Um evento mundial e a comunicação do Terceiro Setor
Os dados divulgados este ano, pela Edelman, em seu Trust Barometer, que analisa os índices de confiabilidade da sociedade nas instituições, chegaram as minhas mãos enquanto organizava o “Oito horas extras por uma boa causa” (www.8-i.org). O evento acontece no mesmo dia em diferentes cidades do Mundo, incluindo o Rio de Janeiro em 2013, pelo segundo ano consecutivo. Sua proposta é atender de forma voluntária a necessidades de comunicação de Organizações Não-Governamentais (ONGs) e, por isso, os números referentes às ONGs chamaram minha atenção. Enquanto na média mundial, elas ocupam o primeiro lugar em confiabilidade, com 61 pontos percentuais, seguidas por empresas (56%), mídias (55%) e governo (46%); no Brasil, as ONGs estão em terceiro lugar, com 53 pontos, abaixo da mídia (67%) e das empresas (64%), mas acima do governo (31%).
Os atributos analisados pela pesquisa como fatores de credibilidade nas instituições mencionadas são corrupção e fraudes, propósito, transparência, desempenho e competência, e controle e fiscalização (ou regulamentação). E por isso tudo, minha expectativa era de que as ONGs reconhecessem o valor da oferta de mão de obra voluntária para atender a suas necessidades de comunicação e de que se inscrevessem em massa para participar do evento. Não foi o que aconteceu. E aí minhas reflexões começaram. Como a maioria dessas organizações civis entende a Comunicação?
O evento “8 horas extras por uma boa causa” é uma ideia simpática que começou em 2004 na Holanda e ganhou o mundo. Seu propósito é reunir profissionais criativos, com conhecimentos de comunicação, que doam uma jornada de oito horas de trabalho para atenderem a deficiências de ONGs, nessa área específica. Este ano, aconteceu em 20 cidades do mundo, espalhadas em 3 continentes, reunindo cerca de 300 voluntários e atendendo a 60 ONGs.
Durante a divulgação do evento, feita basicamente pelas redes sociais, percebi que algumas ONGs não compreendiam a proposta e esbarravam no velho paradigma “precisamos mesmo é de dinheiro”, “não temos como mobilizar uma pessoa para acompanhar esse trabalho, porque somos poucos”. Alguns dirigentes de ONGs com quem conversei questionavam a razão da oferta desse tipo de serviço, argumentando que precisavam de voluntários para suas atividades-fim.
Em meio à confusão conceitual e à diversidade de linhas de atuação que envolvem as ONGs, como mostrar para a sociedade, a quem em última instância a instituição visa atender, o seu propósito e a sua atuação prescindindo da comunicação ou conduzindo-a de forma descuidada? Não falo das organizações já estruturadas de forma a comportar planejamentos de comunicação consistentes e profissionais. Estas são muitas, mas não a maioria. Falo daquelas que atuam em seus nichos, oferecendo ações relevantes e transformadoras ao grupo social em que estão inseridas, mas sem a possibilidade de incluir, em seu planejamento, ações permanentes de comunicação.
Ao contrário do que se pensa, comunicar pode ser feito sem verba. Além das diferentes formas de expressão que nos são inerentes, há as redes sociais interligando tudo e todos, a web disponibilizando informações praticamente sem restrições, e as formas de contato acessíveis via internet como e-mail e programas de voz e conferência. O “8-i” vem ao encontro dessas demandas, oferecendo às organizações ações que envolvem conhecimentos de comunicação e criatividade.
No Rio, foi sediado pela Universidade Estácio, em Madureira, reuniu um grupo de 16 voluntários e atendeu a duas ONGs. Para a Oito Vidas (www.oitovidas.org.br), cuja missão é cuidar de gatos abandonados, conscientizando a população para a importância da castração e promovendo a adoção responsável, o primeiro passo foi a preparação de um planejamento de comunicação, com um cronograma mensal, para facilitar e organizar as ações sob responsabilidade quase que exclusiva da fundadora. Também foram elaborados cartões para divulgação na fan page do Facebook e via mailing, templates de fácil utilização pela administração da ONG e uma campanha para alavancar a venda de calendários e outros itens para captação de recursos. Para a Associação Brasileira de Apoio Complementar à Educação (ABRACE), recriado o logotipo, foram confeccionados cartazes e cartões para mailing com a finalidade de captar voluntários e doadores, além de cartões de agradecimento para doadores e colaboradores. Também houve tradução de textos para inglês e criação de um blog em substituição ao site cuja linguagem não permitia atualização pela coordenação da instituição.
Todo o evento foi permeado pela emoção, reunindo pessoas sérias, que acreditam que sempre podem fazer algo para transformar o mundo. Conhecer a história das ONGs, que se mistura à trajetória de vida de suas fundadoras, enriqueceu a experiência e teve um significado pessoal e distinto para cada um dos participantes.
Para mim, no entanto, houve um aprendizado a mais. Enquanto reunia forças para que tudo isso acontecesse, replicando o material de divulgação, acabei esquecendo alguns conceitos básicos de comunicação, deixando de levar em conta as particularidades do público com quem estava me comunicando. Entender a percepção e as expectativas das ONGs teria feito muita diferença, senão para aumentar o número de inscritos, para propiciar reflexões produtivas sobre o papel da comunicação em suas atividades. Acabei assumindo, sem perceber, na reprodução do material, o papel ultrapassado do especialista que oferece seus conhecimentos de forma vertical, sem levar em conta verdadeiramente a experiência daqueles que precisa impactar.
A abertura do diálogo com as ONGs a respeito do papel da comunicação, para mim, está apenas começando. Quando percebi que precisava fazer um trabalho educativo acerca de importância da comunicação para as organizações e que este começava por ouvi-las, faltava pouco tempo para que o evento acontecesse e não havia mais como modificar o modelo de divulgação. Daqui pra frente, certamente aprenderemos juntos, buscando na comunicação o suporte necessário para que as ONGs mostrem à sociedade onde pretendem chegar e qual o seu papel como agentes de transformação em seus nichos de atuação. Entendendo, através do exercício do diálogo, como podemos elevar nosso potencial de transformação social e melhorar a imagem que as organizações mantêm hoje, junto à sociedade.
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