Ano 8 Nº 28 3º Trimestre de 1998 |
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Encontro internacional promovido pela Aberje debate tendências da
comunicação e funda entidade que reúne povos de língua portuguesa. "Comunicação Globalizada e Cultura
Organizacional" foi o tema central do 1º Congresso Internacional de Comunicação
Empresarial e Corporativa, promovido pela Aberje em 4 de agosto, em São Paulo. O
encontro, consumado em cinco sessões de trabalho, precedeu a entrega do Prêmio Aberje
São Paulo 1998 e serviu para oficializar a constituição da ACELP - Associação de
Comunicação Empresarial Língua Portuguesa. Às 9h08 o presidente da Aberje, Ruy
Altenfelder, declarou aberto o Congresso e deu o mote das discussões que se seguiriam:
"Comunicação, temos insistido a cada dia, é área estratégica de resultados. Não
é uma panacéia, mas uma ciência com princípios próprios", disse. Em seu
pronunciamento, Altenfelder citou matéria da revista Carta Capital, que demonstrava ser
as companhias mais admiradas as que têm a melhor política de comunicação. Mencionou o
movimento de internacionalização da Aberje em direção ao Mercosul e aos povos de
língua portuguesa, saudou a constituição da ACELP e homenageou Vítor Baltasar,
primeiro presidente da nova entidade. Vítor Baltasar é presidente da Associação
Portuguesa de Comunicação de Empresa (APCE), entidade que, junto à Aberje, vem
trabalhando desde meados de 1997 para a formação da Associação de Comunicação
Empresarial dos Povos de Língua Portuguesa. A nascente associação, inicialmente formada
pela Aberje e pela APCE, tem como uma de suas metas congregar, até 2000, entidades
congêneres e profissionais de todos os países lusófonos - Cabo Verde, Guiné Bissau,
São Tomé e Príncipe, Angola, Moçambique, Goa e Timor Leste "A Aberje e a APCE
propõem-se construir um novo espaço comunicacional que, para além das atividades e
ações que se concretizem na persecução dos objetivos da ACELP, têm algo de comum,
muito profundo, que vem das raízes do nosso ser: a língua em que falam, em que pensam,
em que amam", disse Vítor Baltasar. "Por intermédio da ACELP, brasileiros e
portugueses promoverão estudos de temas ligados à Comunicação Empresarial de língua
portuguesa por meio de conferências, simpósios, certames e publicações, além de
pesquisas de caráter social, econômico e político que venham a contribuir para o
aperfeiçoamento da Comunicação Empresarial."
Após a constituição solene da ACELP, foi instalado o primeiro painel do Congresso
Internacional de Comunicação Empresarial e Corporativa - conduzido por Jaime de Piniés,
managing director do Santander Investment e diretor de Comunicações do New York Banco
Santander, que discorreu sobre o tema "Comunicação globalizada frente à
identidades, marcas e missões locais e regionais". A mediação foi de Paulo Nassar,
secretário-executivo da Aberje. O Banco Santander está em 36 países, é o maior banco
internacional com atuação na América Latina e tem presença crescente na Ásia e na
Europa do Leste. No Brasil, operam o Banco Santander Brasil e o Banco Santander Noroeste,
além do banco de investimento, com 7.300 funcionários. A instituição tem ativos
globais de 181 bilhões de dólares e obteve resultado de 535 milhões de dólares nos
primeiros seis meses de 1998 - um retorno de 23,5% sobre o patrimônio líquido. Com 73
mil empregados, o Santander está entre as vinte casas bancárias mais capitalizadas do
mundo. De acordo com Piniés, os objetivos da comunicação do Santander vinculam-se ao
fortalecimento de sua imagem e reputação como corporação global de forte presença
regional e local, à obtenção de resultados sempre melhores e à geração de valor para
os acionistas. Essa estratégia implica a produção de mensagens diferenciadas para
públicos locais, regionais e global, além de mensagens específicas do banco de
investimentos. De ponto de vista local, o Santander aspira ser líder no mercado onde
atua. Sua intenção é promover uma cultura caracterizada pelo conservadorismo na
concessão de crédito articulada com agressividade em suas políticas comerciais. O foco
de sua comunicação é o cliente e seu pressuposto é manter compromisso com a
transparência. As mensagens regionais visam obter o cumprimento das metas estabelecidas,
promover vendas cruzadas e ampliar o leque de oportunidades de negócios. A mensagem
global, por sua vez, é marcada por um forte investimento em conhecimento, pelos
compromissos éticos com o mercado e com a comunidade e pela máxima potencialização de
valor para os acionistas. A comunicação para o Brasil está centrada em Nova York, de
onde se coordenam as ações destinadas aos mercados emergentes latino-americanos. "A
função da comunicação é ser bem organizada e centralizada: não se pode
dividi-la", disse Piniés. Quanto ao compromisso com a transparência, Piniés
afirmou que "os bancos europeus em geral são fortes mais muito calados". Até
