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COLUNAS


Denise Monteiro
denisemonteiro4@hotmail.com

Gestora de negócios na área de Comunicação Empresarial, ministra palestras, cursos e treinamentos na área de comunicação. Atuou em organizações como Grupo Ogilvy, Rede Globo de Televisão, Unilever e Tetra Pak. Foi diretora da D+D Eventos. Foi coordenadora de pós graduação na FAAP; e professora na graduação, pós-graduação e MBA na FAAP e Anhembi Morumbi.
Graduada em Comunicação Social com habilitação em Relações Públicas. Pós-graduada em: Comunicação Empresarial e Gestão de Serviços pela ESPM e no Máster em Tecnologia Educacional pela FAAP. Mestre em Comunicação e Práticas de Consumo pela ESPM – Escola Superior de Propaganda e Marketing.

Tenho medo de SAC!

              Publicado em 28/07/2010

A matéria de capa da revista EXAME, desta quinzena, de Fabiane Stefano (São Paulo, nº 13, Edição 972, 28 jun. 2010), ilustra a onda de consumo que estamos vivendo e que se assemelha ao pós-guerra vivido pelos EUA nos anos 50. Uma frase em especial chamou minha atenção: “O fato de os consumidores apurarem os hábitos também obriga as empresas que sempre ganharam dinheiro com os mais pobres a repensar estratégias” (p.29). Entendo que o comentário foi dirigido ao descaso existente com os menos abastados, mas estas estratégias precisam ser revistas não apenas com os mais pobres, e sim para todas as classes, pois isso envolve dignidade, cidadania e democracia. Penso isso motivada pelo que tenho observado na qualidade dos SACs – Serviços de Atendimento aos Consumidores. Que, terceirizados ou não, retratam o relacionamento da empresa com seu usuário.

Qual leitor deste artigo não se sentiu indignado com a qualidade de algum atendimento que precisou fazer reclamação? Como nos sentimos quando mesmo em posse de um protocolo, temos que contar a mesma história a diferentes atendentes que estão treinados com as respostas prontas e que, na maioria das vezes, não são as respostas para as nossas perguntas? Quem não pediu para falar com o supervisor e nada adiantou? Quem não ficou aguardando dentro de um prazo de resposta que nunca ocorreu? Quem já não caiu num buraco negro ao aguardar uma transferência de ligação? Quem já não teve o telefone desligado na cara? Quem já não foi desacreditado? Quem já não perdeu a paciência? Que relações são estas? No que estão se transformando?

Inúmeras são as identificações, mas como somos tratados estrategicamente de forma isolada, não temos a real dimensão do problema. Mas, quando assistimos algum quadro de humor retratando a nossa realidade, rapidamente nos identificamos e dizemos: “É assim mesmo que acontece...” Aliás, porque será que chamaram a atenção dos redatores de humor? Obviamente porque satirizam o nosso cotidiano.

Desde a implantação do código de defesa do consumidor em 1991, aceleramos o processo de constante aprendizagem pelos nossos direitos (e deveres). Os órgãos de defesa procuram fazer um bom trabalho, mas esta jornada ainda é longa. E, aparentemente, as ferramentas adotadas nesse processo vêm apresentando efeitos colaterais que estão sendo ignorados, mas que precisam ser solucionados. Pois a sensação que temos ao ter que ligar para algum SAC é próxima do desespero. Associamos à expressão (SAC) a perda de tempo e paciência, a estragar o dia, a sermos ignorados e tratados com desconfiança etc. Não associamos a nada de bom e nem à solução do problema. Caso contrário a sigla seria SSC – Serviço de Soluções para o Consumidor, pois atendimento não significa solução. Logo, não há comprometimento. Já telefonamos “armados”, pois temos a ciência de que estamos entrando numa batalha. Felizmente algumas poucas vezes temos uma boa surpresa, mas esta ainda é a exceção e não a regra.

É sabido que mesmo altos, os índices de reclamações nos PROCONs ou IDEC não retratam a realidade, uma vez que boa parte dos consumidores ainda não reclama porque o sistema não é simples, demanda tempo e burocracia.
No Brasil o telefone celular, que é um dos itens mais reclamados nos órgãos de defesa do consumidor (57% entre dezembro/08 e maio/2009 no Sistema Nacional de Defesa do Consumidor), é o mais caro da América Latina. Ou seja, pagamos mais por menos. Ouvi dizer que o setor estaria se organizando para perder a liderança neste ranking. Será que conseguem? Afinal estão tão acostumados a disputar a liderança, desconsiderando as necessidades do consumidor, que deve ser difícil trilhar o caminho contrário. É pagar para ver.

