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Tatiana Maia Lins
tmaialins@makemake.com.br

Consultora em Reputação Corporativa, fundadora da Makemake, empresa com foco em Reputação Corporativa, Planejamento de Comunicação, Engajamento de Stakeholders, Edição de Conteúdo e Reporte de Sustentabilidade.

Professora de Gerenciamento de Reputação Corporativa em cursos de extensão e in company, desenvolveu um método de diagnóstico de percepção de imagem corporativa baseado em Análise de Discurso e Semiótica, que permite à empresa descobrir os gaps entre a imagem e o posicionamento pretendido e a realidade. Desse modo, os pontos sensíveis são trabalhados de maneira mais focada com cada stakeholder e o posicionamento desejado é mais rapidamente alcançado.

Mestre em Jornalismo Internacional pela University of Westminster, em Londres, Tatiana tem MBA em Gestão Empresarial pela FGV-RJ e Pós-Graduação em Comunicação Integrada pela ESPM-RJ.

Como a nossa Ditadura foi noticiada no exterior

              Publicado em 03/04/2014
 
O aniversário de cinquenta anos do golpe militar não merece comemoração. Não o comemoraremos. De todo modo, falarei sobre como os Anos de Chumbo no Brasil foram noticiados pela imprensa inglesa para retomar uma discussão antiga: o papel da mídia na criação da imagem que as populações fazem acerca de fatos, sejam eles históricos ou não. 
 
No caso da cobertura sobre os anos de 1964 a 1985, no Brasil, o que foi dito pela mídia inglesa era importante pelo papel de destaque que a Inglaterra sempre possuiu como disseminadora de pautas para o mundo, sobretudo para os jornais europeus. Na era “AI” (Antes da Internet), os jornais locais eram as principais fontes de informação para a população sobre o que estava acontecendo pelo mundo. O que foi dito pelos jornais ingleses foi a única fonte de informação sobre o que acontecia no Brasil para grande parte de seus leitores. E, portanto, os jornais foram responsáveis por fornecer insumos para a decodificação da realidade brasileira pelos seus leitores. Quanto mais imparcial tivesse sido a cobertura, maior teria sido a chance de os leitores compreenderem a “verdade verdadeira” e não a “verdade verde” dos militares.
 
Até 2002, quando conclui o meu mestrado, ninguém tinha ainda analisado o que os jornais ingleses haviam publicado sobre os anos em que os militares estiveram no poder no Brasil. Minha pesquisa levantou como três dos principais jornais diários ingleses abordaram o que vinha acontecendo aqui. 
 
A cobertura apresentada por cada jornal evidenciou suas visões históricas e políticas. Para o Times, a ditadura foi a salvação para o Brasil contra o comunismo. Para o Guardian, ela trouxe prisões e censura. Este jornal tentou ser independente do ponto de vista político, mas ainda se deixou influenciar pela ideologia americana da Guerra Fria. Já para o Daily Mirror nada de muito importante estava acontecendo fora da Inglaterra.
 
A palavra ditadura foi usada em um único título para descrever o regime implantado no Brasil. Foi pelo Guardian, em 17 de dezembro de 1968. Foi também o Guardian que publicou o único título contendo a palavra tortura, em 15 de abril de 1964. Menções à censura - a própria palavra censura, censor ou imprensa livre estiveram presentes em quatro títulos. Dois do Guardian, dois do Times. Os militares no poder foram descritos como presidente em três títulos, e em nenhum como ditadores. Já a palavra exílio foi repetida em cinco títulos.
 
Apesar de relativamente longa, a cobertura sobre o que acontecia no Brasil não se aprofundou. Foi basicamente costurada com despachos do governo ou material previamente publicado ou transmitido pelos veículos de comunicação brasileiros. Não houve nenhuma fala de pessoas comuns, do "povo", em nenhuma das 66 matérias que analisei, todas sobre o País ou pessoas da elite brasileira.
 
Não houve nenhuma matéria de aspecto ou interesse humano sobre a implantação da ditadura no Brasil. Não foi descrito como o golpe mudou as vidas dos brasileiros ou o que acontecia com as pessoas exiladas. Também não houve nenhuma entrevista com nenhuma das partes envolvidas no processo. Nenhum pedido de justiça para os que estavam sendo presos contra a lei. Não é preciso dizer que também não houve nenhum relato real de pessoas sendo torturadas pela polícia.
 
É uma grande pena que a mídia inglesa tenha falhado na cobertura dos Anos de Chumbo no Brasil. Assim como é uma grande pena ver a nossa mídia e a mídia de todos os países falhando cotidianamente ao narrar nossas histórias de modo tão superficial. A boa notícia é que não dependemos mais (apenas) dos veículos de comunicação para ter acesso à informação sobre os quatro cantos do mundo. Hoje cada pessoa tem ferramentas e empoderamento para ser um “jornal”. Viva a tecnologia! 
 

Para quem tiver interesse no assunto, um resumo mais detalhado da minha pesquisa para a dissertação de mestrado foi publicado pelo Observatório da Imprensa, aqui.  


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