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Marlene Marchiori


Concluiu o pós-doutorado em Comunicação Organizacional na Brian Lamb School of Communication, da Purdue University, nos Estados Unidos. Doutora pela Universidade de São Paulo (USP), com estudos desenvolvidos no Theory, Culture and Society Centre da Notthingham Trent University, no Reino Unido. Graduada em Administração e em Comunicação Social – Relações Públicas, Marlene é pesquisadora líder do CNPq (Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico) nos grupos de estudos Cultura e Comunicação Organizacional (Gefacescom) e Comunicação Organizacional e Relações Públicas: perspectivas teóricas e práticas no campo estratégico (Gecorp). Professora sênior da Universidade Estadual de Londrina (UEL). Autora do livro Cultura e comunicação organizacional: um olhar estratégico sobre a organização, e organizadora das obras Comunicação e Organização: reflexões, processos e práticas; Redes sociais, comunicação, organizações; Comunicação, discurso, organizações; e da Coleção Faces da cultura e da comunicação organizacional.

Comunicação organizacional, a perspectiva do consenso e a ressignificação do entendimento.

              Publicado em 04/09/2014

Por Érik Fernandes e Marlene Marchiori 

 

Em nossa discussão de hoje para a Coluna Aberje, partimos da premissa que, ao falarmos em comunicação, falamos em interação humana (MARCHIORI, 2010). Interagir significa relacionar-se, sendo um processo que possibilita aos sujeitos gerarem significado quando em conversação. Essa prática possibilita aos sujeitos criar sentido para suas relações.

Ao mapearmos essas relações nos ambientes organizacionais, devemos olhar para a subjetividade dos sujeitos e isso não é tarefa simples, pois precisamos tentar entender o que não está aparente e definido, mas o que é complexo e que pode assumir vários significados, os quais são naturalmente dependentes das relações nos contextos em que ocorrem.

Shepherd (2006) sugere compreendermos esse movimento que desloca minha compreensão da minha “órbita de significados” para a “órbita de significados” do outro que se relaciona comigo, entretanto, ao fazer esse movimento, não se está interessado somente nos significados do outro, mas na ampliação produzida pela relação entre as duas órbitas de significados que, juntas, a partir disso, produzem um novo sentido a ambos. Para Shepherd (2006), é exatamente essa “experiência simultânea entre o self (eu) e o other (outro)”, que ele chama de “transcendência”. Transcender significa superar-se, ou seja, o indivíduo, a partir do seu “eu”, supera-o, tornando-se mais do que o que era antes através da interação com o outro (SHEPHERD, 2006). A cada nova relação, os sujeitos crescem, pois acabam vivenciando um novo processo que amplia seus significados e lhes dão novos sentidos.

Se os significados são ampliados e/ou modificados a cada relação estabelecida, como podem as organizações agir sob a prerrogativa do consenso? Esse consenso só pode ter um caráter temporário e indeterminado, porque a cada nova relação ele já não terá mais sentido e, também, como as relações são dinâmicas e dependentes das pessoas, fica aparente o caráter indeterminado do consenso.

Outro argumento que indica que o consenso não é absoluto são os estudos relativos ao empreendedorismo que tem na figura de Schumpeter (1984), seu maior expoente. As inovações geralmente surgem das percepções diferenciadas das pessoas que se arriscam para criar algo diferenciado e com valor, e esse movimento não pode estar dentro de uma perspectiva do consenso. Mesmo quando todas as empresas tem certa similaridade, o que elas buscam? Se diferenciar das outras para obter privilégios que variam desde econômicos a reconhecimento.

Então, por que há uma busca por esse consenso, que aqui é entendido como um processo que leva a homogeneização dos significados compartilhados nas relações interpessoais na organização? Porque para o gestor é mais fácil atender a demandas parecidas do que a demandas distintas, pois essas demandariam desse gestor mais relacionamento com as pessoas para que este pudesse entender os significados ali partilhados. Ao ampliar o seu self, o gestor poderia até ser entendido em sua posição hierárquica num novo sentido e significado como, por exemplo, o gestor de uma organização não governamental, que demanda muito relacionamento porque precisa entender os significados que os voluntários compartilham e isso faz com que sua posição hierárquica seja reconhecida não pelo poder instituído, mas pelo próprio significado construído pelas relações.

