Ano 7
Nº 25
4º Trimestre de 1997

 

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O desafio europeu

     

Profissionais de comunicação empresarial da Europa reúnem-se em congresso para debater o rumos da atividade no próximo milênio.

por Rogério Santos

Dedicado ao tema "Today’s experience and 21st century challenges" [A experiência atual e os desafios do século 21], decorreu na Dinamarca, entre 25 e 27 de setembro último, o 17º congresso da FEIEA – Federation of European Industrial Editors Associations. O encontro, que reuniu quase 90 participantes de 15 países europeus, serviu como espaço de discussão do futuro da comunicação empresarial na Europa.

Internet e intranet, rumores e boatos, comunicação interlingüística, privatização da comunicação, medição da comunicação para funcionários, além da importância da União Européia nos sistemas de informação das empresas, foram alguns dos painéis que se desenrolaram em Billund, no Centro de Congressos da Lego, empresa fabricante de brinquedos.

Alan Peaford, o presidente inglês da FEIEA, considerou na abertura do congresso que a comunicação eletrônica assume um papel cada vez maior nos negócios de hoje. Para além de destacar que 90% dos membros ligados à entidade abraçam já as novas tecnologias, Peaford alertou para o fato de as tecnologias não deverem ficar sob o controle dos especialistas de informação, como os informáticos, mas na direção dos criadores e produtores de mensagens e idéias.

Num momento em que se fala tanto em tendências globais – em empresas, meios de comunicação e no consumo –, a questão da estratégia institucional acabou por constituir uma das linhas mestras do congresso. Se regiões, países, empresas e cidadãos se ligam cada vez mais, há uma força oposta crescente que faz as pessoas valorizarem o local e o tradicional. Daí Knud Reckweg, responsável da comunicação institucional da Lego, ter considerado que o que distingue uma companhia de outra é o que ele chamou de "religião institucional", que assegura a todos os empregados um rumo mental que compatibiliza suas posturas e os valores pessoais com os da companhia.
    

Diferenças lingüísticas

Enquanto no nível dos altos dirigentes de uma companhia internacional a língua de contato é o inglês, ao nível dos outros empregados a comunicação faz-se na língua local. O problema lingüístico representou, aliás, a segunda linha de força do congresso de Billund. Uma das preocupações que atravessou o discurso de Peaford, no início dos trabalhos, foi o modo de conciliar a comunicação na Europa. Cada país tem uma língua própria, acontecendo que há mesmo quem tenha duas línguas oficiais (a Bélgica, por exemplo) – o que torna muito difícil o diálogo no espaço europeu. No momento em que a União Européia discute a aplicação da moeda única para todo o seu território, será que ganha interesse discutir o nascimento de uma língua em comum?

Em duas das mesas de trabalho chegou-se a relatar os problemas de comunicação através das fronteiras e as dificuldades na produção de um jornal semanal para 13 países europeus. Mas, se a língua pode ser um obstáculo de peso para a comunicação entre os cidadãos, a propagação de boatos e rumores no interior de uma companhia é um aspecto que não pode ser negligenciado – como propôs o professor dinamarquês Anker Brink Lund, em palestra bem-estruturada que despertou grande interesse. O trabalho do boato, como o orador designou, pressupõe a idéia de rede, onde toda a gente se insere e fala de tudo. O rumor não alarga a informação, mas procura interpretá-la. Como no ditado português, "quem conta um conto acrescenta um ponto" e a mensagem sofre alterações ao longo da sua passagem por diferentes interlocutores. Um boato, ao subir a hierarquia empresarial, pode transformar-se mesmo em verdade. (Já o ministro da propaganda de Hitler dizia que uma mentira mil vezes dita se transmuda em verdade.)
     

Quatro pontos

Sem colocar a hipótese de eliminar o boato da vida de uma empresa, o investigador dinamarquês apresentou uma proposta de quatro pontos para a análise do boato ou rumor. Pelo primeiro, naturalizar, Lund defende o uso da circulação dos responsáveis da organização pelos locais de trabalho, de modo a estabelecer comunicação com o máximo de pessoas e reduzir o impacto de um boato, que pode até colocar em risco a existência da empresa. Pelo segundo ponto, analisar, Lund considera a importância das contra-mensagens dos indivíduos colocados na base de uma organização. Elas devem ser lidas com atenção; muitas vezes, essas mensagens são formas de protesto.

Pelo terceiro, sintonizar, entende-se a capacidade de ouvir, de atribuir credibilidade ao que circula. As reações a esta sintonia levam ao quarto ponto, o da abertura. Pôr a funcionar um telefone de linha aberta, por exemplo, pode ser uma forma de medir o clima interno e conhecer as principais preocupações dos empregados.
    

Notícias por inteiro

As novas tecnologias constituíram a terceira linha de força do congresso da FEIEA. Praticamente ausente do congresso anterior, realizado há três anos, na Suíça, a discussão em torno da Internet e da intranet ocupou uma manhã inteira dos trabalhos em Billund, o que dá a medida do interesse crescente da matéria. Particularmente interessante foi a intervenção de José Silva Lopes, diretor de grandes clientes da TMN, uma operadora portuguesa de telefones celulares. Na Europa comunitária, estimam-se perto de 82 milhões de computadores ligados à Internet, com cerca de 66% das empresas a utilizarem a rede mundial. A Internet já influencia distintos setores industriais como a mídia, a publicidade, os serviços financeiros e de compras, e agências de viagem. Lembrou Silva Lopes que o esperado aumento da largura de banda na transmissão de informação influirá também no funcionamento da televisão e do rádio.

