A comunicação do cuidado
Reunião de diretoria executiva. Tempo total do encontro: quatro horas. Nenhuma novidade até aqui, não é mesmo? Passemos então para a pauta. Item principal: “Segurança” - com três horas de conversa. Itens seguintes, com uma hora de discussão, os tradicionais sobre produção, vendas e resultados financeiros etc. Atenção, um detalhe importante. A aparentemente longa conversa sobre segurança não foi consequência de um acidente grave ocorrido na empresa, ok? Nenhum empregado ou profissional terceirizado morreu para que o tema tivesse este destaque no encontro da direção. É a prática da companhia. Uma empresa que diz: “segurança em primeiro lugar”. E cumpre a promessa.
A passagem acima é fictícia. Talvez exista, mas ainda não vi acontecer. Ao menos aqui no Brasil. Pode ser uma utopia? Quem sabe? Mas é dos sonhos que surgem os planos e a vontade de fazer, de tornar sonho em realidade. Nas campanhas de comunicação envolvendo o tema da segurança no trabalho eu tenho visto muito empenho de gestores na busca de uma mudança de hábitos, comportamentos. De influenciar a consciência, de criar modelos capazes de deixar a punição pura e simples para trás e incentivar a educação. Como estão fazendo isso? Comunicação.
Nada daquelas cartilhas com desenhos infantilizados de mascotes ou uma legião de banners pendurados pelas áreas de operação (e esquecidos ao lado de dezenas de placas de sinalização - num mar de informação inútil). Porque se a produção de peças de comunicação pudesse fazer a diferença, não teríamos tantos índices de acidentes de trabalho nas empresas brasileiras. Da mesma forma, se a fiscalização e a punição realmente funcionassem, nós não teríamos gente bêbada dirigindo e sendo multada permanentemente pela Polícia Militar e pelo Detran.
Daí a necessária “comunicação do cuidado”. Mas o que é isso? Mais uma expressão marqueteira? Será que inventei alguma coisa nova? Não, apenas uma releitura da comunicação corporativa e suas ferramentas disponíveis.
A comunicação do cuidado é, antes de tudo, um comportamento baseado no respeito à vida. Que vai além da entrega da informação. Que vai resgatar o viés educacional da comunicação para a mudança cultural. Numa opção consciente por valorizar a vida humana antes das coisas, das máquinas, da produção. E mais, antes mesmo do meio-ambiente. Porque meio ambiente só com tartaruga e urso panda vivendo num cenário sem gente, não vale.
Essa é a proposta. Um cuidar da nossa vida, cuidando da vida dos outros: na família, na comunidade, no trabalho. “Alô, Pollyana!” - dirão os mais austeros e sisudos gestores focados em resultados a qualquer custo – inclusive de vidas perdidas em acidentes de trabalho. Atenção, então, descrentes: o mundo está mudando a passos largos, corridos, velozes. Seja pela força da natureza – a poluição e as mudanças climáticas estão sob nossas cabeças. Seja pela conscientização de um número cada vez maior de consumidores e cidadãos. Com cobranças e mobilizações permanentes contra negócios perigosos que criam riscos à vida no planeta. Mobilizações em rede global com danos pesados para a reputação de marcas famosas.
Portanto, a comunicação do cuidado começa em casa. Na nossa casa e na segunda casa: nosso local de trabalho. Com atitudes mais seguras, em prol da saúde, de uma maior consciência nos atos, nas relações. O cuidado, por exemplo, na análise de projetos a serem construídos em áreas sensíveis como florestas, em alto-mar ou perto de mananciais de água doce. Ou inseridos, de uma hora para outra, na vizinhança de tribos indígenas ou comunidades tradicionais, quilombolas.
Um cuidar sincero em prol de uma maior qualidade de vida. Fruto de um olhar sistêmico, amplo e de uma comunicação dialógica permanente. Que começa com encontros, onde executivos do alto escalão organizacional passam horas conversando sobre a segurança das pessoas e depois vão conversar com as pessoas sobre segurança. E se colocam no lugar do outro para entender melhor pontos de vista alternativos, diversos. A comunicação do cuidado é integral.
Uma integralidade que começa no indivíduo, dele com ele mesmo, respeitando seu coração, seus limites. Percebendo seus sentimentos a fim de evitar um câncer ou um ataque cardíaco e percebendo-se com nodo de uma imensa rede de relações humanas. Cujo impacto na vida de um pode repercutir na vida de muitos. Difícil? Muito.
Mas também simples. A comunicação do cuidado é na verdade a humanização das relações num movimento permanente de aprendizado para a formação de uma nova consciência. O construir de uma biocivilização. Onde a vida não tem preço. Num movimento valioso para o bem das pessoas, o bem do planeta e para o bem dos negócios. Os negócios “do bem”.
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