dois anos atrás, a comunicação do Santander era muito centrada em informação
financeira. Mas uma pesquisa revelou que havia um gap entre o valor econômico real do
banco e seu valor percebido pelo mercado. Diagnosticou-se, então, no início de 1997, a
necessidade de perseguir uma maior transparência junto aos públicos de interesse do
banco. Em função disso montou-se um plano estratégico e uma campanha agressiva de
comunicação. O sucesso da ação veio rápido e foi constatado em abril de 1998, quando
a cotação das ações do banco negociadas em bolsas subiu notáveis 205%. O Santander
quer crescer na Espanha e aumentar a presença na América Latina. Segundo Piniés, a
comunicação interna é peça-chave nesse avanço. "Queremos garantir que todos os
empregados saibam das notícias, se não antes, pelo menos junto com os jornalistas",
afirmou. Ainda assim, é óbvio que uma instituição financeira precisa cuidar da
confidencialidade de determinadas informações. "Não dá para comunicar tudo,
senão estaremos fora do mercado no dia seguinte." A lógica do mercado, de acordo
com Piniés, aponta para o oferecimento de maiores e mais variadas opções ao cliente,
"e o Santander está bem posicionado para isso". Para o palestrante, a função
e a eficácia da comunicação "não estará bem posta se não estiver conectada com
a cúpula" da organização. "Em 1997, o mercado nos via de uma forma que não
era a nossa", afirmou. Para mudar esse quadro, "a primeira grande ação de
comunicação foi convencer a cúpula do Santander". Uma ação coroada de êxito,
pelo o que se pôde ver. Comunicação é uma ciência A segunda sessão de trabalho foi conduzida por Howard G. Paster, presidente mundial da Hill&Knowlton Worldwide, empresa do grupo WPP, que falou sobre "Comunicação globalizada frente às identidades, marcas e missões locais e regionais", com mediação do professor-doutor Mitsuru Yanaze, coordenador do pós-graduação da Faculdade de Comunicação Social Casper Líbero. "Acreditamos que a comunicação empresarial vai continuar crescendo tanto em porte como em sofisticação", afirmou Paster, que coordena a operação de 31 escritórios da Hill&Knowlton espalhados pelos cinco continentes. No cenário brasileiro, o ambiente para esse crescimento está construído em torno de uma economia forte, uma imprensa livre e um governo democrático. "Estamos falando sobre uma função da administração que mantém a comunicação da organização com todos os seus públicos - empresas, ONGs, entidades, acionista, parceiro, fornecedor, consumidor, comunidade e mídia." Paster acredita na comunicação como uma prática corporativa, que será tanto mais eficiente quanto mais a alta administração entendê-la como um esforço conjunto e único de toda a organização. "Só se poderá ter um plano de comunicação eficaz quando concebido e coordenado a partir de pesquisa, de marketing direto e de relações com a mídia, todas essas disciplinas unificadas para benefício mútuo", afirmou. Segundo ele, "uma das atribuições mais dramáticas dos líderes é a responsabilidade de administrar a reputação de uma empresa". E, nesse caso, a comunicação é um insumo básico. "Empresas que têm uma boa comunicação têm resultado melhor." Ao entenderem a comunicação empresarial como guardiã da reputação da organização, os empresários passam a aplicar e praticar conceitos e comportamentos de cidadania corporativa. E isso inclui ações importantes de valorização da marca, "que é uma aura de valor em torno da companhia". Quanto mais preservados esses valores, maior será a proteção contra as crises. Paster ressaltou a necessidade de deixar claro ao funcionário o seu papel de custodiante da marca. "Muitas vezes essa função é delegada aos profissionais de recursos humanos, mas a responsabilidade da comunicação não é de quem treina pessoas", disse. Para ele, uma boa estratégia deve observar alguns princípios-chave, a saber:
Projeção para o futuro Após o intervalo para o almoço, as atividades do Congresso Internacional de
Comunicação Empresarial e Corporativa foram retomadas com a sessão de trabalho que
reuniu Guilherme Bettencourt, presidente da Xerox do Brasil, e Luís Antônio Vargas,
superintendente de Comunicação Institucional da Petrobras, cujas intervenções derem-se
em torno do tema "Os modelos de comunicação corporativa de empresarial no ambiente
de privatização, públicos e demandas de qualidade total", com mediação de Paulo
Nassar. A Xerox do Brasil tem seis mil funcionários, 53 escritórios e quatro fábricas
em operação no país. É a terceira maior operação mundial da Xerox Corporation no
mundo, atrás apenas da americana e da japonesa. Sua política de comunicação visa
basicamente o mercado e o cliente. Bettencourt historiou a mudança operada na Xerox a
partir da instauração, em 1992, de uma política de comunicação denominada
"Portas Abertas", segundo a qual a imprensa e os jornalistas passaram a ser
considerados pela companhia como clientes - e que, portanto, deveriam ser bem atendidos.