Segundo o IDEC, a Lei do SAC foi um avanço, mas o abismo entre a teoria e a prática ainda é grande. Existem longas esperas, recusas na informação dos históricos e/ou gravações, resistência aos registros de protocolos e principalmente o despreparo dos atendentes.

Recentemente adquiri um imóvel novo da construtora EVEN. Para minha grata surpresa os vizinhos, de forma independente, se organizaram em um Google Group. Passamos a nos conhecer virtualmente, trocamos informações sobre fornecedores indicados, possibilidades de pacotes para o grupo e questões do novo empreendimento. Vez ou outra sai algum atrito, como em reunião de condomínio quando os interesses se divergem, mas o saldo é positivo. A intenção do bem viver em comunidade é comum a todos e a discussão é sempre saudável na medida em que nos proporciona reflexões e novas visões. Mas a revolta com o SAC da empresa é geral!

A questão é que na EVEN, o único canal de comunicação é o SAC. Não temos uma pessoa X para falar sobre o assunto Y. São todos anônimos e se escondem na tecnologia. No mesmo dia em que escrevo este artigo(26 de julho), quando solicitei minhas gravações anteriores conforme determina a Lei de SAC, a atendente respondeu que só entregariam com autorização judicial. Criam a dificuldade para gerar cansaço, desgaste e desistirmos da questão. Vale lembrar que lá não sou somente consumidora, sou cliente também. Ocorre que o mercado imobiliário está tão aquecido, que nem precisam tratar bem o cliente. Conversando sobre este assunto com uma terapeuta, ela fez um comentário ótimo: “Nossa como eles são defendidos!”.

Logo, se eles precisaram se preparar para defesa é porque os ataques devem ser constantes. E de fato no nosso grupo, ainda virtual, as reclamações são muitas, fortes e delicadas, de cobranças indevidas, propaganda enganosa, necessidades de ações coletivas, qualidade da obra, atrasos de entregas etc.

Independente de quem tem razão, é interessante constatar que a tecnologia, que até bem pouco tempo era privilégio das corporações com seus CRMs cada vez mais desenvolvidos, promove também canais nos quais os consumidores podem também cada vez mais discutir, divulgar e se organizar conforme seus interesses. E ao que parece, as empresas ainda não sabem lidar com essa realidade das mídias sociais.

Tenho medo dos SACs exatamente por essas sensações ruins que nos causam. Hoje, após falar com a tal atendente robotizada, que afirmava que eu não havia recebido uma informação anterior que recebi, passei mal. Sim, os SACs além de tudo fazem mal à saúde. Não quero ser tratada como mais um número de protocolo. Quero relações mais qualificadas e humanizadas, afinal sou da espécie humana e não da robótica. Sou bem tecnológica para minha geração, mas acredito que tecnologia deve servir o humano e não o substituir. Não me refiro à tecnologia em si, mas sim ao tratamento desumano oculto nas entrelinhas.

Os SACs tiveram sua origem de forma espontânea em poucas empresas de visão, mas se tornaram uma obrigação com a legislação. A miopia corporativa gerou a confusão entre despesa e investimento. Quem pensa como investimento não apenas no discurso, pode trilhar um bom caminho, mas quem trata o assunto como despesa verificando apenas os cifrões, ou avaliando desempenho conforme a quantidade de atendimentos, pode estar alimentando os índices de insatisfação dos consumidores que se comunicam cada vez mais.

A terceirização dos SACs foi um excelente negócio para as empresas, mas não para o consumidor. Atendentes treinados não chegam perto da qualidade de conhecimento de um funcionário que responde pela empresa em que atua.  Além de integrado, este colaborador tem acesso aos colegas que podem esclarecer pontos nebulosos, trocar informações construtivas e contribuir com ideias que vão além das estatísticas. Enfim compreendem mais o processo com o aprendizado constante, aquele que supera qualquer treinamento. Tive a oportunidade de ter um SAC ligado a minha área quando fui gerente de comunicação em uma indústria de consumo. Nesta época, fiz a transição para terceirização por determinação da matriz e sei exatamente qual a diferença entre um modelo e outro. A vantagem está na atualização constante da tecnologia e custo. Mas não na qualidade do ponto de vista do consumidor.

Quem apresentará o tratamento para este efeito colateral?

Bem, de minha parte, acho que vou rezar... Qual será o santo que nos protege dos SACs? Acho que é o mesmo da comunicação, Santo Antonio. Mas, na dúvida, também vou pedir apoio a Santo Expedito.


Os artigos aqui apresentados n�o necessariamente refletem a opini�o da Aberje e seu conte�do � de exclusiva responsabilidade do autor. 2732

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