Apesar de tudo, é possível olhar para essa dinâmica, aparentemente problemática, com um olhar novo, tendo como base o conceito de transcendência apresentado por Shepherd (2006). A leitura feita nos permite afirmar que o significado coletivo surge quando o indivíduo experimenta, simultaneamente, os seus significados com os dos outros, observando, aqui, a sutileza de não eliminar as diferenças nesse processo. Esse entendimento nos fornece a capacidade de leitura tanto de processos negativos, quanto de positivos nas interações.

Se o consenso não é absoluto, porque as pessoas estão se relacionando constantemente e ampliando seus significados, e isso pode levar a processos com resultados negativos e positivos, então é necessário outro mecanismo capaz de dar esse direcionamento ao todo organizacional dentro desse contexto de significados compartilhados. Nesse sentido, advogamos em favor da ressignificação da essência do conceito de “entendimento”. O entendimento, a priori, significa exatamente o consenso, entretanto, ao utilizar a perspectiva de Shepherd (2006) de experimentação que dá um nosso sentido a isso, ampliamos o significado de ambos os sujeitos pela interação, tornando-os capazes de entender melhor um ao outro.

Fazendo uma analogia com a famosa frase de Evelyn Beatrice Hall escrita em 1906, numa biografia que fez de Voltaire e, por isso, é erroneamente atribuída a ele, “eu desaprovo o que dizes, mas defenderei até a morte seu direito de dizê-lo”, é possível perceber esses elementos de falta de consenso e de ressignificação do entendimento. Ao afirmar que ela não concorda com ele, ela está admitindo, categoricamente, a não existência de um consenso, entretanto, ao defender o direito do outro em dizer o que pensa, ela demonstra um entendimento que não pode ser consensual porque, primeiro ela entende os significados do outro e, segundo, isso amplia os significados dela, pois discordar não implica em falta de sentido, entendimento.

Para os gestores e as organizações que pelos motivos apresentados buscam o consenso, esse “novo” entendimento abre uma possibilidade diferenciada no processo de organizar, porque se no consenso algumas diferenças eram silenciadas para que um todo uniforme viesse a emergir e se tornasse de fácil gerenciamento, essa nova abordagem acaba não privilegiando uns em detrimento a outros, pois os atendimentos das expectativas podem ser diferenciados, entendidos e gerenciados pelos relacionamentos e seus entendimentos e, ainda sim, se ter um grupo coeso no sentido de se ter uma direção organizacional.

Como profissionais de comunicação e das organizações, devemos refletir exatamente nesse ponto em que quanto maiores as diferenças dentro da organização, mais pluralidades, mais entendimentos incomuns e exclusivamente para os gestores isso indica maior profundidade de entendimento e maior segurança no processo de tomada de decisão.

Portanto ao explorar a ampliação da capacidade de entendimento dos significados imersos na organização, estamos contribuindo para o nosso entendimento de que hoje vivemos e convivemos em espaços dinâmicos, abertos e flexíveis, sendo imperativo darmos “voz” aos sujeitos em interação nesse processo de construção da nova realidade organizacional mais humanizada.


Referências Bibliográficas

SHEPHERD, G. J. . Communication as Transcedence. In: SHEPHERD, G. J.; JOHN, J. St.; STRIPHAS, T. Communication as –: perspectives on theory. Califórnia: Sage, 2006. p. 22-31.

SCHUMPETER, J. A. Capitalismos, socialismo e democracia. Rio de Janeiro: Zahar, 1984. 534 p.


Os artigos aqui apresentados n�o necessariamente refletem a opini�o da Aberje e seu conte�do � de exclusiva responsabilidade do autor. 2633

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