As relações da companhia com a imprensa já se tornaram paradigma entre as empresas com
presença no país. Já para os clientes comerciais, a Xerox desenvolveu o programa
"Anjo da Guarda", que promove a comunicação entre o funcionário e o usuário
de seus produtos e serviços. Nesse programa, cada novo cliente da empresa é contactado
por um funcionário, dois ou três dias depois da instalação do equipamento. Duas
pesquisas anuais de satisfação medem a eficácia desse procedimento. O último
levantamento realizado entre clientes comerciais no Brasil indicou índice de satisfação
de 93%. De acordo com Bettencourt, a comunicação da Xerox visa dar suporte a uma
estratégia da companhia denominada Projeto 2005. O executivo relatou a mudança ocorrida
em 1990, quando um grande esforço de comunicação foi desenvolvido para transformar a
percepção sobre a companhia existente no mercado, até então identificada com um
empresa de copiadoras, para provocar a disseminação do conceito de The Document Company.
"A mensagem, à época, tinha o objetivo de informar a mudança do conceito e cuidar
para que ele fosse entendido pelos públicos", lembrou Bettencourt, ressaltando que a
companhia investe, em nível global, 1,7 bilhão de dólares por ano em pesquisa
tecnológica na área de documento. Aspecto importante é a comunicação interna da
empresa, "que se dá de forma clara e objetiva, deixando sempre esclarecido o que um
poderá esperar do outro". Para Bettencourt, uma boa política de relações humanas
só é possível quando as pessoas se expressam livremente. Os resultados dessa postura
estão revelados no índice de 90% de satisfação verificado entre os empregados. O
presidente da Xerox do Brasil falou ainda sobre as ações que revelam o nível de
compromisso social da empresa, em especial o Projeto Vila Olímpica da Mangueira. O
projeto é um reconhecido sucesso, embora a companhia não o utilize em sua propaganda.
"Neste caso, a melhor comunicação é a discrição", disse Bettencourt.
