A sétima conferência do Ciclo Era Digital trouxe ao Brasil o sociólogo italiano Andrea Miconi para tratar do tema “Ponto de virada: a sociedade em rede”. A última edição de 2009 aconteceu no SESC Avenida Paulista no dia 11 de dezembro, e ainda contou com a mesa-redonda “A cultura das redes: tecnologia e colaboração”, com quatro convidados. O evento teve transmissão simultânea pela internet.
Andrea Miconi é pesquisador de comunicação digital e ensina Sociologia da Comunicação na Università IULM de Milão, onde também coordena o Master Universitário em Management dos Processos Criativos. Foi também professor de Teoria e Técnicas da Comunicação de Massa na Università di Padova até 2008. Formado pela Università “la Sapienza” de Roma, fez lá também o seu doutorado em Ciências da Comunicação. Participou de conferências, workshops e convênios em várias Universidades italianas e estrangeiras, entre elas Stanford University, USP, Belas Artes e Universidade de Waseda em Tóquio. É autor de vários artigos e livros, entre os quais “Una Scienza Normale” em 2005 e um capítulo da obra “Do Público para as Redes”, organizada por Massimo Di Felice em 2008.
Para o pesquisador, é possível perceber a mudança de paradigmas na sociedade, indo de uma fase mais organizada para outra de mutação permanente. Ele cita Manuel Castells para usar a terminologia “sociedade em rede”, onde a socialização é horizontal e não mais vertical, e onde havia a institucionalização das universidades, famílias, empresas ou igrejas como estruturas verticais surge um novo modelo de interação e autoridade. A construção da informação independe de hierarquias preestabelecidas e isto faz uma profunda mudança na geometria do poder, com um forte teor inclusivo quando tendencialmente os conhecimentos das pessoas se conectam. Agora, a preocupação com as diferenças de acesso entre camadas da população cede espaço para um novo embate: não se trata mais de estar ou não conectado, mas a que velocidade e portanto apto a visualizar que tipo de conteúdo.
Existe agora um espaço de fluxos, global e novo com experiências do centro para a periferia, criado pela sociedade em rede. As pessoas que não conseguem entrar neste salto histórico acabam agarrando-se no que está em volta, no seu território e raízes, em reação à suposta subtração de identidades desta interconexão. Há uma rachadura sobre como pensar o mundo, não geográfica ou ideologicamente, mas do nível de compreensão e participação nos fluxos. Miconi reconhece que os pesquisadores no tema enfrentam alguns impasses ou “curto-circuitos”, porque não se pode isolar o objeto de estudo, ao contrário vive-se imerso nele. Daí que menciona que “construir conhecimento seguro hoje é muito complexo e pouco plausível no mundo de hoje”.
O sociólogo pondera que ninguém pode apontar o nível de saturação da rede, ao contrário da penetração de alguns bens na sociedade, como aparelhos celulares ou refrigeradores, que tendem à exaustão, e isto acentua a urgência de pensar e fazer estudos e aplicações agora. De outro lado, todos terem conexão à internet não significa deterem o mesmo conhecimento e desenvoltura. Superado o problema do “gap digital”, ainda é preciso pensar na operação dos processos e na qualidade do aproveitamento da colaboração.
Sobre o poder, a partir de Foucault, ele identifica duas correntes de pensadores. A primeira aposta que o poder ainda existe e, mesmo que as mudanças da rede sejam grandes, não conseguem demover os protagonistas tradicionais. A segunda entende a rede como estrutura horizontal que vai derrubando hierarquias. Com diferenças em alguns pontos de argumentação, teóricos como Lévy, Castells e Jenkins aceitam a existência de uma transição diante da constatação do múltiplo protagonismo na geração e difusão de conteúdos. As pessoas formariam tribos em um panorama livre, democrático e participativo. Para Miconi, as duas propostas estariam erradas, porque por um lado não se pode negar que o esquema de funcionamento da sociedade mudou, mas por outro lado a nova estrutura social que subverteria o poder não é clara e é de difícil rastreabilidade, com regras que nascem na própria rede. Ele postula que a rede é um sistema de conexões entre pessoas invariavelmente com algum tipo de postura política, e por isto com negociações permanentes de interesses. “O poder, portanto, ainda existe, ainda que possa não ser como antes”, completa. O acordo do Google com o governo chinês para fazer a exclusão completa de qualquer menção ao Tibet nos resultados das buscas é um exemplo do desequilíbrio que existe mesmo na rede. O próprio Google, numa análise do pesquisador, será cada vez o motor de busca mais poderoso, e afinal dentro de leis de mercado alguém sempre tem que “ganhar o campeonato”, e as oportunidades que pareceriam ser iguais, mostram-se diferentes.
Todos os nós de conexões entre pessoas parecem uma constelação igualitária, mas não seriam porque conectam diferentes grupos em diferentes intensidades e usos. Para o palestrante, na morfologia das redes haveria motivos para um ser mais forte que outro, ainda que seja mais difícil verificar. Miconi rebate a opinião de Castells de que o “gatekeeping” não precisaria mais existir, acreditando isto sim que os motores de busca são uma nova porteira – papel antes desempenhado pelos jornais com as notícias editadas.
A mesa-redonda “A cultura das redes: tecnologia e colaboração” teve a participação de Pedro Markun (Jornal de Debates), Felipe Fonseca (MetaReciclagem), Caio Braz (Oasis Santa Catarina) e Massimo Di Felice (Atopos, ECA), em mediação de Mariana Marchesi, do Centro de Pesquisa Atopos da ECA-USP, além da presença do próprio Miconi.
Ciclo - Iniciado em agosto, o Ciclo Era Digital – A sociedade em rede e as transformações do mundo contemporâneo, já contou com as presenças de Pierre Lévy (agosto), Derrick de Kerckhove e Massimo De Felice (setembro), Lucia Santaella (outubro) e Michel Maffesoli (novembro) e Mário Perniola (dezembro). A ideia foi reunir os principais pensadores internacionais para discutir os desafios, os impactos e as profundas mudanças nos meios de comunicação com empresários, acadêmicos, líderes sociais, ONGs e público geral. Desafios como exclusão digital e desigualdade de acesso às novas tecnologias também serão tratados pelos convidados de modo a apresentar caminhos para a construção de uma sociedade mais democrática, inclusiva e sustentável.
O ciclo foi uma idealização do Centro de Pesquisa Atopos da ECA-USP, realizado por Aberje, Sator Eventos e Sesc São Paulo, contando com o apoio institucional da Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo. Os temas vão continuar sendo debatidos no blog http://www.cicloeradigital.blogspot.com, pensando inclusive na construção de uma nova edição do evento.
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