Poucas pessoas no Brasil conseguiram o feito de Hebe Camargo, que nos deixou este final de semana, após lutar por dois anos contra o câncer.
Hebe agradava fãs de todas as idades, religiões e classes sociais. Por conta disso, ficou mais de 60 anos no ar. Em 1955, estreou como apresentadora em “
O mundo é das mulheres”, um dos primeiros programas a discutir a condição da mulher no Brasil. Nos últimos tempos, mesmo doente e aos 83 anos, estava com emprego garantido no
SBT. Me apontem quem no Brasil conseguiu um feito como esse?
Hebe tornou-se um
ícone da televisão brasileira por ter criado sua própria fórmula de comunicação. Não copiava ninguém. Tinha seu estilo, seu jeito de ser e, de certa forma, antecipou os princípios que regem a comunicação nos dias de hoje, pois era multimídia (atuou como apresentadora, cantora e atriz) e explorava, de maneira competente, a interatividade com a plateia. Saia do script tradicional de muitos programas de TV para se emocionar junto com entrevistados, rir e chorar junto com a plateia e vender produtos com os patrocinadores. Trouxe para a TV suas preferências e gostos, com roupas brilhantes e muitas joias.
Até no momento de sua morte, atraiu a atenção de todos. Seu velório aconteceu no Palácio dos Bandeirantes, sede do Governo do Estado de São Paulo, com público eclético e com direito a até um selinho de despedida de
Silvio Santos. Centenas de mídias noticiaram sua partida. Sua morte causou grande comoção e despertou manifestações das mais variadas
personalidades, da
Presidente Dilma Rousseff a amigos, como
Roberto Carlos. Até nas baladas de sábado (29/09), foi homenageada pelos jovens, com a criação do “Dia do Selinho”, gerando muita diversão, como tinha de ser.
Inteligente, Hebe sabia como ninguém explorar os recursos da TV. Adaptava-se conforme as mensagens que transmitia, sendo reconhecida nos papeis de mulher, mãe, esposa e, principalmente, amiga. Olhava sem medo para a câmera e falava de forma individual com cada um de seus telespectadores. Sabia muito bem se comunicar com as pessoas e mexer com imaginário do seu público.
Trabalhava a estabilidade dos valores tradicionais e brincava com os limites da transgressão, como o "selinho" ao mesmo tempo ousado e ingênuo, transmitindo o recado de que tudo é possível. Seu jeito de agir inspirou um dos primeiros estudos sociológicos sobre a TV: “A Noite da Madrinha”, escrito no início dos anos 70 por
Sergio Miceli.
Tudo isso mostra que a lição que ela deixa para todos é que a comunicação precisa ser sincera, desprendida de preconceitos e de tabus. Quanto mais espontânea e autêntica, melhor. Precisa aproximar pessoas, despertar interesses comuns e provocar empatia. Tinha um estilo próprio de entrevistar. As pessoas mais importantes do Brasil nas últimas décadas sentaram em
seu sofá, que era a prova máxima de suas técnicas. Não existem vídeos no
Youtube, com entrevistados que tenham ficado de mau humor ou desconfortáveis em seu programa. Pelo contrário. Além de risos e abraços, lascava “selinhos” em todos – veja a lista dos
TOP 10.
Além deixar um
legado para a TV brasileira, seu trabalho deveria servir de modelo a empresários e executivos que travam diante das câmeras ou de palestras em público. Não que todos precisam ter a proximidade que ela tinha quando gravava seus programas, mas o modelo Hebe de se comunicar sempre foi sensacional e poderia ser utilizado de base por quem busca sucesso e diferenciação na sua comunicação, além de transparência, sinceridade, espontaneidade, autenticidade e aproximação (tanto com temas, como com a audiência).
Mesmo quando descobriu a doença em 2010, nunca deixou seu otimismo de lado: “Posso até morrer daqui a pouco, que vou morrer feliz da vida”. Que Hebe sirva de modelo e inspiração para todos que buscam sua própria identidade na sua comunicação.