A comunicação e a construção permanente da verdade
Uma das discussões filosóficas mais antigas da humanidade diz respeito ao que venha a ser a verdade. Movemos nossa vida segundo aquilo que acreditamos como sendo “verdades”, que são aparentemente imutáveis, mas invariavelmente transitórias, sequenciadas de forma a construir uma determinada realidade que expresse fidelidade, segundo um sistema de valores. Nossa percepção sobre o que vem a ser a realidade pode ter profundas implicações na formação do caráter individual e coletivo na sociedade.
O que pode ser a verdade? A filosofia teria ao menos cinco linhas de pensamento para iniciar uma boa discussão: a verdade como conformidade a uma regra, como correspondência, como revelação, como coerência e como utilidade. Certamente toda a discussão em torno do tema, ainda assim, desembocaria numa definição incompleta.
Todas as linhas de resposta consideram a existência de uma “realidade” justificável. Desde visões puramente materialistas, até as metafísicas e mesmo teológicas, a verdade é um eterno processo de busca interior do indivíduo a partir do confronto do conhecimento com a observação das oscilações entre as práticas cotidianas e os discursos (HABERMAS, 2004), do despertar do senso crítico e da aceitação ou não de uma determinada realidade.
O que pode tornar a realidade perceptível e operacionalizável, sob o aspecto de nossas ações práticas, é a comunicação e as possibilidades de interação. A comunicação, num espaço dialógico, pode alinhavar a perspectiva do consenso e fazer a verdade avançar na permanente construção da realidade, onde as decisões sejam abrangentes em relação ao bem comum.
As organizações, como espelho da sociedade, são movidas por decisões centradas na objetividade, numa determinada realidade, e, portanto, na perspectiva da verdade justificável. Decisões de forma individual ou por consenso deveriam expressar a verdade, com máxima fidelidade ao sistema de valores, e não conflitar com a realidade, sob pena do processo de comunicação contaminar negativamente o processo interpretativo, impregnar-se de ruídos, gerar desconfiança e promover a desconstrução dessa realidade.
Construir ou reconstruir a verdade não é tarefa corriqueira, e, portanto, mudar a percepção sobre determinada realidade, pode implicar numa busca além da consciência cotidiana, na libertação em relação à lógica e à razão, ou seja: dar espaço ao sonhar. “Sonhar”, em termos organizacionais, pode significar dar vazão à energia vital capaz de trazer à discussão novos aspectos que sustentam a verdade ou a derrotam como não-verdade: experimentar um olhar sobre novos paradigmas. Nesse contexto surrealista pode ser possível despir-se de preconceitos e aprofundar análises e discussões profícuas sobre o tema.
Os gestores do processo de comunicação podem propor a inclusão de agentes indutores ou práticas voltadas ao “sonhar”, à construção de um ambiente de trabalho onde prevaleça o diálogo permanente na busca da construção permanente da verdade e do bem comum. Muitas organizações já adotaram o amor ao saber, a filosofia, em seu cotidiano. Tornaram natural no processo de comunicação a construção e reconstrução permanente da verdade. Quanto mais as organizações se aproximarem da verdade, mais transparentes serão nas suas múltiplas relações. Esta pode ser a diferença entre o ver e o enxergar, entre o efêmero e o perene, entre o mecanicista e o orgânico.
HABERMAS, J. A ética da discussão e a questão da verdade. São Paulo: Martins Fontes, 2004
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