Ano 8 Nº 27 2º Trimestre de 1998 |
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As comemorações do cinqüentenário da Chesf, em março, quase vão por
água abaixo não fosse uma corajosa e animada ação de comunicação. por Carlos Augusto Costa e Neyde Conde (*) Como uma área de comunicação pode, em uma situação de crise, vislumbrar novos caminhos e novas alternativas? Como motivar o pessoal envolvido e garantir que os cronogramas sejam cumpridos? Como dar a volta por cima e conseguir implementar, com sucesso, uma meta previamente estabelecida? Essas são questões que precisam ser resolvidas especialmente frente a situações que nunca se imaginou pudessem ocorrer. Um belo dia, depois que todas as ações já foram planejadas e milimetricamente programadas, ocorre um imprevisto que faz ruir quase tudo o que se concebeu. Como agir, então? A Chesf - Companhia Hidrelétrica do São Francisco é a maior empresa do Nordeste e a
mais antiga do setor elétrico brasileiro, com mais de 6 mil empregados espalhados em 8
Estados e faturamento anual de 1,5 bilhão de reais. Por quase um ano a companhia vinha
preparando as festividades de comemoração de seus 50 anos de atividades, completados em
1998. Formou-se uma comissão composta por representantes de diversas áreas, com o
objetivo de pensar e elaborar uma programação para o jubileu de ouro da Chesf. Dentre os
vários eventos listados, o destaque maior foi dado às comemorações de 15 de março -
data da criação da empresa -, realizadas em na usina de Paulo Afonso (BA), berço da
companhia. A escolha de Paulo Afonso como cenário para a realização de uma festa deste porte se
deveu a dois motivos: por ser a cidade o berço da empresa e em decorrência do projeto
que a Chesf vem desenvolvendo nos últimos cinco anos, com o objetivo de transformar a
região num pólo de ecoturismo. O ciclo de construção de grandes barragens se encerrou
com a finalização da Usina de Xingó e, sendo assim, seria preciso alterar a matriz
socioeconômica da região, sob pena de não se poder garantir a geração de renda
suficiente para manter a população em seu local de origem. Estava em curso o evento que iria marcar para sempre a Chesf e a cidade de Paulo Afonso. Pela primeira vez na história da cidade as instalações da usina seriam franqueadas ao público à noite, e a maior atração seria um raro espetáculo de beleza, com a iluminação completa da cachoeira de Paulo Afonso. Ao fundo, a Orquestra Filarmônica Norte-Nordeste tocaria Gonzaguianas, Bachianas e a "Abertura 1817". Para finalizar o espetáculo, foi preparada uma grande queima de fogos de artifício. Além de todo o espetáculo cênico, vários convênios estavam sendo preparados para serem assinados durante o dia pelo ministro de Minas e Energia e vários governadores do Nordeste, juntamente com os presidentes da Eletrobrás e da Chesf. A cidade inteira estava mobilizada para o grande evento. Tudo pensado em seus mínimos detalhes. Até um plano de contingência foi desenvolvido. Faltou pensar, porém, que o 15 de março era época também bastante propícia para manifestações de dentro e de fora da Chesf. O público interno estava mobilizado em fazer uma grande festa. O público externo, mais especificamente os trabalhadores rurais reassentados de Itaparica, encontraram um perfeito momento para deflagrar um movimento pela conclusão das obras do reassentamento. O dia escolhido para a manifestação foi 11 de março, quando cerca de mil pessoas tomaram as ruas de Paulo Afonso e, aos poucos, as dependências da Chesf. No segundo dia de manifestações, alguns funcionários da companhia foram tomados como reféns e o prédio administrativo usado como apoio ao movimento. Em outubro de 1997, o governo federal constituiu o Gerpi - Grupo Executivo para a Conclusão do Reassentamento de Itaparica. Desde aquela data, a Chesf não era mais a responsável direta pela continuidade das obras do reassentamento e não tinha mais a responsabilidade pelas negociações junto ao movimento. Com a manifestação, a batalha da informação foi iniciada. A Chesf fez chegar aos órgãos competentes do governo federal as devidas informações e, de imediato, o Gerpi foi acionado. Naquele momento, a Chesf sozinha nada ou muito pouco podia fazer. Desde 11 de março, a CER, responsável pelas informações, viu-se em pleno fogo cruzado. Aos jornais cabia a divulgação da informação isenta, mas isso nem sempre ocorreu. O fato de para a área de conflito terem sido deslocados jornalistas sem um conhecimento mais amplo da questão, levou a Chesf a trabalhar dobrado. A cada momento novas informações surgiam e a companhia tinha de fornecer os dados os mais consistentes possíveis, no menor espaço de tempo. O retardamento de uma informação poderia ser fatal e, por isso a batalha foi violenta. Era preciso prover os jornalistas que estavam cobrindo o movimento de dados concretos, e que mostrassem o absoluto interesse da empresa em ver a questão resolvida. Em 12 de março, a Chesf entrou na Justiça com um mandato de reintegração de posse e, ao mesmo tempo, com uma denúncia de cárcere privado. A promotora de Paulo Afonso foi ao local e alertou os líderes do movimento que eles poderiam ser processados caso tal fato ocorresse. O clima começou a ficar tenso e complicado. A diretoria da Chesf, por não poder garantir a segurança devida e necessária aos seus convidados, cancelou a vinda das autoridades que iriam participar das festividades