória de inúmeros públicos, em suas formas de histórias, depoimentos e relatos de vida, storytelling, nos suportes oral, escrito e audiovisual é uma das tentativas de responder ao desafio de narrar, avivando e destacando o que é humano no mundo produtivo.
As cidades da antiguidade clássica organizavam a vida cotidiana, a produção, a política e o entretenimento, transmitiam as experiências, a partir de narrativas compartilhadas em seus espaços de comunicação e relacionamento, a ágora, o teatro e a feira. Nas empresas, um dos aspectos do desafio é entender que a narrativa é uma construção que ganha significado no plano da memória coletiva, transcende a técnica, racionalidade, tempos, controles e temas da administração.
A catarse na tragédia grega, as decisões, os conflitos e as controvérsias descritas e arbitradas por personagens de Homero, na Odisseia e em Ilíada, são demonstrações, no tempo ancestral, das funções sociais, pedagógicas, psicológicas e terapêuticas das narrativas. A importância dos narradores é personificada pelo reconhecimento social de suas capacidades de lembrar, evocar, com precisão, antes da invenção da escrita, os acontecimentos de sua sociedade. Se hoje os narradores são os educadores e os comunicadores, antes, eles foram os poetas. Olgária Matos lembra que na antiguidade grega o poeta era “o mestre da verdade” que vê “o que foi, o que é e o que será”. Werner Jaeger, ao comentar a importância de Homero, destaca que os gregos ligavam a concepção do poeta ao educador.
A civilização e a democracia que conhecemos – onde o poeta disputa o espaço narrativo com outros protagonistas como o professor e o comunicador – têm as suas bases construídas a partir das experiências e das memórias de seus membros, da conversa direta e do consenso sobre o que deve ser narrado ou esquecido.
Nas cidades globais, cada vez mais, professores e comunicadores têm à suas frentes leitores emancipados de fontes únicas de narrativas. Essa liberdade para escolher o que ouvir e ler, desconfiar de conteúdos e das intenções narradas, faz com que escolas e veículos de comunicação desinteressantes e desestimulantes percam alunos e audiências para os centros de conhecimento e informação valorosos e credíveis. Mas sabemos que nessas cidades milhões de pessoas não têm acesso aos lugares de informação confiável e promotora de organização cidadã. E que sem essas narrativas, geradas a partir de posicionamentos democráticos, co-autorais, colaborativos e, também, de origens especializadas e autorais, a idéia de inclusão social não se transformará em realidade. É mais uma dessas bandeiras corporativas desgastadas pelo chamado marketing da responsabilidade social, que produzem narrativas cotidianas impostas à sociedade que não avivam o humano e a utopia. Um exemplo diário desse tipo de mensagens são as narrativas financeiras embaladas em infografia matemática e siglada que sintetizam instantaneamente, a partir de critérios essencialmente econômicos, como na crise financeira atual, a imagem de sociedades complexas e diferentes como os Estados Unidos, Espanha, Portugal, Irlanda, Inglaterra, Itália e a Grécia, entre outros. Narrativas que produzem impactos reais sobre as suas gestões públicas e o cotidiano de suas juventudes, empregados e aposentados. As informações financeiras aparentemente técnicas e frias transformam-se rotineiramente nas mídias em audiovisuais, constituídos de imagens turbinadas pela novidade, violência, exotismo e ação. Um contexto que marca as redes de comunicação da atualidade e, também, a comunicação empresarial, como lugares de narrativas baseadas no medo, na ansiedade e outros estados patológicos do âmbito da psicologia social. Situação que mostra a relevância dos educadores e professores refletirem sobre a história e o conteúdo das palavras que usam nas salas de aula, redações e direções de comunicação empresarial. Narrativas que, muitas vezes, servem para promover e legitimar as irresponsabilidades públicas e corporativas.
Os artigos aqui apresentados n�o necessariamente refletem a opini�o da Aberje
e seu conte�do � de exclusiva responsabilidade do autor. 2515
O primeiro portal da Comunicação Empresarial Brasileira - Desde 1996
Sobre a Aberje |
Cursos |
Eventos |
Comitês |
Prêmio |
Associe-se |
Diretoria |
Fale conosco
Aberje - Associação Brasileira de Comunicação Empresarial ©1967 Todos os direitos reservados.
Rua Amália de Noronha, 151 - 6º andar - São Paulo/SP - (11) 5627-9090