"Estamos funcionando e projetando o futuro. As pessoas que não respeitam a
comunidade e não estão alinhadas com a preservação do ambiente não terão
futuro." Ferramenta de mudanças Na seqüência, Luís Antônio Vargas, superintendente de Comunicação Institucional
da Petrobras, relatou a relevância da comunicação como ferramenta de mudança em sua
companhia a partir do marco de 6 de agosto de 1997. Nesse dia, teve fim o monopólio
constitucional da Petrobras no mercado brasileiro de petróleo. Com a abetura do mercado,
a Petrobras tratou de manter seu patrimônio de pessoas e de conhecimentos. "Temos
lutado para manter nossas competências de empresa integrada do poço ao posto, detentora
de tecnologia de ponta em pesquisa e exploração de petróleo em águas profundas",
confirmou Vargas. Segundo ele, nos tempos de economia fechado, a comunicação da empresa
era de cunho apenas tático, sem segmentação alguma. "O cliente vinha a nós, e
não o contrário. O monopólio implicava distância do mercado e isso foi ruim para a
empresa." A mudança empreendida pela Petrobras deu-se em um ambiente de
globalização, tecnologia da informação e pressão dos takeholders. A comunicação
funcionou para dar sentido às mudanças, com ênfase no relacionamento, no suporte aos
negócios e na construção de uma imagem sólida de marca. Os desafios, segundo Vargas,
eram "mudar rápido e de forma consistente, incorporar a visão de mercado sem perder
a competência adquirida e promover a construção de uma nova identidade". Nesse
processo, as mensagens que, antes, tinham a ver com brasilidade, competência técnica e
cidadania empresarial, hoje são focadas na qualidade, na busca de mercado e na
competitividade. "No futuro, a Petrobras quer ser reconhecida como uma empresa de
energia de classe mundial", afirmou. A comunicação da Petrobras é agora mais
estratégica do que tática, calçada na delegação de responsabilidades, na satisfação
do cliente externo, no uso intensivo da tecnologia da informação, na avaliação,
medição e controle dos resultados. "Nossa comunicação deve ser autosustentada e
dar suporte à gestão de negócios, com foco nos mercados prioritários", disse
Vargas. Inclui-se nessa nova visão a certificação de qualidade BS 8800 e ISO 14001 da
área de exploração na Bacia de Urucu, no interior do Amazonas. "A comunicação da
Petrobras também contribui para o esforço de certificar todas as áreas de exploração
e produção até 2001." A única opção O último painel do Congresso Internacional de Comunicação Empresarial e Corporativa foi "Comunicação empresarial e as novas culturas organizacionais", apresentado pela professora Maria Tereza Leme Fleury (Faculdade de Economia e Administração) e debatido por Margarida Kunsch (Escola de Comunicações e Artes), ambas professoras-doutoras da Universidade de São Paulo. O moderador da mesa foi o headhunter Simon Franco. A professora Maria Tereza afirmou que "muitas vezes se discute cultura organizacional de forma dissociada do ambiente em que a organização se insere". Para ela, no entanto, "a cultura de uma empresa precisa levar em conta tanto ela própria como a sociedade, os grupos e os indivíduos". Dito isso, ressaltou que "é hora de pensar uma cultura organizacional que elimine os traços antigos da cultura brasileira, identificada com o cartorialismo, o patrimonialismo, o 'jeitinho', o clientelismo e o famoso 'você sabe com que está falando?'" A professora lembrou que subsistem entre nós fortes traços culturais, muitos deles sobreviventes da herança do escravagismo. "A partir dos anos 90, quando ficamos expostos à competição, definitivamente passou a não ter mais lugar a figura do senhor grande proprietário, que da casa-grande acompanhava os trabalhos na fazenda", afirmou Maria Tereza. "Era desse senhor, ou desse empresário, que emanava toda a comunicação, o que se refletiu também nas organizações." Esse modelo, contudo, sofreu mudanças significativas em função da competitividade, do avanço tecnológico e da maior afirmação da cidadania. Nesse ponto, Maria Tereza traçou um paralelo entre comunicação, cultura e poder. "As novas estruturas implicaram novas formas de comunicação, até porque a comunicação transparente acaba mexendo nas relações de poder e suscita a quebra de padrões culturais vigentes." Segundo ela, "comunicação tem tudo a ver com a cultura, já que provoca uma interação muito forte que tem o dom de mudar a cultura mesmo." "Comunicação se refere a um processo e cultura a um valor", disse Maria Tereza. A professora indicou que empresas que obtêm bons resultados num mercado extremamente competitivo são aquelas que combinam seu negócio com eficientes políticas de gestão, com uma relação responsável com o ambiente, uma cultura e comunicação consistentes. "Este é um padrão estratégico", frisou. Em sua intervenção, a professora Margarida Kunsch reiterou a necessidade de se conhecer a cultura de uma organização antes de iniciar qualquer plano de comunicação."Uma identidade corporativa se constrói pelo que faz a organização, pelo que diz e pelo o que dizem dela." Nessa direção, o investimento em pessoas, segundo Margarida, é o maior diferencial competitivo nos tempos que correm. "É a base para uma cultura corporativa descentralizada, que privilegia a decisão compartilhada." Para ela, a credibilidade de um processo de comunicação é fundamentalmente gerada a partir da confiança forjada entre as pessoas. No que pareceu uma síntese de todas as discussões ocorridas no Congresso, ao encerrar os debates do último painel, Simon Franco afirmou: "Ficou claro que mudar é o nosso grande desafio. Mas, vale a pergunta: temos outra opção?" |
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