Em outra intervenção, o professor Jan Stridh, da Universidade Gotemburg (Suécia), analisou o impacto social das novas tecnologias face aos métodos mais tradicionais. Stridh alertou para a lentidão da mudança de hábitos. Numa empresa, para além do jornal on line, mantém-se o jornal impresso (o que acaba por aumentar os custos). E se, na consulta de um jornal através da Internet, o usuário lê por norma apenas a página de entrada (home page), no jornal impresso continua com o hábito de ler as notícias por inteiro.
    

Mancada espanhola

O congresso da FEIEA foi visto de ópticas diferentes, conforme iam sendo ou não atingidas as expectativas. Para o jovem editor de um jornal empresarial belga, reinou muita desilusão: "O encontro devia reunir um mínimo de 200 pessoas, para o tornar representativo do trabalho dos comunicadores de empresa", lamentou. Por outro lado, constatou-se um peso muito elevado de participantes do norte da Europa. Um dos representantes portugueses, que já participou de outros encontros da FEIEA, chamou a atenção para a falta de "membros das associações francesa, espanhola e italiana", praticamente ausentes do congresso. Para ele, isso desequilibrou os trabalhos pois "a Europa do sul tem problemas diferentes do norte". Enquanto nos países do sul ainda se está na senda da implantação de computadores e de novas tecnologias, os países desenvolvidos do norte europeu discutem o impacto social e cultural das tecnologias sobre a vida dos cidadãos.

Um outro participante chamou a atenção para o peso exagerado de consultores externos na condução das sessões plenárias e dos grupos de trabalho, a contrastar com o trabalho de base do congresso anterior. Se naquele muitas das mesas foram dirigidas e animadas pelos próprios participantes, no congresso dinamarquês houve muita passividade na discussão dos trabalhos. Em sua defesa, a organização do congresso alegou dificuldades diversas na preparação do encontro. O congresso estava inicialmente previsto para ocorrer em Sevilha (Espanha), mas perante a inoperância da presidência espanhola, a direção da FEIEA teve de escolher um outro país e o tema de discussão. Assim, em vez dos habituais três anos de preparação, a FEIEA teve, na prática, apenas um ano para articular a reunião.

Daí o uso de tantos colaboradores externos, muitos deles de origem inglesa. A hegemonia inglesa, aliás, esteve muito presente durante os trabalhos, o que realça o bom trabalho da associação britânica, sem dúvida uma das mais ativas e esclarecidas a trabalhar dentro da FEIEA.

Paralelamente ao congresso realizou-se a assembléia anual de representantes da FEIEA (denominada "Council Meeting"). Para além da aprovação do programa de atividades, registrou-se a entrada de um representante da Eslováquia para o board da Federação. Registrou-se também a filiação, à federação, da associação irlandesa de comunicação empresarial. Uma outra medida tomada no "Council Meeting" foi a aprovação do press card, cuja responsabilidade de atribuição faz parte da competência das associações nacionais. O press card é uma das questões que há mais tempo preocupa a FEIEA, como reconhecimento profissional dos comunicadores de empresa.

Ainda no decurso do congresso, foram atribuídos prêmios aos melhores relatórios e contas, jornais, revistas e meios de comunicação interlínguas. A cerimônia de entrega dos galardões foi um dos momentos mais bonitos do encontro. Fechadas as portas em Billund, os presentes despediram-se até Londres, local onde, em 2000, ocorrerá o próximo congresso.

    

Hegemonia inglesa

A FEIEA (Federation of European Industrial Editors Associations) funciona desde 1955 agrupando comunicadores corporativos europeus de 15 países, num total superior a 6 mil membros individuais. Os países que dela fazem parte são Alemanha, Áustria, Bélgica, Dinamarca, Eslovênia, Espanha, França, Holanda, Hungria, Irlanda, Itália, Portugal, Reino Unido, Suécia e Suíça. Devido ao variado conjunto de línguas e culturas, a FEIEA tem como grande tarefa a implementação da comunicação interfronteiras, trabalhando principalmente a comunicação com os empregados e dando ênfase especial aos jornais internos.

Mais recentemente, as associações nacionais alargaram o seu campo de ação. A entidade inglesa, por exemplo, chamada British Association of Industrial Editors até 1995, passou a designar-se British Association of Communication in Business, ampliando seu leque de atuação também para a gestão da Comunicação Empresarial. Marca de tal alteração foi o congresso de Billund, onde a BACB conseguiu levar diversos especialistas e consultores em comunicação global.

Dirigida por Alan Peaford, a FEIEA tem um Comitê Executivo, eleito a cada três anos, que traça os principais objetivos a apresentar diante de uma espécie de parlamento, o "Council Meeting" – que se reúne uma vez por ano e do qual participam dois delegados de cada país-membro. No congresso trienal da FEIEA, os profissionais dos diversos países discutem os problemas que os afetam e preparam o futuro.

Se o congresso na Dinamarca se preocupou com o impacto das novas tecnologias no labor diário, o anterior, ocorrido há três anos, na Suíça, trabalhou as principais ferramentas de comunicação interna, os custos inerentes ao seu desenvolvimento e os desníveis culturais e econômicos entre os vários graus de empregados.

Para além do congresso, a Federação publica uma newsletter quadrimestral e a revista anual Communication Europe, cujo segundo número se encontra em distribuição. Outras formas de estimular a comunicação empresarial na Europa têm sido a atribuição de Diplomas de Honra, que distinguem profissionais que promovem a comunicação e o relacionamento humano; e o Grande Prêmio FEIEA, para melhores publicações européias de empresa.

 

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