Vamos todos para a escola?
Pode me chamar de old school, mas eu adoro cartas. Gosto da marca que as pessoas deixam nelas – não só pela caligrafia, mas também pelo sentimento colocado em cada palavra ou pontuação. Dou um exemplo. Quando questionado sobre o futuro sombrio da humanidade, o escritor E.B. White respondeu, em março de 1973, ao seu correspondente:
“Esperança é o que nos resta em tempos difíceis. Vou me levantar no domingo de manhã e dar corda no relógio, contribuindo para a ordem e a estabilidade. Os marinheiros têm uma expressão para o tempo: dizem que o tempo é um grande blefista. Acho que isso também é verdade em relação à nossa sociedade – tudo parece sombrio, e então as nuvens se abrem, e tudo muda, às vezes de repente. É óbvio que a humanidade transformou num caos a vida neste planeta. Mas, como povo, provavelmente trazemos em nós sementes do bem que desde muito esperam pelas condições adequadas para brotar. A curiosidade, a inflexibilidade, a inventividade, a engenhosidade do homem o levaram a sérias dificuldades. Só podemos esperar que o ajudem a sair delas.”
Não parece que E.B.White estava prevendo o futuro? O mundo no qual vivemos?
Olhe para a internet. Ela é um delicioso rodízio: a variedade de informação é ampla e cabe a você escolher a qualidade e quantidade a ser consumida. Você paga um preço fixo por uma liberdade que parece ilimitável. Mas não é.
Benjamin e Gloria sabem bem disso. Ele é um acadêmico especialista em Coreia do Norte e ela é atriz e, até então, uma unanimidade nacional. Ambos não corresponderam à expectativa e o que se espera de um profissional em um programa de TV ao vivo. Enquanto Benjamin travou e foi incapaz de formular um raciocínio, Gloria foi sincera e não especulou sobre o que ela não conhecia em profundidade. Ambos sentiram na pele a inflexibilidade, para não perder o lirismo de E.B.White, dos tempos modernos: viraram memes e foram julgados em praça pública.
Benjamin trancou-se em casa e se manifestou somente depois de alguns dias. Postou um textão no seu blog, assumiu uma doença mental e disse ter sofrido um ataque de pânico. Gloria também reconheceu à coluna da Monica Bergamo ter levado um tempo para assimilar aquele barulho todo. Deu em vídeo a sua versão da história, também um dia depois. Acabou rindo de si mesma, aparentemente, e até lucrou com isso.
A comunidade da internet é assim, dizem. Cobra a perfeição de quem se expõe, sob o pretexto de ser só “zueira”. O mesmo acontece, on-line e off-line, na política, que continua dividindo amizades e até famílias. As palavras secas e intolerantes, que menosprezam e ridicularizam o outro, também alimentam o jogo de poder em outros círculos, enfraquecem lideranças e fragmentam equipes e grupos que deveriam somar forças em tempos de crise.
Parece que, a essa altura do campeonato, precisamos aprender de novo a nos comunicar. Olha a ironia: toda a engenhosidade que a humanidade criou para propagar a informação não foi acompanhada pela capacidade de diálogo. “Este mundo é o que fizemos dele. Se é implacável hoje é porque nós fizemos isto por meio das nossas atitudes”, explica Marshall Rosenberg, autor de “Comunicação não-violenta : A linguagem da vida - Ferramentas de Mudança de Vida para relacionamentos saudáveis”. Para ele, a mudança do mundo acontece quando mudamos a nossa linguagem e os métodos de comunicação.
A boa notícia é que já há um movimento nesse sentido. Vejam as campanhas de respeito à diversidade, que utilizam a informação para derrubar mitos. A procura por cursos de comunicação não-violenta também aumentou. Eles fazem um raio-x no seu repertório e ensinam como ter empatia com o outro Há algumas iniciativas também no mundo corporativo. A Dove, alinhada ao seu brand mission, lançou em parceria com o Twitter uma campanha que faz uma análise das interações das pessoas. Ainda que focada em autoestima, a #SpeakBeautiful permite que as pessoas tomem consciência da sua responsabilidade nos seus comportamentos.
É óbvio que o mundo da comunicação pode liderar esse movimento. Em 2012, Bill Clinton fez esse alerta, durante um discurso em Cannes. Convocou os profissionais capazes de “incendiar a imaginação e preencher o cérebro das pessoas, assim como os seus corações”, de energia e informação necessárias para superar os obstáculos e abraçar um futuro estável e equitativo.
Essa, então, é a minha proposta: agarrar-se à esperança, dar corda no relógio e voltarmos todos para a escola. Vamos?
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