A partir de Burrel e Morgan (1979) é possível traçar uma retrospectiva dos estudos organizacionais e os diferentes olhares sobre o trabalhador. Nas teorias de Taylor, Fayol e da Escola Clássica de Gerência encontramos pressupostos objetivistas, onde ao trabalhador é atribuído papel essencialmente passivo. Estudos, entre as décadas de 1930 e 1960, ponderam sobre a dimensão subjetiva presente nas realidades organizacionais e colocam em evidência o trabalhador “como um ser social motivado por necessidades afetivas” (BURREL; MORGAN, 1979, p. 40). Neste contexto, a perspectiva interpretativa vê o mundo social em construção, na qual se tem o olhar sobre o trabalhador como um sujeito de natureza humana voluntarista, autônomo e possuidor do livre arbítrio. Reconhece-se o sujeito na sua qualidade subjetiva, como aquele que cria, modifica e interpreta o mundo no qual ele se descobre.
Contemporaneamente, embora seja manifestado o interesse na dimensão subjetiva do sujeito e a necessidade de seu reconhecimento no ambiente organizacional, o que aparece, muitas vezes de forma não declarada, é a preocupação com a eficiência corporativa e a produtividade, sem envolvimento com aspectos mais humanos da vida organizacional, como alerta Mumby (2010). Para este autor, de Taylor aos dias atuais, os estudos organizacionais preocuparam-se sobremaneira com a questão de controle, tendo havido apenas a transferência do local de seu exercício, antes sobre o corpo do trabalhador e hoje sobre a mente, bem como, suas emoções.
Se organizações são produtos de configurações de poder e interesses específicos (MUMBY, 2010), exercidos em discursos e significados das ações, tem-se a comunicação como constituinte da própria organização. Neste contexto, Frost et. al. (2000 apud MUMBY, 2010) descreveram as organizações como locais de cura e dor diárias, onde as emoções são reprimidas de forma que elas simplesmente atendam aos objetivos restritos da produtividade e eficiência organizacional.
Num olhar habermasiano sobre a comunicação, tem-se mais claramente a visão da comunicação atendendo interesses organizacionais, dentro das racionalidades instrumental e estratégica, nas quais o trabalhador é considerado como uma “coisa para se obter outra coisa” ou “como meio para alcançar um fim” (REPA, 2008). Nestas racionalidades, voltadas exclusivamente para ganhos, investe-se em quantidade de resultados, incentiva-se a competição entre os trabalhadores e objetiva-se a ‘supervalorização’ do econômico.
A implementação e o predomínio das racionalidades instrumental e estratégica podem ser observados em mecanismos de coordenação, controle e comunicação para resultados, que utilizam gratificação ou ameaça e sugestão ou engano, desconsiderando a presença da intersubjetividade do trabalhador como sugere a proposta da Teoria do Agir Comunicativo (TAC) de Habermas (2012). Na racionalidade da TAC, a comunicação prioriza o entendimento negociado entre sujeitos, que falam e agem em processos interacionais livres de influências de poder e interesses coagidos. Neste sentido, a comunicação em Habermas demanda um ambiente aberto às falas espontâneas e à crítica, em busca de entendimento para a resolução de conflitos.
Muito embora os discursos contemporâneos vislumbrem um ambiente como esse, ainda prevalece, no contexto capitalista, uma comunicação orientada para atender prazos e metas, para alcançar a eficiência, a produtividade e o sucesso organizacional. O resultado deste esforço comunicacional controvertido pode ser cada vez mais percebido nos altíssimos níveis de estresse físico e mental dos trabalhadores. Seria esta a hora de repensar as racionalidades por trás dos processos e práticas comunicacionais?
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Giovanna Galleli, graduada em Comunicação e discente do Programa de Mestrado em Administração da Universidade Estadual de Londrina (UEL)
Marlene Marchiori, pesquisadora líder do GEFACESCOM www.uel.br.gefacescom/
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Referências
BURREL, Gibson; MORGAN, Gareth. Sociological Paradigms and Organizational Analysis. Heineman, London, 1979.
HABERMAS, Jürgen. Teoria do Agir Comunicativo: racionalidade da ação e racionalização social. São Paulo: Editora WNF Martins Fontes, 2012.
MUMBY, Dennis K. Reflexões críticas sobre comunicação e humanização nas organizações. In: KUNSCH, Margarida M. K. A Comunicação como Fator de Humanização das organizações. 1. Ed. São Caetano do Sul, SP: Difusão Editora, 2010. pp. 19-40.
REPA, Luiz Sérgio. Jürgen Habermas e o modelo reconstrutivo de teoria crítica. In: Marcos Nobre. (Org.). Curso livre de teoria crítica. 1ed.Campinas: Papirus, 2008, p. 161-182.