comemorativas dos 50 anos. Foi cancelada a participação de mais de 60 jornalistas de todo o país. A cobertura ao vivo pela Radiobrás foi mantida, assim como a transmissão direta para várias emissoras de televisão. Afinal seria um evento inédito e que deveria ser mostrado para todo o Brasil. Enquanto isso, era preciso manter as equipes responsáveis pelas obras e organização do evento mobilizadas e continuamente em ação. Foram realizadas reuniões permanentes para energizar as equipes e repassar as últimas informações. O desejo de concretizar um sonho coletivo era mais forte que qualquer coisa. Foi no veio deste sentimento que se conseguiu encontrar motivação e força de vontade para seguir com o trabalho. As equipes trabalhavam dia e noite para aprontar todos os detalhes. A cada dia a cidade ficava mais bonita. O pessoal da iluminação foi chegando, o pessoal do som tomando posição e iniciando as instalações, tudo conforme programado. Ao mesmo tempo o movimento continuava avançando. A possibilidade concreta do cancelamento toda a cerimônia começava a ficar evidente. A cada hora que passava, o receio de não se chegar a uma conclusão, ou a uma proposta que atendesse a ambas as partes, batia fundo em cada um. Afinal, foram meses de trabalho: muita dedicação e muita energia estavam sendo alocados para a cerimônia. A cada dia, contraditoramente à tensão suscitada pelo movimento, as instalações da usina e a cachoeira ficavam mais bonitas. Era enorme, entre os funcionários da Chesf, a vontade de ver tudo acontecer conforme planejado. O mote da campanha interna da companhia - "Quem domina o rio vence qualquer desafio" - foi fundamental para levantar o moral e garantir o engajamento de todos. Naquele momento tenso, Mozart de Siqueira Campos Araujo, presidente da Chesf, detectando que a situação se agravara, resolveu se envolver pessoalmente na resolução do conflito. Em reunião com os demais diretores, iniciou a abertura das negociação. Para tanto, seria preciso que os manifestantes cumprissem uma única exigência: os prédios ocupados deveriam ser liberados imediatamente. Após a liberação, dois diretores se deslocariam até Paulo Afonso para iniciar as conversações. A demonstração de busca de uma solução negociada foi aceita pelo movimento e os prédios da companhia foram finalmente liberados. No dia 13, ocorreu a primeira reunião entre a Chesf e os representantes do movimento. A partir dessa reunião e do compromisso do governo federal em alocar, em 1998, mais 169 milhões de reais no projeto do reassentamento, o movimento dos reassentados começou a se desmobilizar. Na madrugada de 14 para 15 de março, o movimento levanta acampamento. A batalha na imprensa, por sua vez, foi vencida com muita organização e planejamento. Todas as informações foram centralizadas pela CER. Um canal único de contato com o público externo foi fundamental para se garantir coerência, credibilidade, rapidez e transparência nas informações divulgadas. A meta era fornecer todas as informações necessárias e requisitadas pelos jornalistas. Na noite de 15 de março de 1998, a Cachoeira de Paulo Afonso foi, pela primeira vez, aberta e iluminada em meio a um show de luz e cor jamais visto, ao som da Orquestra Filarmônica Norte-Nordeste - um evento que encantou cerca de dois mil convidados. Mais uma vez ficou constatado que "Quem domina o rio vence qualquer desafio". Diante de todo o processo de crise vivido pela Chesf, alguns pontos merecem reflexão. O envolvimento pessoal do presidente na busca da resolução do problema, garantindo assim que a empresa estivesse realmente querendo resolver a questão, foi de fundamental importância não só para as equipes que estavam trabalhando como para os próprios reassentados. Este ato deu credibilidade à negociação. Fazer chegar rapidamente aos órgãos competentes do governo federal as informações necessárias para uma rápida tomada de decisão, foi crucial para que se obtivessem respostas imediatas às solicitações dos reassentados, minimizando assim o conflito. Reuniões periódicas com as equipes, para passar informação e acompanhar o andamento dos trabalhos, contribuíram efetivamente para que todos conhecessem o andamento das negociações e se mantivessem engajados no que estava acontecendo durante o movimento, além de garantir a integridade dos cronogramas. A existência de um mote, de um lema, foi de grande importância para motivar o pessoal. Por fim, a transparência, a velocidade, a organização e o planejamento no trato das informações a serem divulgadas para a imprensa desempenharam papel decisivo. Neste particular, a centralização foi imprescindível, pois possibilitou a total coerência dos dados repassados. Do episódio aqui relatado é possível tirar lições importantes. Mesmo em situações de crise, em meio a uma forte tendência de perda do controle, de descrença e de falta de motivação, se houver planejamento, uma fonte energizadora, transparência nas informações e, acima de tudo, um mote associado a uma meta, com toda a certeza a crise será superada. Foi o que ocorreu na Chesf, onde a comunicação é tratada como deve: uma área estratégica da companhia.
(*) Carlos Augusto Costa, engenheiro eletrônico, foi superintendente de Informática da Chesf e é coordenador de Relações Institucionais da empresa; Neyde Conde é jornalista e assessora de imprensa da Chesf. |
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