O Museu do Louvre, o “museu dos museus”, o mais visitado do mundo, abriu-se à inovação e à modernidade. Criou um novo museu, uma “antena” fora de Paris, uma porta aberta para o futuro – um museu experimental e imperdível, que merece ser visitado.
O Louvre-Lens, o novo museu do Louvre inaugurado em dezembro de 2012, encerra um misto de tradição e modernidade. Situado em Lens, cidade localizada em Nord-Pas de Calais, considerada uma das regiões de maior vitalidade cultural da França, fica na confluência entre a Bélgica, a Grã-Bretanha e a Alemanha. É, sem dúvida, um gesto de ousadia da França no coração da Europa.
Segundo a definição de seu criador, o ex-diretor do Louvre Henri Loyrette, “Louvre e Lens: são dois nomes conectados a partir de agora, quase fundidos, destinados a cumprir o destino comum de servir arte e beleza ao público”.
Criado no século XIX e dotado de um dos acervos mais expressivos do mundo, o Museu do Louvre nasceu com a missão de compartilhar os tesouros da Nação com as diferentes regiões da França. Em 2003, o Ministro da Cultura da França decidiu potencializar esta ação e lançou um concurso que buscava propostas de diferentes regiões da França para sediar um novo Louvre. Somente a região de Nord-Pas de Calais apresentou-se como candidata, oferecendo cinco cidades, dentre as quais Lens foi a escolhida, pelo então presidente da República Francesa, para receber o novo museu.
Em 2005, um concurso internacional escolheu o escritório japonês de arquitetura SANAA para projetar o edifício, que se caracteriza por ser pleno de vidro e de luz, com espaços orgânicos e fluídos, sempre interligados, como se fossem ilhas de um mesmo oceano. Ao se chegar ao Louvre-Lens, a visão é lunar, etérea, uma névoa de harmonia e contemporaneidade a encerrar um tesouro milenar.
Internamente, o Louvre-Lens é uma ode à modernidade, uma vitória da experiência profissional sobre a criatividade vazia ou exacerbada. O equilíbrio e o bom senso estruturam o museu, ou seja, só um museu experimentado como o Louvre poderia ousar com segurança e produzir um novo museu-experimento, povoado de inovação, sem torná-lo banal. Há densidade e competência nas mínimas decisões que foram tomadas, nos partidos adotados, nas soluções encontradas.
A transparência não se limita ao edifício – com ela nos deparamos também nos programas e nas ações. É permitido ao público compreender o que é um museu, como ele funciona e para quê. Uma reserva técnica e um laboratório de restauro revelam-se ao visitante, mostrando clara e abertamente como o museu guarda e protege seu acervo, para emocionar e encantar o seu público.
E este público corresponde ao gesto genuíno e generoso do museu, o que se evidencia na cacofonia das línguas, na pluralidade das visitas, transformando o Louvre-Lens no ponto de encontro de amigos, no refúgio seguro de famílias, no espaço de pesquisa, inovação e fruição. Milhares de pessoas povoam este museu diariamente, num afago consciente que referenda os recursos públicos que ali foram investidos.
A Grande Galeria do Tempo, a exposição de longa duração que encerra as obras-primas do Louvre, é aberta, espaçosa e parece acolher milhares de pessoas com a leveza de quem convida um só amigo a entrar, visitar o museu e se servir das obras ali expostas. O segredo deste espaço museal é a expografia fluida e livre que, com competência, evita os gargalos que determinariam as intermináveis filas de visitantes; ao mesmo tempo, distribui cuidado com a segurança das obras e do público, acessibilidade e, na essência, ainda apresenta o melhor da arte universal.
Nesta galeria, dois elementos quase antagônicos marcam o tempo, garantindo universalidade à visita. No alto, à direita, ocupando os seus 2 mil metros quadrados, uma inexorável linha do tempo pontua a entrada em cena das obras-primas expostas. É possível ao público visitante, num só dia, percorrer livremente milhares de anos, descobrindo obras emblemáticas de cada período e de diferentes culturas. Se o percurso é inebriante e conduz o visitante às maravilhas dos milênios e dos séculos já transcorridos, nas mãos o visitante sustenta o mediador contemporâneo. Um objeto branco, lúdico, que apresenta a mesma galeria em 3D, ressalta cada obra exposta, a sua relação com a vida, com o tempo e com a cultura que a criou. Um espetáculo de tecnologia associado ao que há de mais sublime da arte universal transforma-se numa visita inesquecível. Assim o Louvre-Lens se abre a cada visitante como um território acessível, a ser descoberto em roteiros temáticos optativos, lançando novas estratégias que lhe permitem conhecer e atender seu público com transparência e competência, neste novo século.
O novo Louvre-Lens nos mostra que até mesmo as estruturas mais tradicionais, como o próprio Museu do Louvre, podem inovar e se reinventar a cada dia. Basta coragem!
O próprio Louvre jamais será o mesmo após o Louvre-Lens. O novo museu universal revela a todos a Galeria do Tempo, aquela “longa e visível progressão da humanidade” que, como dizia o escritor francês Charles Péguy, caracteriza o Louvre, oferecendo novas chaves de percepção para o visitante.
Chove lá fora, é hora de encerrar a visita, retomar a navette gratuita que leva à Gare de Lens, para pegar o trem e retornar a Paris.
Reserva técnica do Louvre-Lens (Foto: Maria Ignez Mantovani Franco)
Mesas interativas no Louvre-Lens (Foto: Maria Ignez Mantovani Franco)